Assange feliz com comutação de pena de Manning mas para já não se entrega
"Se [Barack] Obama perdoar [Chelsea] Manning, [Julian] Assange vai aceitar a extradição para os EUA apesar de o caso do Departamento de Justiça ser claramente inconstitucional", escreveu a WikiLeaks no dia 12 de janeiro, no Twitter. Cinco dias depois, o presidente norte-americano comutou a pena da antiga analista do Exército dos EUA no Iraque, condenada a 35 anos de prisão por espionagem e outros crimes, dizendo que isso nada tinha a ver com a promessa do fundador da WikiLeaks, que está desde junho de 2012 na embaixada equatoriana em Londres. Ontem, um dos seus advogados anunciou que ele não se vai entregar à justiçados EUA.
"Assange congratula-se com o anúncio de que a sentença de Manning será reduzida e de que ela será libertada em maio, mas isso fica aquém do que ele queria", afirmou por email ao site The Hill um dos advogados do fundador da WikiLeaks, Barry Pollack. "Assange tinha pedido para que a Chelsea Manning fosse perdoada e libertada imediatamente", lembrou. Contudo, no Twitter da WikiLeaks, uma mensagem parecia contradizê-lo: "Assange ficará feliz de vir para os EUA desde que todos os seus direitos sejam garantidos, apesar de a Casa Banca agora dizer que Manning não foi quid pro quo." Mais cedo, tinha republicado uma mensagem de outra advogada de Assange, Melinda Taylor, referente ao alegado "acordo" que existiria: "Ele mantém tudo o que disse."
Assange refugiou-se na embaixada do Equador em junho de 2012 para escapar a um pedido de extradição para a Suécia, que quer investigá-lo por causa de denúncias de violação durante uma viagem ao país, em 2010. O líder da WikiLeaks sempre negou as acusações, mas recusa ir para a Suécia dizendo temer ser depois extraditado para os EUA, onde existe uma investigação em aberto por causa das revelações feitas pela organização no seu site.
CD de Lady Gaga
Uma das grandes revelações ficou a dever-se à fuga de informação feita por Chelsea Manning - que cresceu como Bradley mas, após a condenação, anunciou que se identificava mais como uma mulher. Em 2010, Manning tinha sido posto a trabalhar como analista de informações em Bagdad, depois de ter sofrido um colapso emocional. Foi então que fez o download de mais de 700 mil documentos classificados (alguns deles retirou do escritório num CD onde dizia ter músicas de Lady Gaga), entregando-os à WikiLeaks. Entre o material estava, por exemplo, o vídeo de um helicóptero Apache a matar 12 civis na capital iraquiana, em 2007.
Manning, hoje com 29 anos, seria condenada em 2013 num tribunal militar a 35 anos de prisão, após dar-se como culpada. Desde então, tentou duas vezes o suicídio e fez greve de fome, que parou depois de o exército concordar em dar-lhe o tratamento para a mudança de sexo. Manning está detida na prisão de alta segurança para homens em Fort Leavenworth, no Kansas.
Manning foi uma das 209 pessoas a quem Obama comutou a pena (perdoou outras 64). Em vez dos 35 anos de prisão, cumprirá sete, sendo libertada em maio. Nos EUA, a comutação da pena, ao contrário do perdão, não remove as penalidades que implicam uma condenação, como por exemplo a perda do direito de voto ou proibição de posse de armas. Nenhuma das duas é uma admissão da inocência. Obama justificou a decisão dizendo que Manning cumpriu "uma sentença dura". Segundo o presidente, a sentença foi "desproporcional" face a outras pessoas que cometeram crimes semelhantes. Além disso, foi julgada e assumiu a sua responsabilidade nos crimes. "A justiça foi feita", alegou.
O mesmo não se pode dizer de Edward Snowden, ex-funcionário da Agência de Segurança Nacional que divulgou a existência de um programa de vigilância global. Obama ignorou a petição a pedir o perdão a Snowden, que fugiu em 2013 dos EUA para escapar à acusação de espionagem e vive na Rússia. Moscovo anunciou esta semana que prolongou por mais dois anos a autorização de residência.
"Saúdo a decisão do presidente (...) mas Manning nunca devia ter sido condenada", disse Assange, considerando-a uma "heroína, cuja bravura devia ter sido aplaudida". E pediu o fim da perseguição dos "delatores e editores, como a WikiLeaks e eu". Assange está sob investigação nos EUA, mas nunca foi acusado. Apesar de os republicanos estarem entre os seus maiores críticos, o presidente eleito Donald Trump tem partilhado algumas das suas visões e elogiou a WikiLeaks - que divulgou os emails da campanha de Hillary Clinton.