As 10 melhores séries de 2023... que talvez não tenha visto

São muitas as listas que repetem as mesmas séries como "melhores do ano", sucessos evidentes que se tornaram obrigatórios no cânone dos seriéfilos. Mas houve mais vida na ficção televisiva para além dos grandes lançamentos.
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Este ficará como o ano do adeus a Succession e The Crown, da segunda temporada de The Bear e da estreia de The Last of Us - o título que confirmou Pedro Pascal como o daddy do momento, depois do protagonismo em The Mandalorian. Não há como negar os acontecimentos mediáticos de 2023 em matéria de ficção televisiva. Desde logo, todo o fenómeno à volta de cada episódio semanal da premiadíssima série da HBO Max que coroou Brian Cox no papel do mítico patriarca Logan Roy, e que acabou por deixar aos filhos a responsabilidade do tão esperado desenlace da sucessão, depois de quatro temporadas de pérfidas danças de bastidores empresariais numa Nova Iorque de sentimentos frios e/ou destrutivos, diálogos cáusticos e natureza shakespeariana. Succession, essa joia do seu criador, Jesse Armstrong, marcou de facto uma era, e hoje qualquer ideia sobre dinheiro, poder, família, media e política parece vir acompanhada de uma certa banda sonora.

O final de The Crown (Netflix), por sua vez, chegou mais discretamente. Uma sexta temporada que na linha do tempo corresponde a uma maior proximidade, e por isso a uma narrativa da monarquia britânica mais sensível ao escrutínio do espectador. Enquanto The Bear (Disney+), o drama de cozinha cujo êxito resultou do passa-palavra, é daqueles casos em que o segundo capítulo supera o primeiro em emoções al dente, tornando inevitável uma terceira temporada.

O prémio de melhor lançamento fica assim entregue a The Last of Us (HBO Max), uma série adaptada de um videojogo de sucesso, com pós-apocalipse e zombies pelo meio, que sugeria pouca imaginação e acabou por tornar Pascal e Bella Ramsey a mais feliz dupla improvisada. Um "pai" e uma "filha" em viagem, preparados para tudo.

Eis outros 10 "melhores" títulos, menos badalados:

1. HOMICÍDIOS AO DOMICÍLIO (Disney+)

A terceira temporada de Only Murders in the Building é a prova de que esta deliciosa invenção de Steve Martin e John Hoffman tem os ingredientes certos para resistir ao cansaço de um motivo repetido. A saber: a cada 10 episódios há um homicídio num prédio de Manhattan chamado Arconia, onde vive um trio improvável formado por Selena Gomez, Martin Short e o próprio Steve Martin. Uma brincadeira negra, sempre com nuances dramáticas e métodos de investigação pouco ortodoxos, a aproveitar a tara nova-iorquina dos podcasts true crime. Televisão colorida é isto.

2. A DIPLOMATA (Netflix)

Chegou a estar no Top 10 das séries mais vistas na Netflix, como qualquer título na sua semana de estreia, mas é provável que não se lhe tenha dado o devido valor. Keri Russell, que brilhou como espia em The Americans (2013-2018), surge aqui no cargo de embaixadora americana no Reino Unido, nomeada em cima da hora pelo presidente dos Estados Unidos e a sua chefe de gabinete, que a testam num complexo xadrez político... com a agravante curiosa da personagem do marido. Série centrada numa autêntica fera feminina em selva geopolítica, A Diplomata não poupa em energia coreográfica e raciocínio ágil nos bastidores do poder.

3. CORPOS (Netflix)

É difícil explicar o conceito de Bodies. Mas também só interessa a informação mínima, para que o espectador faça a sua própria viagem de descoberta. E por falar em viagem, estamos de certa maneira no domínio das viagens no tempo. O que une 1890, 1941, 2023 e 2053? Um cadáver encontrado num beco de Londres - sempre o mesmo cadáver e local -, cujo mistério alinha quatro detetives nas diferentes timelines. Do thriller à ficção científica, do drama de época à distopia, Corpos revela-se um objeto experimental com febre de enigma e um desfecho bem esgalhado para responder à estranheza do percurso.

4. EXTRAORDINÁRIA (Disney+)

Tal como Corpos, Extraordinária é outro dos exemplos da excelência televisiva britânica, que não passa por chávenas de chá. Uma série de comédia pura, com alguns momentos agridoces, que imagina um mundo onde quase toda a gente ganha um superpoder (coisas genialmente idiotas) ao completar 18 anos. Algo que não acontece à protagonista (fabulosa Máiréad Tyers), de 25 anos, que começa a sentir-se frustrada pela sua condição... excecional. Mais do que um comentário hilariante aos estafados super-heróis, os oito episódios da primeira temporada são calor humano na tradição das melhores sitcoms. Queremos mais.

5. DEAD RINGERS (Prime Video)

Para quem procura ficção mais da pesada, esta "versão feminina" do filme de culto de David Cronenberg cumpre e surpreende. Aqui, os irmãos gémeos ginecologistas que eram interpretados por Jeremy Irons dão lugar a duas gémeas obstetras perversamente encarnadas por Rachel Weisz, com uma sofisticação de contraste arrepiante. Fala-se de questões de fertilidade e parto, mas o show é a intimidade bizarra das manas. Projeto de risco, Dead Ringers faz transparecer a vertigem da sua narrativa em situações de vigorosa insensatez.

6. PERRY MASON (HBO Max)

Revisitação da célebre personagem criada por Erle Stanley Gardner, que os mais velhos recordarão pelo rosto de Raymond Burr, Perry Mason definiu desde o início uma distância clara em relação a esse clássico. Tal como interpretado por Matthew Rhys, Mason é nesta série uma alma amarrotada que se salva pelo brio profissional. Um detetive feito advogado, na Los Angeles dos Anos 30, que voltou numa segunda temporada superior à primeira: menos confusa e mais jazzística no tratamento da história e das outras personagens.

7. C.B. STRIKE (HBO Max)

A terceira temporada deste excelente drama policial estreou-se no início do ano sem qualquer atenção dos media, à exceção do DN, e a razão é óbvia: a série em si adapta os romances policiais Cormoran Strike de J.K. Rowling (assinados com o pseudónimo Robert Galbraith) e este foi o livro que gerou polémica aquando do seu lançamento, em 2020, devido ao boato da transfobia da autora... Pois bem, quem se atrever a ignorar as más energias, poderá descobrir uma clássica abordagem aos casos de detetive, com o perfeito par de inverno, Tom Burke e Holliday Grainger.

8. LIÇÕES DE QUÍMICA (Apple TV+)

Mais uma vez ambientados em Los Angeles, mas na década de 1950, em Lições de Química seguimos a luta discretamente efetiva de uma mulher formada em Química, que nessa época não poderia ir mais longe do que o cargo de assistente de laboratório. Pela expressão "científica" na cara de Brie Larson entramos num território de experiência amorosa que, de forma trágica, a leva por caminhos alternativos para poder exercer os seus conhecimentos: que tal apresentar um programa de culinária com feição química? Às vezes é sentimentalão, mas os saldos humano e feminista são bastante positivos.

9. UMA PEQUENA LUZ (Disney+)

Apesar de se inserir na linhagem das várias produções televisivas em torno da memória de Anne Frank, A Small Light acaba por ser outra coisa. Aliás, Anne Frank é mesmo uma personagem secundária neste retrato de Miep Gies, a secretária de Otto Frank, que, em colaboração com colegas de escritório, fez os possíveis para proteger a família Frank e companhia dentro do anexo, enquanto se juntava ao marido, Jan Gies, noutros atos de resistência. Um conto sobre a coragem holandesa numa bem recriada Amesterdão nazi.

10. THE ARCHITECT (Filmin)

Tem apenas quatro episódios de 20 minutos e resulta numa crítica afiada ao mercado imobiliário na Europa, a partir da cidade de Oslo: num futuro nada longínquo, em que os preços da habitação atingiram um patamar estratosférico, levando pessoas não necessariamente pobres a procurar soluções pouco dignas, a arquiteta estagiária do título torna-se um sintoma forte da crise moderna (que já está mais do que instalada). Uma série norueguesa que estuda a solidão extrema com design minimalista e um humor angustiante.

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