Álvaro Amaro: "Portugueses escolheram quem lhes deu uma perspetiva de futuro"
Depois de Luís Montenegro, Paulo Rangel também anunciou que não vai disputar a liderança do PSD. Rui Rio vai correr sozinho?
Por agora não há nenhum candidato formal à liderança. Rui Rio, mesmo que ainda não o tenha feito formalmente, digamos que politicamente já o fez. Outros não vão, por razões que são, naturalmente, respeitáveis, mas isso não retira qualidades àquele ou àqueles que se apresentarem e a quem venha a ser o novo líder do PSD. O PSD está acima disso.
Passos fez bem em sair? Concorda com esta decisão?
Concordo, em absoluto. Deu uma lição a quem pensa que o apego ao poder vale por si. E sublinho a grande dignidade e a grande responsabilidade políticas que demonstrou.
Há quem defenda que devia ter saído há dois anos, quando caiu o governo...
Respeito essas opiniões, eu tê-lo-ia feito. Mas Passos Coelho demonstrou que acima dele e do PSD põe o país. Não usou de taticismos então e agora também não. Acho que fez muito bem.
É o presidente dos Autarcas Social Democratas. Como é que viu os resultados do último domingo?
Foi mau demais. Confesso que me surpreendeu... Foi mau demais.
Como é que explica estes resultados?
É uma verdade La Palisse, mas as eleições autárquicas têm muito de local e de pessoal, caso contrário eu e tantos outros não teríamos aumentado substancialmente a votação. Também não é menos verdade que existe uma componente nacional nas autárquicas - recordo que já fizeram cair um primeiro-ministro [Guterres, em 2001]. O problema nestes dois anos - e talvez tenha estado aí o grande erro - foi o PSD não ter percebido que desde que se formou uma solução política inovadora, a geringonça, estava aí uma nova realidade política. O PSD comportou-se politicamente como se essa nova realidade não estivesse no terreno. Estas autárquicas responderam a isso: na quota-parte de leitura nacional houve uma clara rejeição do eleitorado ao discurso e à ação política do PSD nestes últimos dois anos. Isso parece-me óbvio. E, ninguém fala nisso, mas também houve uma rejeição à postura política do PCP e do BE. Dou o exemplo da Guarda: perderam metade do eleitorado. Há um efeito tesoura do PS à sua esquerda que vai conduzir a grandes alterações de comportamento político à esquerda do PS.
Vai haver problemas na geringonça?
Não tenho dúvidas e vamos ver se chega ao fim. Não acredito que chegue. Também por isso acho que o PSD deve recentrar o seu discurso e a sua ação. Se isso já era claro para mim nestes dois anos, agora mais. O PS guinou à esquerda, há uma grande componente do eleitorado que se sentiu politicamente órfã nestes dois anos. O PSD tem de se aproximar destas pessoas, que não querem esta fórmula política mas que também não viram uma esperança no PSD porque o PSD não falou às pessoas, falou aos números. Não estou a dizer que o PSD não fez um trabalho notável, histórico, para salvar o país. Fez e Passos ficará para a história como um grande político que salvou o país. Mas depois disso, algo de diferente devia ter sido feito. Isto para não falar na gestão política das autárquicas: foram erros a mais. Mas, mais importante, foi o discurso que não chegou a tantos e tantos milhares de portugueses que, não gostando da geringonça, não encontraram esperança no PSD, que não falou ao centro, não falou para a classe média, não devolveu esperança aos pensionistas, aos funcionários públicos, aos pequenos e médios empresários. Isso foi um grande erro estratégico.
O CDS pode fazer sombra ao PSD? Há esse risco?
Não. O que há são circunstâncias. Assunção Cristas tem-se revelado muito capaz, muito assertiva, de certa maneira ocupou um espaço político órfão - uma pequena parte desse espaço. Nunca deixou de se orgulhar do governo de que fez parte, honra lhe seja feita, mas teve uma voz de esperança a partir de Lisboa. E isso teve um efeito positivo. Teve a arte e o engenho de transportar uma imagem nova, um discurso novo, sem nunca ter negado o passado. O PSD não o fez. Os portugueses escolheram quem lhes apresentou alguma perspetiva de futuro e não justificações do passado, isto é claro.
Olhando para as autárquicas e para as sondagens, o PSD não teme estar perante uma travessia do deserto?
O PSD não é um partido de temer nada. Em primeiro lugar, honra ao Dr. Rui Rio, que tendo ou não como adversário Passos Coelho, é sabido que seria candidato à liderança. Não apenas para disputar a vitória daqui a dois anos - essa é que tem de ser a ambição - mas também para, quase diria, restaurar a linha estratégica do PSD. Com isto não estou a criticar Passos Coelho, se foi mais liberal ou mais social-democrata, essa discussão não interessa, foi aquilo que tinha de ser para salvar o país.
Quem é a melhor pessoa para fazer esse trabalho de recentrar o PSD?
Não conheço formalmente nenhum candidato, não posso adiantar mais. Aguardo com expectativa para ver quem são os candidatos.
É altura de a nova geração avançar?
Não aprecio particularmente essa história da nova geração. Mas que nova geração?! Eu tenho 64 anos e também me considero da nova geração. Rui Rio é tão da nova geração como aqueles que têm 40 ou 50 anos, que se calhar podiam agora avançar. Agora é que é a hora. Agora está em causa uma reorientação estratégica - não é doutrinária, é estratégica - perante o país. O taticismo de "agora vamos ver como é o resultado daqui a dois anos e depois logo se vê"... O PSD de que eu tenho orgulho não é um partido de tantas táticas, é um partido de lutar pelas vitórias. Este é um momento histórico da vida política, com grande responsabilidade para o PSD. Por isso valorizo a responsabilidade e a coragem de Rui Rio, esperando que outros também o façam.