Álvaro Santos Pereira. "Portugal tem de baixar o IRC, e muito"

Em entrevista, o diretor de estudos sobre economias nacionais diz que dívida do Estado e das empresas é um perigo. Subida do salário mínimo é importante, para já não é problemática
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Portugal tem de avançar o mais depressa possível com a reforma do IRC, o imposto sobre os lucros das empresas. Tem de reduzir as taxas "significativamente" porque muitos países já o estão a fazer. Se ficar parado, como até aqui, pode afugentar investidores, alerta Álvaro Santos Pereira, o diretor da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), com a pasta dos estudos económicos nacionais.

Ontem, em entrevista ao DN/Dinheiro Vivo, a partir de Paris, depois da apresentação das perspetivas económicas da OCDE do outono, o ministro da Economia do anterior governo PSD-CDS defende que "para termos mais investimento privado, a economia portuguesa tem de se tornar mais atrativa para o investimento direto estrangeiro".

"No caso do investimento dos portugueses muito dependerá da questão do crédito, do financiamento e, obviamente, da saúde dos bancos", mas para captar novo IDE, "o mais importante, além da estabilidade, é criar as condições para mudar o tax mix (combinação de impostos), baixando significativamente o IRC".

"Isso é prioritário, está a acontecer em muitos países da OCDE. Penso que é importante que a reforma do IRC seja retomada em Portugal o mais cedo possível", refere. "Portugal tem de ter uma fiscalidade empresarial o mais atrativa possível na Europa."

"Temos tido aumento do investimento, sim, mas é insuficiente." Aponta para o caso da expansão do turismo, mas logo de seguida contrapõe que "é importante que isso se alastre a outros setores", "falta mais investimento na área dos serviços e, claramente, na indústria transformadora".

Santos Pereira "prefere não comentar" a subida da derrama do IRC para empresas com lucros mais elevados aprovada no novo Orçamento do Estado (OE 2018), mas diz que havia melhores maneiras de a desenhar. "Não me escandalizaria se aumentasse o IRC em setores onde ainda há rendas excessivas ou existem quase monopólios, para aliviar outros. Poderia ser até interessante para aumentar a concorrência nesses setores mais rentistas."

E o défice? Podia haver menos obsessão em reduzi-lo? Jamais, defende. "Se se diminuem as receitas num lado, tem de se aumentar noutro para não afetar a consolidação orçamental." Isto porque é preciso reduzir o défice para não acumular dívida.

Para financiar a forte redução do IRC que defende, o antigo ministro da Economia diz que "em muitos países da OCDE a solução encontrada passa, por exemplo, por aumentar os impostos ambientais", reduzindo a poluição e os níveis de dióxido de carbono.

Todo o discurso de Santos Pereira tem como pano de fundo a dívida. "A nossa economia continua demasiado endividada. Com uma dívida pública de quase 130% do PIB, uma dívida externa de 213%, se houvesse um choque externo em que os governos tivessem de agir para atenuar esse choque, uma das economias mais afetada era a nossa", alerta.

"É óbvio: nós, com níveis de dívida destes, temos muito menos margem de manobra. Pode até não haver nada nos próximos tempos, mas mais cedo ou mais tarde haverá algum ajustamento em algum lado e se não desendividarmos a economia isso pode afetar-nos a sério. Precisamos de reduzir a nossa vulnerabilidade."

Se é tão urgente, o défice devia chegar antes de tempo aos 0% ou a um excedente. Álvaro Santos Pereira recorda que "há anos de eleições, há ciclos políticos", mas que sim. "É aconselhável que exista um equilíbrio financeiro o mais cedo possível, sem dúvida."

O diretor da OCDE não aconselha o governo a enveredar por mais orçamentos expansionistas doravante, mas respeita as opções tomadas até agora. "Desde que a política não seja demasiado expansionista, como neste momento, há um bocadinho de margem." Sendo verdade também que "o governo, obviamente, está a dar mais primazia ao consumo, mas podia não o fazer e tentar reduzir mais a dívida. São opções políticas".

A subida do salário mínimo não levanta problemas, "para já". "Parece-me evidente que o salário mínimo nacional tem de aumentar nos próximos anos. O rendimento médio ainda é muito baixo em Portugal e é fundamental para diminuir as desigualdades e para aumentar o bem-estar", começa por dizer. Mas aumentos "muito acima da produtividade não são saudáveis". "Neste momento, não estamos a falar em valores extraordinários de aumento do salário mínimo. Mas é preciso ter atenção daqui para a frente."

Melhor gestão, mais qualificações e consolidação de PME, aumentando a dimensão média das empresas portuguesa, também ajudaria a subir a produtividade, conclui.

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