Nas 35 páginas do memorando com a troika, assinado em maio de 2011 com o País à beira da falência financeira, há uma palavra escondida, sugerida, mas nunca dita. Importações. Há sugestões para promover a venda de produtos para o estrangeiro, para reduzir o défice comercial. Há ideias para reduzir carga burocrática, subir IVA e IRS, mas nada expressamente proibitivo contra o consumo importado. Apesar de evidente - o desequilíbrio da balança comercial era crónico -, as importações foram um dos alvos deste programa de ajustamento, mesmo que, publicamente, o Governo nunca o tenha assumido por calculismo europeu. Olhando para os números, entre 1996 e 2010, os portugueses tinham importado muito mais bens (84%) do que serviços (16%), uma desproporção que também se reproduzia na produção de bens, segundo os estudos realizados pela Fundação Francisco Manuel dos Santos.Mas apesar de cronicamente desequilibrada, a balança comercial, o pesadelo de Vítor Gaspar, foi melhorando lentamente desde 2011, fruto de uma retração agressiva no consumo, de um aumento da carga fiscal e do crescimento gradual das exportações. "Portugal tem tido um ganho muito significativo de quotas de mercado, a correção do desequilíbrio na nossa balança comercial, na nossa balança de bens e serviços, na nossa balança de transações correntes, tem ocorrido significativamente mais depressa do que estava previsto no programa", dizia Vítor Gaspar em abril de 2012. Na altura, o ex-ministro das Finanças esperava que desta aceleração viesse mais emprego e crescimento, compensando a depressão interna com projeção externa. "Portugal está no bom caminho", dizia o ministro.Não estava. O acentuar da recessão em 2013 e a escalada do desemprego - terá picos de 19% este ano - acabaram com as projeções de Gaspar. O ministro saiu, o lado positivo da balança comercial manteve-se, a par da dificuldade em gerar emprego. Mesmo assim, as exportações continuam a surpreender. No orçamento para 2013, retificado em junho, o Governo prevê um crescimento de 0,8% para as exportações, mas os números do Banco de Portugal (BdP)são ainda mais otimistas - 4,7% -, com um contributo significativo para atenuar a recessão este ano. Mas há sinais menos encorajadores no lado mais positivo desta crise: boa parte deste crescimento é sustentado na subida acentuada de exportações de combustível, com a Galp à cabeça. "Muito da subida das exportações nacionais tem que ver com a reconfiguração das refinarias de Sines e de Matosinhos", admitiu Ferreira de Oliveira. Se extrairmos às exportações o impacto da Galp, escrevia o Dinheiro Vivo, em vez do aumento de 4,1% face ao homólogo, as exportações estariam a subir a metade do ritmo, quase 1,9%. Mesmo com esta ressalva, os números são positivos. Julho interrompeu uma série de 70 anos - é preciso regressar a 1943 e a Salazar - para ver um excedente comercial, garante o BdP, que prevê 6,4% positivos na balança, segundo as previsões feitas no verão. Agora, e mesmo com o contributo positivo sobre o PIB, falta a segunda parte da equação de Gaspar - emprego para acrescentar ao crescimento.