AINDA HÁ ESPAÇO PARA A PACIÊNCIA NA ERA DO 'DRIBLO-CLIP'
Odrible em três actos inventado por Robinho, no último Brasil-Equador, é daquelas crueldades que deviam constar nos interditos da Convenção de Genebra. Três pedaladas, um falso cruzamento de letra, uma rápida troca de pés com saída pelo lado fechado e eis a respeitável carreira do equatoriano Ulisses de la Cruz feita em fanicos perante o olhar compadecido de milhões.
Com todos os efeitos nocivos que trouxe ao futebol - o maior dos quais transformá-lo em pretexto de fundo para anúncios da Nike e clips de pronto-a-comer -, a "era YouTube" valorizou, mais do que qualquer outro tempo, a habilidade dos extremos. Último refúgio do talento puro, num tempo em que o metro quadrado na zona central custa os olhos da cara, a linha lateral é o espaço onde ainda é permitido inventar e perder a bola. É a reserva natural que alimenta os sonhos dos miúdos e vai permitindo ao futebol manter o sorriso, de tempos a tempos.
Mas os clips não mostram o trabalho de garimpeiro que se esconde por detrás deles: cada pepita no YouTube, como as de Robinho, ou as de Cristiano Ronaldo, Quaresma, Messi ou Mancini esconde toneladas de cascalho inútil, obras inacabadas que o resto da equipa tem de varrer, uma, cinco, dez vezes, para debaixo do tapete. O YouTube engana, porque faz esquecer o papel decisivo que a paciência representa no futebol. Por isso, os novos consumidores (como os norte-americanos, desde sempre) são cada vez mais incapazes de lidar com a esmagadora maioria dos minutos em que nada de genial acontece. Se Flávio Murtosa fosse um mero consumidor de driblo-clips, não teria permitido que Ricardo Quaresma continuasse em campo após a décima finta travada pelas pernas anónimas de um cazaque. E Quaresma não teria inventado, ao 11.º take, o cruzamento que permitiu a Makukula escrever com a cabeça uma das páginas mais folclóricas da história da selecção. Rendamo-nos à evidência, os nossos avós tinham razão. A paciência é mesmo uma grande virtude e nenhum extremo do planeta ousaria desmenti-lo.
Fabregas
Completou 20 anos em Maio, mas já soma quase 150 jogos com a camisola do Arsenal e uma fase final de um Mundial sénior no currículo. O espanhol tem lugar cativo na lista de jovens jogadores destinados à glória pelo menos desde 2004, mas o eclipse dos gunners retirou-lhe protagonismo. As qualidades, porém, permanecem intactas: tremenda lucidez e maturidade, notável capacidade de passe e uma autoconfiança que contraria o bom senso com vantagem. É uma das figuras deste início de época, com a liderança do Arsenal na Premier League como principal cartão-de-visita. E forma, com Xavi e Iniesta, um trio a meio-campo que qualquer seleccionador desejaria ter.
CAN-2008
Hoje, Acra, capital do Gana, acolhe o sorteio da fase final da Taça das Nações Africanas (CAN), que vai jogar-se em Janeiro. Os clubes europeus, privados de alguns dos seus melhores jogadores durante quase um mês, torcem o nariz, mas é óbvio que o interesse da prova subiu em flecha nos últimos anos. Com todos os grandes craques do continente em acção (e são cada vez mais a fazer companhia a Drogba, na foto, Essien e Eto'o?), e com Angola à procura de uma inédita qualificação para a segunda fase, eis um torneio que merece ser seguido. A começar com a definição dos grupos da primeira fase.
Timor- Leste
A História tem destas ironias: oito anos depois dos massacres em Díli, cinco anos depois da independência, o primeiro jogo da selecção de Timor-Leste num Mundial de futebol será cumprido em solo indonésio, este domingo. A pedido da federação timorense será o estádio de Gianyar, em Bali, a acolher o novo membro da família-FIFA na partida de qualificação para 2010, frente a Hong Kong, já que em Timor não existem palcos homologados para jogos internacionais. O baptismo mundialista da Ilha do Sol Nascente será efectuado durante o dia, por falta de iluminação artificial. O que, vendo bem, só reforça o simbolismo da coisa. |
*Director adjunto do Maisfutebol