Atacar países ibéricos é atear fogo à Alemanha e à França

Especialistas rejeitam a ideia de que o euro pode ser partido em dois: um para os países ricos, outro para os pobres.
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Só com uma união económica total e incondicional, virada para o crescimento e a criação de emprego, é que os países do euro podem  proteger bem a sua moeda da especulação, avisam vários observadores, da esquerda à direita, que rejeitam a ideia de um euro a duas velocidades.

Sem isso, argumentam, os países vão continuar sob extrema ameaça ou a capitular nos mercados da dívida, ameaçando o projecto do euro como um todo.
Grécia caiu na Primavera, Irlanda caiu há uma semana, Portugal está no limite das suas resistências, mas, rapidamente, a agressividade dos especuladores se virou para Espanha, a quarta maior economia do euro, no decorrer desta semana. O problema com a economia espanhola é, contudo, o perigo maior: segundo um estudo do Barclays Capital, França e Alemanha são os países mais expostos a um cenário de insolvência da economia espanhola. Por seu turno, Portugal é uma dor de cabeça potencial para Espanha e França, o que dá a ideia do efeito dominó que o colapso dos países ibéricos pode provocar.

Maria João Rodrigues, conselheira da Comissão Europeia, de várias instituições comunitárias e do Governo português, lamenta que assim seja, que a Zona Euro seja "uma construção incompleta" e que, no meio do caos da crise financeira e económica, a Europa tenha relegado para segundo plano a economia. "Temos de ter instrumentos e meios de apoio ao crescimento, ao emprego e à competitividade, ao mesmo tempo que tratamos destes problemas financeiros", caso contrário "os países [hoje em apuros, como Portugal, Grécia, Espanha e Irlanda] vão divergir" ainda mais, alertou ontem a professora, num debate promovido pelo gabinete do Parlamento Europeu em Portugal.

A opinião da consultora é partilhada por outros, como João Rodrigues, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, ou Luís Mira Amaral, ex-ministro do Trabalho e presidente do BIC Portugal, embora discordem nos meios para se atingir a meta do crescimento. Todos rejeitam a ideia de um euro a duas velocidades: ou há união, ou então não vale a pena.

O "esquecimento" da dimensão económica da união monetária deu já azo a dois colapsos na Zona Euro. O cenário de uma Zona Euro partida ao meio é inconcebível e, no limite, viola as normas básicas dos tratados, defendem.
Maria João Rodrigues criticou ainda os obstáculos sucessivos que têm sido levantados pela Alemanha na procura de uma solução para a crise da dívida pública. "Os alemães têm dificuldade em olhar para a Europa como um projecto político e de solidariedade. Normalmente, olham para o projecto europeu como uma plataforma para reforçar a sua competitividade", disse.

João Rodrigues também considera que "o euro precisa de muito mais partilha de riscos e de avançar no caminho de uma maior integração de interesses, de pôr a dimensão monetária ao serviço da economia, não o contrário". "É preciso dar maior expressão a instituições como o Banco Europeu de Investimento, gerar condições para a emissão de obrigações europeias, para o reforço do orçamento comunitário", concorda.

Mira Amaral vê uma saída construtiva para a crise: "maior partilha de responsabilidades, coordenação e federalismo". "Eu nem coloco a hipótese de sairmos do euro... Ou, pior, da Alemanha sair do euro. Isso seria regressar ao Terceiro Mundo", atira. "Insisto que Portugal está pior do que a Irlanda, tem problemas estruturais graves que bloqueiam o crescimento agora e vão continuar a prejudicar a economia nos próximos anos, de certeza", acrescenta. A seu ver, no curto prazo só há uma forma de apaziguar os mercados: "estabilizar as contas públicas". "Se não conseguirmos fazer isso sozinhos, então que venha o FMI, também não vai ser pior do que já é", defende.

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