Artistas desafiados a recriar a guitarra portuguesa

Manuel João Vieira, João Pedro Vale ou Siza Vieira foram alguns dos artistas que recriaram a guitarra portuguesa para a exposição "Acordem as Guitarras", no Museu do Fado, em Lisboa.
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É mais que evidente que hoje o fado vive um momento de consagração. Não só pela popularidade de que gozam uma série de fadistas, dentro e fora de Portugal, mas por ser hoje uma música que é alvo de vários estudos académicos, vincando um interesse que também se tem sentido no campo das artes plásticas. "Acordem as Guitarras", a exposição que está patente no Museu do Fado, em Lisboa, mostra precisamente como é que o fado se pode manter representado na arte contemporânea.

"No fundo documenta bem este fascínio que a guitarra [portuguesa] exerce não só no exterior, mas também entre nós e os nossos artistas, surgindo assim novas peças que a partir de agora terão a sua própria vida, a sua própria história", explicou ao DN Sara Pereira, diretora do Museu do Fado.

São mais de uma dezena as guitarras que agora se encontram expostas no museu. Desde uma homenagem ao guitarrista Carlos Paredes feita por Catarina Pestana, que recorda o período em que o músico esteve na prisão, até uma outra guitarra, revestida por tabaco, da autoria de João Leonardo. Siza Vieira, João Pedro Vale, Manuel João Vieira ou Vhils são outros nomes que foram desafiados para recriar este instrumento tão emblemático da cultura portuguesa.

"Isto surgiu de um projeto da Malabar, uma empresa do Porto que trabalha na área do design, desenvolvendo uma série de projetos de recriação de materiais e objetos tradicionais da nossa cultura. Fez-se então este desafio de recriação da guitarra portuguesa a vários artistas, arquitetos e designers . Naturalmente, teríamos de acolher aqui este projeto", referiu a diretora do museu.

Cada uma das peças que integram esta nova exposição tem características muito particulares, refletindo por isso a diversidade dos artistas que aceitaram o desafio e também as diferentes gerações que aqui se cruzam. "Cada um deles põe muita da sua identidade artística em cada objeto e faz uma leitura também atualizada do tema de acordo com o contexto em que hoje vivemos", frisou Sara Pereira. Costas com Costas, o nome da guitarra recriada por Isaque Pinheiro, é disso o exemplo perfeito. Transformada em mochila, evoca também "os tempos da emigração forçada a que muitos jovens estão hoje obrigados".

"Acordem as Guitarras" acaba também por ser um sintoma da "nova atenção para com o fado", como lembrou a responsável pelo museu: "Tem sido a todos os níveis, tanto a nível académico, como da investigação, da indústria discográfica e editorial e também a nível artístico. Sentimos isso sobretudo desde os anos 80, data em que surgem na academia os primeiros estudos científicos sobre o fado e, em paralelo, existem as obras emblemáticas de Júlio Pomar ou Graça Morais. A partir dos anos 90 a série de grandes retratos de Leonel Moura. É então que começamos a sentir um renascimento do interesse da arte."

Mas a verdade é que o meio artístico desde sempre tratou o tema do fado. "Desde os primórdios do século XX, com O Fado de [José] Malhoa, aqui numa via mais conservadora e tradicional. Mas também o fez através das obras dos modernistas, de Amadeo [de Souza Cardoso], ao Almada [Negreiros], passando pelo [Eduardo] Viana. Todos eles representaram a guitarra portuguesa como símbolo da portugalidade e não deixaram de representar a temática do fado e da guitarra, não obstante as reivindicações mais do que legítimas por uma nova linguagem artística", acrescenta.

Patente no Museu do Fado até 2 de junho, a exposição "Acordem as Guitarras" prova como atualmente o meio fadista e o da arte contemporânea também podem estar unidos.

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