A última lição de um mestre

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De muito bom gosto, é como classificarei a última lição de Franco Luise, o chefe executivo do Lapa Palace, que agora nos deixa. Franco Luise, é sem dúvida, um grande chefe. E é por isso que o seu país, a Itália, o quer de volta. O restaurante que dirigiu naquele hotel é para muitos gastrónomos um dos melhores, se não o melhor, da capital.

Para mim, Franco Luise é ainda um grande professor. As suas aulas eram frequentadas por quem tem o hábito de julgar o mestre. Arquitectos, médicos, economistas e quadros de empresa eram os seus alunos. Não foi apenas a cortesia que me levou na passada quarta-feira ao mais aristocrático dos bairros lisboetas. Depois da moderação que impus às sugestões que lhes transmiti para o Natal, resolvi, que uma vez por outra, é saudável desconsiderar a austeridade.

Que tal trazer para a mesa, neste fim de ano, os magníficos crustáceos portugueses? Este foi o conselho do mestre e as informações que se seguem, colhidas em boa fonte, a sua última aula em Portugal, por onde passou toda a gama de crustáceos das nossas águas, do lavagante ao camarão.

Os crustáceos devem comprar-se vivos. Olhe-os nos olhos devem ser salientes, cheios e muito brilhantes. Mortos, estarão frescos, se as patas oferecerem resistência e cozinham- -se imediatamente. A qualidade nos crustáceos é ainda mais importante do que nos peixes. Um crustáceo morto pode estar invadido por bactérias. Definitivamente, as fêmeas são melhores e mais saborosas do que os machos, sobretudo se estiverem cheias de ovos; um bom crustáceo é pesado relativamente ao tamanho.

Regressando à cozinha da verdade, cozê-los em água do mar; na sua falta, um caldo aromatizado com cebola, aipo, cenoura e ervas aromáticas, das quais se destaca o funcho, pela capacidade de fixar o sabor dos alimentos.

Uma das seduções da cozinha de Franco Luise é a simplicidade. O chefe faz questão de que os «alimentos saibam àquilo que são». Para os crustáceos recomenda apenas uma maionese ou uma vinagreta de limão. Evidentemente que vimos executar os grandes clássicos lagosta Thermidor, lavagante em bellevue, sapateira gratinada e o melhor dos crustáceos, a santola, apresentou-se em beleza e simplicidade em salada, com legumes e apenas temperada com vinagreta de limão.

Para os leitores, fixei três sugestões, originais e de fácil confecção passar por clara de ovo 400 g de caudas de lagostins limpas das carapaças e do veio escuro, passar por 150 g de amêndoas peladas e picadas a que se juntou um pouco de caril, alourar num pouco de manteiga clarificada. Servir sobre uma salada de folhagem ou como aperitivo. Por pessoa, tomar três caudas de lagostins limpas (camarões grandes), passar por leite, por sêmola fina (ou farinha fina de milho), fritar em óleo e acompanhar com molho tártaro.

Finalmente, a mais original e nunca vista paupiettes de sapateira 170 g de carne de sapateira (limpa), juntar uma clara de ovo, sal, pimenta e salsa picada e ligar com 40 g de natas; colocar um montinho do preparado sobre um quadrado de película aderente e torcendo as pontas da película, fechar bem em embrulho; colocar num recipiente para vapor e cozer de 10 a 12 minutos. Retirar o plástico e colocar sobre salada de folhagem e contornar com camarões salteados em azeite.

Nesta aula foi também ouvido ao prof . Virgílo Loureiro um conselho muito sensato um bom espumante português é preferível a um champagne francês de qualidade duvidosa. Bruto e rosé, pode acompanhar toda a refeição, do aperitivo à sobremesa. Chique!

Molhemos então os lábios para desejar boa sorte a Franco Luise, assegurando-lhe o apoio a Giorgio Damasio, seu sucessor, que sob a batuta de do director do hotel, Sandro Fabris, prometeu continuar o que iniciou entre nós defender a tradição e a criatividade, a simplicidade, a qualidade e o sabor dos alimentos. Em três palavras: o bom gosto. Para todos, os meus melhores votos.

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