Abutre búlgaro capturado e acusado de ser espião no Iémen

Milícia leal ao governo iemenita apoiado pela Arábia Saudita prendeu abutre com sofisticado aparelho de GPS acoplado a uma das patas.
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Nelson é um jovem abutre búlgaro capturado na guerra do Iémen e acusado de ser espião na localidade de Taiz, por causa do aparelho de localização que transportava e que uma milícia considerou servir para os espiar e transmitir segredos militares.

A sua salvação foram os muitos iemenitas que, num país onde milhões de pessoas estão em risco de morrer à fome e que a ONU qualifica como a pior tragédia humanitária dos últimos anos, se mobilizaram para o alimentar e salvar.

Taiz situa-se na linha da frente da guerra que opõe o regime apoiado pela Arábia Saudita aos rebeldes Houthi e, segundo a BBC, terá sido a qualidade do aparelho de GPS - muito superior aos equipamentos ali existentes - transportado por Nelson a alimentar as suspeitas dos captores.

Nelson é um abutre-fouveiro, mais conhecido como grifo, e uma das 14 aves da espécie a quem a organização ambientalista búlgara Fundo para Fauna e Flora Silvestres (FWFF, na sigla em inglês) colocou elementos de identificação e localização destinados a preservar a espécie.

Os biólogos acompanharam o percurso da ave para sul - Turquia, Líbano, Síria, Jordânia, Arábia Saudita - até novembro, quando entrou no Iémen e o contacto se perdeu.

Em Taíz, os habitantes habituaram-se a vê-lo pairar sobre a localidade muito destruída e onde, este mês, um terceiro surto de cólera desde o início da guerra (2015) justificou o envio de centenas de mensagens e fotos que o FWFF recebeu no passado dia 5, manifestando preocupação com a saúde de Nelson.

O problema é que os esforços dos habitantes de Taiz para salvar o grifo chamaram a atenção da milícia liderada pelo General Salem, leal ao governo apoiado pela Arábia Saudita e reconhecido pela comunidade internacional.

Ao verem o GPS, os homens de Salem acusaram Nelson - mesmo sendo um abutre - de ser um espião ao serviço dos rebeldes Houthis e prenderam-no, transportando-o para a base da milícia.

Só que os ambientalistas búlgaros, conscientes das dificuldades em salvar uma ave num país em guerra há quatro anos, estavam a desenvolver esforços e contactos com organizações homólogas de outros países e até junto da embaixada do Iémen - de cuja capital, de cuja capital, Saná, partiu Hisham al-Hoot, ligado à organização não governamental francesa One World Actors Animal Rescue.

Depois de pedir ao general Salem que Nelson fosse libertado porque não era espião, al-Hoot foi autorizado a ver e a alimentar a ave enquanto a milícia decidia o seu destino.

Quando a ordem de libertação chegou, o 'negociador' Hisham al-Hoot transportou-o para a capital e levou-o a um veterinário, com as asas danificadas e uma ferida antiga ainda visível no pescoço. Tinha também as patas magoadas, feridas no tornozelo esquerdo provocadas pela corda que o amarrava - e pesava só 4,8 quilos, quando precisava de ter pelo menos cinco para poder voar.

Agora a ser alimentado de hora a hora com carne e água para ganhar peso e forças, espera-se que ao fim de seis semanas a dois meses esteja suficientemente recuperado para levantar voo e iniciar a sua viagem migratória de regresso à Bulgária.

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