António Barreira: As novelas dele têm cheiro...
António Barreira corre o risco de ser considerado "mal-educado". Isto porque quando está em processo de criação de uma novela não agradece a quem lhe deseja "boa sorte". Esta é uma das três superstições do autor de Meu Amor, a próxima novela a estrear-se na TVI. "É um bocadinho esquizofrénico", confessa. À primeira junta-se ainda perfumar-se com o mesmo aroma e calçar os mesmos chinelos. "Mas atenção, isto só é válido desde que escrevo a primeira linha até que entrego o último episódio", avisa. Convicções inabaláveis das quais fala sem embaraço.
"Já me olharam de esguelha, assim como quem está a pensar 'eu aqui a desejar-lhe boa sorte e ele nem sequer diz obrigado'. Acabo por ter de explicar que nunca agradeço até ter entregue o último capítulo de uma novela e espero que as pessoas compreendam", diz. O argumentista sabe identificar a causa desta superstição e recorda-se bem do dia em que ela nasceu: "Acredito que veio de ter lido muitas coisas relacionadas com teatro. É como aqueles hábitos de desejar que se parta uma perna... Eu adoptei o sistema de não pronunciar a palavra 'obrigado'. Digo-lhe mais, lembro-me de que a primeira vez em que isso aconteceu foi a 1 de Março de 1996, data em que estreei a minha primeira rádio-novela."
Os perfumes e os chinelos
Mais invulgar é o hábito de procurar um odor que tenha que ver com a história que vai escrever. António Barreira cheira, e cheira, e cheira... até descobrir o aroma certo. Depois, é só perfumar-se e esperar que o ambiente ajude à imaginação. "Cada novela tem o seu cheiro. Para Fascínios, por exemplo, escolhi Tokyo, de Kenzo, por ser um perfume oriental e com um toque de sofisticação. Já para Flor do Mar quis um cheiro 'a rasgar', porque a novela é uma verdadeira saga, e acabei por escolher One Million de Paco Rabanne." E já aconteceu escrever duas novelas ao mesmo tempo? "A Flor do Mar e o Meu Amor coincidiram durante duas semanas e foi uma aventura. Tinha os dois frascos ao pé de mim. Quando me dedicava à Flor, punha One Million; quando passava para Meu Amor borrifava-me com Cool Water de Davidoff", conta.
O mesmo aconteceu com os chinelos: uns para cada novela, os mesmos durante uma novela inteira. Mas desta vez o acto é inconsciente. No mesmo dia em que começou a escrever Fascínios, o autor comprou uns chinelos e, sempre que ia trabalhar, era incapaz de tirar outros sapatos do armário. "Quando acabei a novela, a minha mulher perguntou-se se ia continuar a usá-los. Eu respondi-lhe que não, mas que ia procurar outros para calçar enquanto escrevia Flor do Mar." A sorte, diz, é não ser friorento. "Tenho começado sempre a escrever no Verão e acabo no Inverno... com chinelos de enfiar no dedo calçados. O pior é se as coisas se inverterem. Andar com os pés tapados quando estão 40 graus não me parece agradável", rematou, bem-disposto.