Andrew Lloyd Webber: nascido para compor

Filho de músicos e sobrinho de uma atriz, parecia escrito nas estrelas que este homem chegaria aos musicais
Publicado a
Atualizado a

Tinha nove anos quando escreveu a sua primeira suite para seis instrumentos. Aos 15, musicou pela primeira vez o livro Old Possum"s Book Of Practical Cats, escrito por T.S. Eliot em 1939, que mais tarde lhe valeria a inspiração para o musical Cats, que chegou a deter o recorde de longevidade nos palcos da Broadway até ser ultrapassado por O Fantasma da Ópera, também composto por Andrew Lloyd Webber.

Filho de um compositor e organista, William Lloyd Webber, e de uma pianista e violinista, Jean Hermione Johnsotone, Andrew - o primogénito, a que se seguiu Julian, um violoncelista de renome internacional - nasceu em South Kensington, Londres, a 22 de Março de 1948, e cresceu numa casa em que a música era o prato do dia. Sobrinho de uma atriz, Viola, começou a assistir, levado pela tia, a muitas peças e musicais que iam à cena no West End londrino. Esses anos de convívio íntimo com a música e com as artes de palco permitiram, muitos anos depois, a confissão: "São uns felizardos aqueles que têm a sorte de descobrir o que realmente querem fazer na vida, algo que comigo aconteceu quando eu era ainda muito jovem - e sem margem para dúvidas. Eu fui ainda mais afortunado quando percebi que, fazendo aquilo que quero e gosto, consigo sustentar-me, a mim e aos meus".

Modéstia, claro está: além de ser considerado uma das cinco pessoas mais poderosas na cultura britânica (pelo jornal Daily Telegraph, em 2008), viu a sua fortuna pessoal calculada em 1,2 mil milhões de dólares. Algo que não surpreende se olharmos para os êxitos prolongados que já garantiu e que integram o reconhecimento e o gosto populares - bastará citar Jesus Cristo Superstar, Evita (baseado na vida de Eva Perón, mulher de Juan Domingo Perón, o primeiro casal argentino em que ambos os cônjuges chegaram à presidência do país), e os já citados Cats e O Fantasma da Ópera. Claro que nem todos os toques de Lloyd Webber equivalem ao de Midas: o trabalho que assinalou a estreia da parceria do compositor com o letrista Tim Rice, uma peça chamada The Likes Of Us, foi gravada em 1965 mas só conseguiu subir ao palco 40 anos depois - e numa fase em que o compositor, através da sua empresa, chamada Really Useful Group, tem uma palavra a dizer sobre a gestão e o reportório de uma série de salas de espetáculo londrinas. Em 1975, a mesma dupla que já alcançara o êxito com Jesus Cristo Superstar (em palco a partir de 1970, passado a filme em 1973), completou um musical em torno da personagem Jeeves, o celebrado mordomo que valeu a consagração ao escritor e humorista P.G. Wodehouse; mais uma vez, uma versão renovada (com apenas duas canções do alinhamento original) acabaria por cumprir o seu destino de palco... em 1996 e com o titulo By Jeeves.

O cinema e as versões

No seu percurso, que inclui, além de 13 musicais, duas bandas sonoras - as de Passos Silenciosos (1971), de Stephen Frears, e de O Caso Odessa (1974), de Ronald Neame - um Requiem (em Latim e dedicado ao pai) e outras aventuras, Lloyd Webber cedo percebeu que a "eternização" das suas peças passava pela respetiva "fixação" no cinema. O único problema, do ponto de vista artístico, é que os seus musicais acabaram sempre por ir parar às mãos de realizadores que afinavam pela mediania e que, cingidos pelo libreto e pelo natural destaque reservado às canções, pareciam ainda mais medianos. Três casos: Norman Jewison, em Jesus Cristo Superstar, que, mesmo filmado em Israel e contando com um vibrante Ted Neeley no papel principal (um "hot Jesus" muitos anos de Diogo Morgado...), passou sempre a ideia de ficar a meio caminho, exceto nas receitas que, só nos Estados Unidos, alcançaram os 25 milhões de dólares. Depois, viria Alan Parker, com Evita, em que o elenco parecia "partido ao meio" entre cantores - Madonna, Jimmy Nail, uma muito jovem Andrea Corr, antes do êxito familiar com The Corrs, e até Gary Brooker, dos Procol Harum - e atores, com destaque para Jonathan Pryce e Antonio Banderas. A bilheteira, essa voltou a compensar e muito. Por fim, O Fantasma da Ópera de Andrew Lloyd Webber (assim mesmo, para não deixar dúvidas) foi um dos acontecimentos mediáticos do final de 2004, com estreia mundial em Londres. Joel Schumacher puxou pouco pela história e trabalhou com um elenco desnivelado entre géneros: Gerard Butler, Patrick Wilson e até Ciarán Hinds são pouco credíveis nos seus papeis, deixando o brilho às senhoras, uma espantosa Emmy Rossum, mais Miranda Richardson e Minnie Driver. Neste caso, a receita ficou muito aquém do esperado, para um filme tido como muito caro - 70 milhões de dólares só para a produção e para os salários. Curiosamente, continuamos à espera do filme de Cats, de que só existe uma versão televisiva realizada por David Mallet.

Casado por três vezes, sendo o segundo matrimónio o mais intempestivo, porque o juntou à diva Sarah Brightman, com um desfecho que alimentou as colunas sociais, Andrew Lloyd Webber é pai de cinco filhos. Até outubro do ano passado, teve assento na Câmara dos Lordes, sendo apoiante desde sempre do Partido Conservador. Por mérito das suas criações mais populares, joga outro trunfo nas receitas que lhe chegam dos direitos de autor. Bastará dizer, por exemplo, que Don"t Cry For Me, Argentina, estreada por Julie Covington e universalizada por Madonna, foi gravada pelos Carpenters, por Olivia Newton-John, Shirley Bassey, Tom Jones, Marti Webb e Sinéad O"Connor, entre muitos outros. Já Memory, popularizada por Elaine Paige, passou pela voz de Barry Manilow, antes de Barbra Streisand se ter "apropriado" do tema. Fazer sobreviver uma canção ao tempo de vida de um musical é significativo. E extraordinariamente rentável também, como bem sabe Lord Lloyd Webber, que ameaça não ficar por aqui.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt