Alunos de privada encerrada: "Não limpem as mãos da responsabilidade. Não fechem o ISCEM"
Os alunos do Instituto Superior de Comunicação Empresarial (ISCEM) escreveram uma carta aberta aos responsáveis pelo ensino superior onde lhes pedem que não fechem a instituição se realmente querem salvaguardar os interesses dos estudantes. Devem antes, dizem, exigir a correção dos problemas administrativos, "que já estão a ser resolvidos".
"Não limpem as mãos da responsabilidade, porque estão a prejudicar os alunos mais do que ninguém. Não nos digam que vamos ficar melhor sem conhecer a nossa realidade", lê-se na carta aberta ao ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, ao diretor-geral do Ensino Superior, João Queiroz e ao presidente da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), Alberto Amaral.
A posição dos alunos do ISCEM, que constituíram uma comissão, surge três dias após de ser conhecida a decisão do governo de fechar compulsivamente o ISCEM por não cumprir requisitos legais exigidos para o ensino superior. A decisão da A3ES de não acreditar este instituto é fundamentada pela falta de qualidade do corpo docente, que tem uma baixo número de doutorados, deficiências nas instalações, fraca política de captação de alunos que se limita ao "passa palavra" e acumulação de funções pela mesma pessoa.
Além do ISCEM, foi anunciado o encerramento compulsivo de outras seis instituições de ensino superior privado: a Escola Superior de Tecnologias e Artes de Lisboa, a Escola Superior de Educação Jean Piaget, o Conservatório Superior de Música (ambos em Gaia), a Escola Superior de Educação Almeida Garrett, o Instituto Superior de Novas Profissões, em Lisboa, e a Escola Superior Artística de Guimarães.
"As irregularidades que a A3ES aponta ao Instituto Superior de Comunicação Empresarial (ISCEM) são meramente administrativas (algumas estando já resolvidas), não pondo em causa a qualidade do seu ensino, até porque os cursos que leciona estão acreditados", escreve a comissão representativa dos alunos na carta aberta.
Mais: "Existem de facto poucos professores doutorados para o número de alunos, o que não deixa de ter uma justificação: o ISCEM é um Instituto Politécnico que tem como pilar do seu modelo o ensino prático e a proximidade com o mercado de trabalho. Nessa lógica, a contratação de professores com longa experiência (especialistas) e altos cargos na área acaba por prevalecer à de professores doutores que não têm contacto com a realidade do mercado de trabalho", lê-se ainda na carta aberta.
A Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior aponta uma elevada carga horária atribuída aos professores e diz que dos 22 docentes, só seis estão a tempo integral, sendo que, destes, "apenas três são doutorados, nenhum em marketing, área científica em que se situam os quatro ciclos de estudos oferecidos pelo instituto".
Os alunos do ISCEM querem que os órgãos do poder ouçam as suas preocupações e anseios. Por isso, já pediram audiências ao ministro Manuel Heitor, ao ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, e a todos os grupos com assento parlamentar. Porque querem fazer ouvir as sua preocupações, mas também porque querem transmitir que tipo de ensino se pratica no ISCEM - um tipo de "ensino de excelência" que fazem questão de enaltecer, por ser muito prático e de grande proximidade entre professores e alunos.
"O modelo de ensino do ISCEM inclui estágios integrados nos cursos técnicos superiores profissionais e nas licenciaturas, inclui dois projetos de ateliers que se caracterizam pela resolução de problemas empresariais, de marketing e comunicação reais propostos por dezenas de empresas parceiras do ISCEM, representativas de todo o tecido económico nacional", explicam na carta aberta.
Carlos Mariano de Carvalho, aluno do 2º ano de Comunicação Empresarial, destaca outra questão que está a preocupar os cerca de 200 estudantes do ISCEM - as equivalências.
Embora a lei assegure a colocação dos alunos no setor público sempre que uma faculdade privada seja encerrada compulsivamente, os alunos querem ver garantido que "não há o risco, por exemplo, de pessoas que agora passaram para o 3º ano perderem dois anos de ensino e 7000 euros pagos em propinas ao passarem para o ensino público."
Uma nota do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior refere que estão a ser desenvolvidos contactos com o Instituto Superior Técnico de Lisboa e com o de Setúbal para acolher os alunos do ISCEM. O ISCTE também é apontado como uma possibilidade.
Carlos Mariano de Carvalho defende que as equivalências deveriam ser atribuída por créditos e não pelo nome das cadeiras para que os alunos não sejam prejudicados e não se vejam obrigados a repetir disciplinas.
"Achamos que é uma situação que tem que ser tratada com celeridade e que é preciso haver diálogo. Mas é necessário reforçar a questão dos timings: estamos praticamente em agosto e em setembro começa já o ano letivo. Esta é a nossa preocupação."
Os alunos fazem ainda questão de lembrar que o ISCEM conta com quase 30 anos de história e com cerca de 5000 alunos formados "sendo notório o seu nível elevado de formação prática, visível em dezenas de quadros superiores, gestores, empreendedores colocados em grandes empresas portuguesas, multinacionais, agências de comunicação e publicidade quer em Portugal quer em todo o mundo, o que constitui uma prova absoluta da qualidade deste modelo de ensino."
No comunicado divulgado na quarta-feira pela direção do ISCEM - assinado pela nova diretora, Natália Teixeira, que substituiu a presidente e proprietária Regina Moreira, o que terá corrigido uma das irregularidades apontadas pela A3ES - refere-se que "segundo as estatísticas oficiais dos cursos superiores, a taxa de empregabilidade da licenciatura em Comunicação Empresarial é de 95,4% e 96,6% da licenciatura de gestão de marketing".
A direção do ISCEM faz questão de sublinhar que ainda não recebeu o despacho de encerramento compulsivo.