Aliança Democrática. A coligação que o PS nunca venceu

Os eleitores têm premiado o PSD e o CDS quando os dois partidos se apresentam coligados para eleições à Assembleia da República. Nas eleições Europeias é ao contrário: a AD perde sempre. Já poder local, essa coligação representa, na prática, a 3ª maior força.
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O histórico das coligações pré-eleitorais entre o PSD e o CDS em eleições para a Assembleia da República é simples: concorreram três vezes (1979, 1980 e 2015) e venceram sempre. Na sequência das duas primeiras eleições, a coligação formou Governo (o primeiro dirigido por Sá Carneiro e o segundo por Francisco Pinto Balsemão); em 2015 já não porque, embora a coligação "Portugal à Frente" (Passos Coelho + Paulo Portas) tenha vencido, a maioria absoluta ficou do lado da esquerda parlamentar, decidindo esta dar suporte a um Governo formado pelos socialistas, sob a liderança de António Costa, a famosa 'geringonça'.

Nas eleições europeias a história é outra. Aqui a coligação PSD/CDS perdeu sempre que se candidatou, para o PS: em 2004, com João de Deus Pinheiro encabeçando a lista; e em 2014, com Paulo Rangel.

Em ambos os casos, essas derrotas ocorreram quando o PSD e o CDS governavam o país - as Europeias serviram portanto como forma de penalização. E as duas vitórias socialistas foram conquistadas pelos seus dois líderes mais esporádicos: Eduardo Ferro Rodrigues (2004) e António José Seguro (2015). Ambos acabaram pouco depois afastados da liderança do partido: Ferro porque se demitiu e Seguro porque foi derrotado por António Costa, que alegou que a vitória que o PS tinha acabado de obter era "poucachinha".

Conceptualmente, a "Aliança Democrática" (AD) - como aquela que agora o PSD e o CDS se preparam para ressuscitar - é uma coligação pré-eleitoral. No entanto, os entendimentos entre os dois partidos podem não ocorrer sempre dessa forma. Às vezes foram pós-eleitorais.

De 1985 a 1995, o PSD, liderado por Cavaco Silva, governou sempre sozinho, numa primeira legislatura em minoria e nas outras duas com maioria absoluta. Desde então, porém o PSD só tem governado aliado com o CDS, e nas duas vezes em que isso aconteceu (de 2002 a 2005 e de 2011 a 2015), foi sempre na sequência de entendimentos assinados depois de eleições em que cada um dos partidos concorreu por si. Em 2015, Passos Coelho e Paulo Portas concorreram coligados e chegaram a formar um governo, que durou apenas dias, destronado pela maioria de esquerda no Parlamento.

Além do mais, o "espírito" da AD estende-se muito para lá de eleições legislativas. Nas eleições presidenciais, por exemplo, os dois partidos estiveram quase sempre de braço dado apoiando o mesmo candidato.

Aconteceu em 1976 (Ramalho Eanes), em 1980 (Soares Carneiro), em 1986 (Diogo Freitas do Amaral), em 1986 (Cavaco Silva), em 2001 (Joaquim Ferreira do Amaral), na eleição (2006) e reeleição (2011) de Cavaco Silva, na eleição e reeleição de Marcelo Rebelo de Sousa (2016 e 2021).

Na prática, só numa eleição presidencial é que os dois partidos estiveram divididos: em 2001, na reeleição de Mário Soares para um segundo mandato em Belém. O PSD, liderado por Cavaco Silva (então primeiro-ministro) apoiou-o e o CDS ficou sozinho com o seu candidato, Basílio Horta. Mário Soares passou nessa altura a deter um recorde ainda hoje por bater: obtendo 3,5 milhões de votos, é o político mais votado de sempre em Portugal.

Além do mais, é vasto o histórico de coligações autárquicas entre os dois partidos.

Atualmente, existem 40 câmaras governadas a partir de entendimentos entre os dois partidos, muitos dos quais envolvendo outros partidos (o PPM, o MPT e até, num caso, a Iniciativa Liberal). Foi precisamente devido a uma coligação com o CDS, que envolveu também o MPT e o PPM, que os sociais-democratas conseguiram conquistar para Lisboa a presidência da Câmara Municipal de Lisboa, roubando-a ao PS.

Ao todo , as coligações autárquicas que envolvem (pelo menos) o PSD e o CDS detém 330 eleitos nos executivos municipais, 1032 nas assembleias municipais e 431 presidentes de juntas de freguesias, a que se somam centenas de eleitos para as assembleias de freguesia. Na verdade, no poder local, a coligação PSD/CDS é a terceira maior força, com mais de meio milhão de votos, só atrás do PSD (cerca de 600 mil votos) e do PS (o maior partido autárquico, com 1,6 milhões de votos).

No poder político nacional, a chegada da AD ao poder conduziu, através de entendimentos com o PS (então liderado por Mário Soares), a reformas profundas na natureza constitucional do regime.

Na verdade, na revisão constitucional de 1982 "civilizou-se" o regime ao ser consagrada a extinção do Conselho da Revolução e criado o Tribunal Constitucional, através do qual passou a existir a possibilidade de fiscalização preventiva de constitucionalidade das leis.

Foi também diminuída a carga ideológica do texto constitucional, flexibilizando-se o modelo económico - o modelo socialista assente nas nacionalizações deixou de ser um imperativo, o que abriria depois o caminho à reprivatização dos setores da banca e dos seguros.

Os poderes do Presidente da República também foram moderados As escolhas das chefias militares passaram a ser do Governo; eliminou-se o princípio da responsabilidade política do Governo exclusivamente perante o Presidente da República, passando a ser perante este e perante a Assembleia da República.

A inclusão na Aliança Democrática do então líder do Partido Popular Monárquico, o arquiteto Gonçalo Ribeiro Telles, permitiu também os primeiros ensaios de uma política ambiental. Como ministro de Estado e da Qualidade de Vida, Ribeiro Telles lançou um regime sobre o uso da terra e o ordenamento do território, criando as zonas protegidas da Reserva Agrícola Nacional, da Reserva Ecológica Nacional e ainda as bases do que viriam a ser os planos diretores municipais. Enquanto deputado, Ribeiro Telles teve responsabilidades nas propostas da Lei de Bases do Ambiente, da Lei da Caça e do regime legal sobre as avaliações de impacte ambiental.

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