"Adoro espalhar a-m-o-r e poder dizer a todos que vos amo"

O saxofonista norte-americano Maceo Parker regressa a Portugal e ao EDP CoolJazz com um duplo objetivo: partilhar com os espectadores o espírito da música - e do funk - e a mensagem de que devemos nutrir mais amor uns pelos outros
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Parker é um apelido sinónimo de música. E Maceo é um nome sinónimo de funk e de boa disposição. Aos 74 anos, o saxofonista e cantor oriundo de Kingston, uma pequena terra da Carolina do Norte, tem uma longa carreira iniciada na banda de James Brown em 1964 e que prosseguiu com muitas outras colaborações, casos de George Clinton e de Prince, mas também ao gravar e tocar em nome próprio. Maceo continua a mostrar-se apaixonado pela vida que leva e mantém um sentido de humor à prova de rugas, como se comprova pela entrevista telefónica que se segue.

Alô? Mr. Parker?

Não, Mr. Parker era o meu paizinho. Sou o Maceo (risos).

OK. É verdade que ainda dá 290 concertos por ano?

Bom, a primeira coisa que me vem à cabeça é quem é que faz a contagem? Não sei de onde veio esse número, mas à medida que os anos passam sinto que nasci para viajar mundo fora e fazer o que faço. Seja que número for, eu já não os conto. Tenho verdadeiro prazer em estar à frente das pessoas e em entretê-las.

Portanto, reforma é uma palavra que não existe no seu dicionário.

(risada) Bem, deverá chegar um dia em que será mesmo muito, muito difícil levantar-me de manhã e já não me lembro de como montar o saxofone. Quando chegar a um ponto em que me chamem e eu não responda... (risos) continuarei enquanto puder. Ainda não fiz dinheiro para me reformar. Eu estou tão satisfeito pelo que tenho feito ao longo dos anos... A Sandra Bullock repete num filme [Miss Detective] "paz mundial". E eu digo amor. Sinto-me afortunado de ainda poder andar pelo mundo fora e partilhar o espírito da música. E adoro espalhar o a-m-o-r por aí fora e poder dizer a todos que vos amo. Se toda a gente vivesse com um pouco mais de amor toda a loucura e coisas negativas seriam diminuídas.

Antes de cada concerto pensa para si próprio, como James Brown lhe dizia, "Vamos, Maceo, sopra essa corneta"?

Fico entusiasmado só por estar numa cidade diferente ou num país diferente, porque as pessoas estão ali para me ver ou ouvir. E também porque posso espalhar a mensagem de amor. Não preciso de mais nenhuma motivação. Eu comecei a fazê-lo com 5, 6 anos ao piano. Ainda não sabia o que estava a fazer, mas era capaz de imitar ao piano uma senhora que tocava no coro da igreja em que a minha mãe cantava. Quando faziam uma pausa eu sentava-me ao piano e fazia a mesma coisa. "Como é que esta criança de 5 anos consegue tocar o tema inteiro?" Era fácil para mim, mas não fazia ideia de que era um feito.

Vem de uma família de músicos. Ainda toca com familiares?

O meu sobrinho Marcus já não está no grupo há um par de anos. Às vezes o meu filho Corey junta-se a mim na bateria. Tenho três filhos (de cinco) que tocam: dois bateria e o outro saxofone. Todos ensinam música. Tenho dois bateristas que trabalham comigo, Peter MacLean e Nikki Glaspie, que tocou com a Beyoncé e é muito requisitada porque é uma novidade, uma mulher baterista funky. Os restantes instrumentistas são William Bovell (teclados), Rodney Skeete Curtis (baixo), Bruno Speight (guitarra), Greg Boyer (trombone), que é o meu braço direito; e a minha prima de Seattle Darlene Parker é a vocalista.

De vez em quando faz concertos com a Ray Charles Orchestra. O que pode dizer sobre esse espetáculo?

O que fazemos é um tributo à sua música e ao seu estilo. Descobri que para mim é muito fácil imitar o Ray Charles, quando canto. Desde adolescente que o conheço, mas não tinha consciência de que a minha voz era parecida com a dele. É como um sonho tornar-se realidade, apesar de nunca ter desejado fazer parte da banda de Ray Charles. Sinto-me como uma criança quando trabalho com a banda de Ray Charles e estou à frente dela como se fosse o Ray.

Tocou com grandes nomes, como James Brown ou George Clinton. Consegue escolher aquele concerto em que pensou: melhor que isto é impossível?

Ah, bara-bara-bum! Aquele com quem me senti muito perto foi James Brown. Logo no início, quando ele dançava e se mexia como ninguém, era muito, muito especial. Estava a meio metro, um metro dele e era como se eu estivesse a ir à escola de James Brown. Porque eu interrogava-me e maravilhava-me sobre tudo o que ele fazia. Eu pensava, "uau, isto é grande!" Por vezes tinha de me beliscar para acreditar que era verdade, estar a tocar com uma grandeza daquelas. E com o George Clinton também. Tive muita sorte em frequentar as escolas destas figuras tão talentosas da música.

Está a trabalhar num disco novo?

Só em ideias. Estou sempre a escrever coisas. A resposta à pergunta é sim, apesar de ainda não ter ido para estúdio.

O que gostaria de fazer e que ainda não teve hipótese de fazê-lo?

Oh-oh-oh! Eu sei que isto não pode acontecer, mas se pudesse parar o tempo (risos), se tivesse uma varinha mágica abrandava o processo de envelhecimento. Era o que faria.

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