Às 10.13 a terra tremeu mas só para quem se juntou ao exercício

Iniciativa da Proteção Civil realiza-se todos os anos. Organismos públicos participam, mas na rua ninguém percebeu que ia acontecer um exercício
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Em pleno Terreiro do Paço, a professora Susana Guerreiro fala das centenas de lisboetas que morreram no terramoto de 1755, por terem fugido para terreno aberto, mas que não conseguiram escapar ao tsunami. À hora a que a professora de integração da Escola Agostinho Roseta explica, aos alunos do 10.º e 11.º anos, a maior catástrofe natural em solo português, decorre em dezenas de organismos públicos um simulacro de sismo - A Terra Treme. Um exercício que a professora sabia que estava marcado, mas ao qual não aderiu. Ontem, foi dia de mostrar in loco como a cidade foi obrigada a mudar depois do terramoto. E de os alunos mostrarem que sabem que têm de se abrigar "debaixo de uma mesa, ou fugir para campo aberto, mas não para perto do mar que pode vir uma onda".

Nas ruas da Baixa de Lisboa, a iniciativa da Autoridade Nacional da Proteção Civil passou despercebida, mas os lisboetas não escondem que gostavam de ter mais preparação. "Já senti dois sismos - em 1968 e mil novecentos e cinquenta e tal -, é um barulho estranho, mas não sabemos como fazer frente a uma situação destas. Devia haver simulações de sismo e de incêndio", aponta Carlos Queirós. A mesma necessidade é sublinhada pela estudante Sofia Bastos, que lamenta nem na escola ter feito exercícios de preparação.

"Um treino muito a sério"

"Ai meu Deus", "socorro", "vamos todos morrer", exclamam entre risadas. Na sala do 4.º ano da Escola Básica de Cantanhede (distrito de Coimbra), todos se agacharam, de mãos na cabeça, mal soou a campainha a assinalar o início do exercício. Mas o aviso da coordenadora da escola, Maria do Céu Pinto, minutos antes - "isto é um treino, temos de o levar muito a sério" - não impediu as brincadeiras próprias de quem sabia que era tudo a fingir.

Ali, como nas outras escolas do Agrupamento Marquês de Marialva (que reúne cerca de 1750 pessoas, entre alunos, professores e funcionários), a terra não tremeu às 10.13, como programado. "Decidimos ajustar o horário para a ponta final das aulas, cinco minutos antes do intervalo [09.55 no 2.º, 3.º ciclos e secundário, uma hora mais tarde nas escolas primárias]", explicou ao DN José Matias Freire, delegado de segurança do agrupamento. No entanto, todos seguiram à risca as palavras de ordem - "baixar, proteger, aguardar". O balanço fez-se depois, em conversa com cada professor, na expectativa de que a lição de ontem sirva de alguma coisa se um dia o país se deparar com uma ameaça sísmica.

Sem qualquer tipo de sinal, a professora Brígida Machado informou os alunos de 8 anos de que "neste momento a terra começou a tremer"... Enquanto alguns meteram o braço no ar para responder, outros colocaram-se de imediato de baixo das secretárias, incluindo a própria professora, que foi lembrando os procedimentos que devem ser seguidos: "A cabeça está protegida? Muito importante, manter a calma e aguardar em silêncio para ouvir as indicações."

Já sentados nas cadeiras, seguiu-se uma breve explicação do que é um sismo. E talvez por estarmos no Algarve - em Olhão, na Escola Professora Paula Nogueira -, também foi abordada a hipótese da ocorrência de um tsunami na sequência de um sismo. Aqui o simulacro só contou com a participação dos 160 alunos do 1.º ciclo.

Câmara e escolas participam

Embora não seja uma zona de risco, o Norte quis participar no exercício. Em Gondomar, todos os funcionários da autarquia cumpriram as indicações, embora sem receios de uma eventual catástrofe na cidade. "Não estamos numa zona de risco sísmico, mas temos de sensibilizar a população, até porque pode acontecer noutra cidade com mais riscos e a população tem de saber como agir. Muitos habitantes das zonas de menor risco deslocam-se, por variados motivos, a locais com perigo mais elevado de sismo", explicou ao DN o presidente da Câmara Municipal de Gondomar, Marco Martins.

Os 108 estabelecimentos de ensino do concelho aderiram à iniciativa, bem como as juntas de freguesia e os vários serviços pertencentes à Câmara Municipal de Gondomar. "Tivemos, em maio, um incêndio perto de uma escola e foi necessário retirar 600 alunos devido ao risco elevado de inalação de fumo. Tudo correu bem porque tinha sido feito um simulacro três semanas antes", relembrou o autarca, sublinhando assim a importância deste tipo de iniciativas.

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