Acordo no Carnaval, mas governo alemão só lá para a Páscoa
"Cansados. Mas satisfeitos. Acordo, por fim!" Foi através de uma mensagem, via WhatsApp, que os sociais-democratas (SPD) anunciaram, ontem de manhã, terem chegado a um entendimento com os democratas-cristãos (CDU) e com o partido irmão da Baviera (CSU) para renovarem a grande coligação que governou a Alemanha desde 2013.
Apesar de ter obtido o pior resultado da sua história, o SPD de Martin Schulz acaba por ser o grande vencedor das negociações, ao ficar com as pastas das Finanças, Negócios Estrangeiros, Trabalho, Justiça, Ambiente e Família. Tão ou mais importante, viu as suas propostas políticas aprovadas. Ao ponto de um deputado da CDU, Olav Gutting, ter desabafado no Twitter: "Ufa! Pelo menos ainda temos a chancelaria." Julian Reichelt, o chefe de redação do Bild, o jornal mais vendido na Alemanha, também usou aquela rede social para resumir a situação: " Este vai ser o primeiro governo do SPD dirigido por uma chanceler da CDU."
O SPD conseguiu ainda incluir uma cláusula de avaliação do governo na metade do mandato, uma forma de pressionar o curso do governo e de dar mais um argumento para os afiliados sociais-democratas darem o consentimento ao pacto. É que o acordo entre os partidos põe fim às negociações iniciadas em novembro, mas o processo ainda não chegou ao fim. Os 463 mil militantes do SPD são agora chamados a pronunciar-se, pelo que irão votar por correspondência.
"Agora vamos convencer os militantes de que obtivemos um acordo muito bom", disse Martin Schulz. O resultado será anunciado no dia 4 de março. Só depois Angela Merkel poderá nomear os membros do governo e o pacto de governo ser assinado. Segundo a Deutsche Welle, o novo governo entrará em funções por alturas da Páscoa, ou seja, no final de março. As eleições realizaram-se em 24 de setembro.
Caso os sociais-democratas vetem a coligação, resta uma de duas soluções inéditas na Alemanha: um governo minoritário ou a convocação de novas eleições.
Angela Merkel, que irá liderar o país num quarto mandato, reconheceu que as últimas 24 horas de negociações ininterruptas foram duras. Em especial a escolha dos nomes para cada um dos ministérios. Mas no final afirmou-se "convencida de que este contrato de coligação são as bases para um governo estável de que o país precisava e que muitos no mundo esperavam".
O acordo de 177 páginas define as políticas em cada setor. Se a Europa foi o troféu com que Schulz se apresentou no início da semana -tendo anunciado o fim da austeridade fiscal e um orçamento para investir na zona euro -, a Saúde e o Trabalho foram os últimos temas em que democratas-cristãos e sociais-democratas chegaram a consenso. Os últimos queriam acabar com os contratos a prazo, mas aceitaram a limitação dos mesmos a 18 meses, contra os 24 meses atuais. As partes acordaram a criação de uma comissão de estudo sobre a viabilidade de uma taxa igual no setor público e privado por parte dos utentes dos serviços de saúde.
FIGURAS
Martin Schulz
> Negócios Estrangeiros A confirmar-se o acordo por parte dos seus militantes, o anterior presidente do Parlamento Europeu salva a face ao conseguir impor uma mudança de políticas em setores-chave e na política para a União Europeia. Após as eleições anunciara o fim da coligação e que iria liderar a oposição. Ontem confirmou que deverá ser o próximo responsável pelas relações externas e anunciou que se demite da liderança do SPD.
Olaf Scholz
> Vice-chanceler e Finanças O presidente da Câmara de Hamburgo - a segunda maior cidade do país - vai ser um dos rostos da mudança do rumo do governo, ao suceder a Wolfgang Schäuble. O social-democrata de 59 anos é considerado um político pragmático, centrista e pró-europeu.
Horst Seehofer
> Administração Interna A par de Martin Schulz, o líder da União Social-Cristã (CSU) - o partido irmão da CDU na Baviera - obteve um mau resultado nas eleições, mas positivo nas negociações de governo, ao ficar com o ministério responsável por uma das áreas mais sensíveis aos conservadores bávaros, a imigração. A CSU vai também ter a cargo o Ministério dos Transportes, pela mão do secretário-geral do partido, Andreas Scheuer.
Andrea Nahles
> Trabalho Ainda não é garantido que fique no governo. No anterior executivo desempenhou as funções de ministra do Trabalho e dos Assuntos Sociais, tendo sido a responsável pela introdução do salário mínimo. Após a derrota nas eleições de setembro, ascendeu à liderança do grupo parlamentar do SPD, um feito inédito para uma mulher. Aos 47 anos, mantém-se fiel à ala esquerda do partido. É apontada como a sucessora de Martin Schulz na liderança do partido.