Associação e promoção: está aí o futuro do agro-alimentar
Associação de empresas, promoção conjunta e aumento das exportações: é por este triângulo que passa o futuro do sector agro-alimentar em Portugal. O caminho foi apontado ontem por uma mão-cheia de especialistas da área, em mais um debate da iniciativa Made in Portugal, promovido pelo Diário de Notícias.
António Soares Franco (presidente do conselho de administração do grupo José Maria da Fonseca), Fernando Carpinteiro Albino (presidente do conselho de administração do Grupo de Produtores da Carnalentejana), Justa Nobre (chefe do restaurante Spazio Buondi/Nobre), Luís de Melo (director do departamento de Empresas Norte do Banco Espírito Santo) e Pedro Queiroz (director-geral da Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares) foram os cinco convidados do debate "À Mesa em Portugal", realizado no auditório do edifício--sede do DN, em Lisboa, e moderado pelo jornalista António Perez Metelo. E a promoção dos bons produtos nacionais (e o consequente crescimento das exportações) esteve no centro da discussão.
Primeira conclusão da troca de ideias? "O público lá fora não acha sexy os produtos agro-alimentares portugueses. Mas Portugal tem de olhar para eles como seus embaixadores", diz António Soares Franco. Logo, a promoção desses produtos - autênticos diplomatas da velha máxima "o que é nacional é bom" - deve ser uma prioridade.
Então, como fazê-lo? Através de iniciativas conjuntas de várias empresas - e até mesmo envolvendo outros sectores da economia -, respondem os participantes no debate do DN. "Ainda não nos conseguimos organizar para irmos todos lá para fora com uma imagem conjunta. Portugal não é sexy, mas tem de ser", aponta Pedro Queiroz, director-geral da Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares (FIPA). E dá o exemplo da sua própria instituição, que assinou um protocolo com a AIP (Associação Industrial Portuguesa), para ajudar à sua promoção extramuros: "Trabalhamos a uma só voz, sob um chapéu comum, e temos uma comunicação melhor."
"Se formos vários, trazemos muito mais gente aos nossos eventos", justifica, por sua vez, António Soares Franco. Luís de Melo e o responsável da José Maria da Fonseca (produtora de um dos mais famosos moscatéis de Setúbal) lembram mesmo o exemplo das iniciativas G7 e Douro Boys, projectos de empresas vinícolas que foram juntas para o mercado internacional, partilhando custos. "Têm de florescer outros exemplos desses", sublinha Soares Franco.
Porém, é difícil mudar mentalidades. "Somos muito individualistas", explica Fernando Carpinteiro Albino. "O português gosta muito de ir sozinho [para o estrangeiro], mas esquece-se de que aí o concorrente não é o vizinho do lado", completa Luís de Melo. "Cada um quer defender os seus interesses, mas, se aumentássemos a nossa fatia, cada um de nós teria uma trinca maior de cada fatia", frisa o responsável do Banco Espírito Santo (parceiro do DN no projecto Made in Portugal).
De resto, outra estratégia para a promoção da indústria agro-alimentar portuguesa poderia passar pela associação a outros produtos ou mesmo a marcas de outras áreas. "Porque não se vende lá fora vinhos junto com queijo da serra?", questiona Luís de Melo. "São precisas sinergias: nós junto com o turismo ou com outros sectores", enfatiza Soares Franco. Afinal, "é importante que se diga que somos de Portugal, porque isso vai abrir portas para o outro empresário português que vier a seguir", explica Pedro Queiroz.
O poder das pataniscas
Assim, o ideal será tentar conquistar os estrangeiros pelo paladar. Pedro Queiroz lembra o caso de um amigo austríaco que "só sabe dizer uma palavra em português: pataniscas". "Há milhões de pessoas lá fora dispostas a comer pataniscas", diz. Logo... só é preciso mostrar-lhas, como aponta, também, Justa Nobre: "Os estrangeiros adoram a gastronomia portuguesa. Temos boa comida, não há que ter vergonha daquilo que é nosso".
A chefe de cozinha - que ficou célebre pela participação televisiva, como jurada, no programa televisivo MasterChef - não se cansa de frisar a qualidade dos produtos alimentares nacionais. "Desde início que tenho uma preocupação que mais ninguém tinha, que é usar tudo o que é produto nacional. Felizmente, os meus colegas também já perceberam que o prato sabe melhor se tiver as nossas batatas, a nossa carne, o nosso arroz carolino, as nossas alfaces...", enumera. Aliás, hoje - num mundo hiperglobalizado - os chefes de cozinha também podem ser pontas-de-lança na promoção do produto português. "Precisamos de chefes portugueses pelo mundo: a promoção da imagem de Portugal também se pode fazer sentado à mesa", afirma Soares Franco.
A relação com as grandes superfícies
De resto, há outros problemas que preocupam os produtores agro-alimentares nacionais. Por exemplo, as relações com as grandes superfícies, que, não raras vezes, esmagam a margem de lucro dos pequenos produtores. "Eu gostava de trabalhar [com elas] em cooperação e não ao estilo 'toma lá, dá cá'", aponta o responsável do grupo José Maria da Fonseca, enquanto Carpinteiro Albino prefere realçar o bom exemplo da Carnalentejana com os grupos Auchan e Sonae.
Ainda assim, há outra coisa a preocupar o presidente do grupo de produtores da Carnalentejana: o estado da agricultura nacional. "Acho que chegou o momento de Portugal acordar para a agricultura e é importante que o poder político o faça", diz.
O resto é espírito positivo e fé num futuro melhor. Pedro Queiroz deposita muitas esperanças na "nova geração de gestores". E Justa Nobre tem uma fórmula secreta: "Está na altura de pôr a criatividade a funcionar."