Ancara sobe preço para acordo sobre refugiados
Um apoio financeiro suplementar na ordem de três mil milhões de euros, a somar a igual montante já acordado entre Bruxelas e a Turquia, a ser entregue até 2018 para apoiar especificamente os refugiados sírios, o rápido repatriamento para este país dos "migrantes ilegais", sem necessidade de proteção internacionais, que se encontram na Grécia e questões conexas estavam ontem a dividir a União Europeia e o chefe do governo de Ancara, Ahmet Davutoglu, numa cimeira que deveria ter durado algumas horas, mas que acabou já de madrugada, sem que se atingisse um acordo.
A Turquia dera a entender estar disponível para receber aqueles migrantes em troca do reforço financeiro referido, mas também do fim dos vistos para os cidadãos deste país nas deslocações para a UE e da abertura de novos capítulos no processo de negociação para a adesão. Ancara colocou ainda como condição que por cada sírio readmitido pela Turquia, um outro deve ser encaminhado para um dos países da UE que se comprometeram a receber refugiados. E Davutoglu, à chegada a Bruxelas, fincara bem o peso do tema da adesão: "A Turquia está pronta a entrar na UE".
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A partir do início da noite ficou claro que dificilmente haveria acordo. O primeiro-ministro italiano Matteo Renzi fazia depender a sua assinatura de uma referência à liberdade de expressão na Turquia, na sequência dos acontecimentos do fim de semana que levaram a uma intervenção policial e à imposição da tutela governamental ao principal jornal ligado à oposição, o diário Zaman. Antes, a responsável da diplomacia da UE, Federica Mogherini, também criticara o governo turco neste ponto e, por outro lado, insistira na necessidade de Ancara manter o diálogo político com os grupos curdos.
Costa espera sucesso
O primeiro-ministro António Costa sintetizou nos seguintes termos o que estava em causa. A Turquia trouxe "uma proposta bastante mais ambiciosa do que aquilo que tinha sido trabalhada". E expressou a "esperança" que as negociações possam chegar a "bom porto" e permitam "uma conclusão mais global, não só sobre o tema dos refugiados, mas sobre questões fundamentais para a futura adesão da Turquia", como o relacionamento com Chipre.
Também o chefe do governo de Budapeste, Viktor Orban, levantou entraves a aspectos do acordo UE-Turquia, recusando-se a aceitar a parte relacionada com a transferência automática de refugiados de território turco para os Estados membros.
Um sinal de possíveis tensões sobre o que se estava a negociar em Bruxelas - ou seja, o preço económico e político a pagar pela UE para a Turquia manter no seu território a maioria dos refugiados que tentam entrar no espaço da UE, fora dado, a partir de Ancara, onde o presidente Recep Tayyip Erdogan lembrou que pouco ou nada dos três mil milhões de euros prometidos pela UE em novembro tinha sido entregue até agora. "Passaram-se quatro meses", afirmou Erdogan, e agora que o "primeiro-ministro está em Bruxelas, espero que regresse com esse dinheiro".
Entretanto, as condições de vida dos refugiados continuam a deteriorar-se, designadamente no campo de Idomeni, junto da fronteira grego-macedónia, onde estão aglomeradas cerca de 13 mil pessoas. A Macedónia tem restringido o número de entradas diárias, levando à escassez de bens essenciais, uma situação pelas condições meteorológicas próprias.
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À margem da cimeira com a Turquia, os 28 debateram o restabelecimento pleno do espaço Schengen, posto em causa pela crise dos refugiados, com oito países a instaurarem controlos fronteiriços. Ficou definida a atuação da UE na fronteira grega, com recurso a polícias e guardas fronteiriços dos restantes países no terreno a partir do final do mês.
Quanto ao espaço Schengen, este deve estar plenamente em funcionamento antes do final do ano. E no Conselho Europeu de 17 e 18 de março, deve ser discutida uma proposta da Comissão prevendo a centralização dos pedidos de asilo para a UE. Atualmente, no quadro dos Acordo de Dublin, os requerentes têm de formalizar o pedido no país de entrada no espaço da União; um procedimento que passará a ser centralizado, possivelmente, no Gabinete Europeu de Apoio em matéria de Asilo, dirigido pelo português José Carreira. O primeiro-ministro britânico David Cameron já se demarcou deste processo.
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