Al Pacino - o regresso do camaleão ao pequeno ecrã
Al Pacino pode envelhecer à vontade. Até lhe daríamos licença para se desleixar. Afinal teremos sempre Michael Corleone, Serpico, Tony Montana, e tantos outros. Mas não está acabado. É com o peso desse carisma que lida Paterno, produção televisiva da HBO, assinada por Barry Levinson, que se engrandece com o seu rosto cansado e só aparentemente perdido no meio do jogo dramático (não era já assim em A Humilhação, o anterior filme que fez com Levinson?). Pacino é um ator do "método" e isso ainda se nota na inteligência dos seus gestos, que apenas simulam um alheamento. Nunca, jamais um desleixo. Acontece que desta vez ele interpreta, lá está, o alheado Joe Paterno (1926-2012), celebérrimo treinador de futebol americano da Universidade de Penn State. Mais precisamente, dá expressão aos derradeiros dias deste homem venerado, encobertos pela névoa mediática do caso Jerry Sandusky - o seu assistente técnico, fundador de uma instituição de caridade para jovens, acusado de abusos sexuais a menores, mesmo debaixo do seu nariz...
Neste filme, Joe Paterno é então essa figura de 84 anos que Pacino não só imita bem como lhe dá gravidade corporal. Enquanto tudo "arde" à sua volta, ele, treinador ainda em atividade, com 409 vitórias no currículo, não desvia nem por um minuto as atenções de uma partida de futebol, cuja estratégia deve estudar afincadamente. Não se interessa pela polémica do seu companheiro profissional, porque diz acreditar no trabalho da justiça, como se ignorasse a sua própria importância enquanto semblante máximo da Universidade. Onde estava quando os rumores da má conduta de Sandusky começaram a circular? O que fez para travar a realidade por detrás das primeiras denúncias? É sobre isso que se debruça Barry Levinson. Ou seja, sobre o tormento mental de Paterno, verdadeira lenda americana, caído numa angustiada introspeção e busca pela memória.
Cinema liberal
No fundo, a alienação deste homem é o grande tema do filme - já de si comprometido com a luta pela verdade jornalística, de resto, tão atual. O que pesa sobre os dias aqui retratados é o modo como o treinador se barricou perante os fenómenos em seu redor, consequência de uma carreira virtuosa. Mas Paterno é também uma amostra da boa tradição do cinema liberal americano. Levinson tentou passar esse ADN para a linguagem televisiva, acelerando a montagem, e propondo uma abordagem psíquica e fragmentada do protagonista.
Joe Paterno morreria de cancro do pulmão meses depois do caso Sandusky estalar, deixando um espaço vazio na história que não se procura preencher, mas usar como território para Al Pacino explorar.