As vinhas entre os coqueirais

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Coqueiros ao lado de vinhas. Poucas imagens poderiam simbolizar melhor o espanto que causa o projecto que a empresa portuguesa Dão Sul está a desenvolver em Lagoa Grande, no estado de Pernambuco, Nordeste do Brasil, oito graus de latitude a sul do Equador. E a pergunta que logo surge é: mas será possível fazer aí bom vinho?

Antes de responder à pergunta, vamos aumentar a surpresa. Os 200 hectares de vinha da propriedade (sobretudo das castas Cabernet Sauvignon e Syrah, e alguma Alicante Bouschet) estão divididos em talhões de quatro a cinco hectares. Com temperatura quase constante ao longo do ano e chuva só em Janeiro e Fevereiro, todo o ciclo de produção da vinha é controlado por irrigação gota a gota, com água do rio São Francisco, o maior do Nordeste, que corre ali ao lado.

Assim, o trabalho não pára. Num talhão, poda-se. No do lado, vindima-se. No seguinte, as vinhas crescem. No outro, estão em repouso. Basta atravessar um dos caminhos para sair da Primavera e entrar no Outono. E há colheitas duas vezes por ano. As consequências na bem equipada adega são as de permitir uma actividade permanente de produção, engarrafamento e expedição. Ou seja, os cerca de 200 trabalhadores da propriedade (divididos por equipas especializadas) têm sempre que fazer.

A propriedade fica a 60 km de Petrolina, na fronteira com a Baía. É explorada pela ViniBrasil, um consórcio entre o grupo pernambucano Ponte, a cadeia de lojas de vinho Expand (uma das mais prestigiadas do Brasil) e a Dão Sul, que fornece o know-how, conhecida pela marca Quinta de Cabriz.

Há dois anos, a Expand convidou-os para integrarem o projecto e desde então as mudanças sucedem- -se, acompanhadas pelos enólogos Carlos Lucas e Carlos Moura (também sócios da Dão Sul), com visitas a cada dois meses do prof. Rogério de Castro, um dos nossos melhores pesquisadores em viticultura. No local, o jovem agrónomo João Santos é quem dirige os trabalhos, tendo-se mudado, com a família, da Guarda para Petrolina.

Do ano passado para cá, a produção aumentou de 300 mil para dois milhões de garrafas, e estão a preparar terrenos para a expansão, já que a propriedade tem um total de dois mil hectares. Castas portuguesas estão a ser testadas, e a vinha, originalmente em latada, vai ser agora plantada de modo a permitir vindima mecânica.

A marca é Rio Sol e há também varietais Cabernet Sauvignon e Syrah e um Reserva, todos com estágios de seis meses em carvalho francês). Destinam-se ao mercado brasileiro e também à exportação para os EUA e norte da Europa.

Mas a ViniBrasil não está sozinha nesta aventura de transformar o Vale de São Francisco na principal região brasileira vitivinícola, destronando o Rio Grande do Sul (no extremo sul do país, com um clima mais temperado). Franceses, italianos, brasileiros do sul, estão já a produzir vinhos por aqui. E, graças ao rio e à gigantesca barragem do Sobradinho, a região produz uvas de mesa, mangas, abacaxis e outras frutas que são escoadas pelo aeroporto de Petrolina, cuja ampliação foi inaugurada, há uma semana, pelo próprio Presidente Lula.

Voltando à pergunta inicial, os vinhos são bons? São bem razoáveis, fáceis de beber e de perfil internacional, na opinião dos jornalistas e críticos a que foram apresentados. Vinhos a sério, que serão iguais de ano para ano, mas que justificam plenamente esta «loucura» tropical.

* O jornalista foi a Pernambuco a convite da Dão Sul

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