A Teologia do Sofrimento

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31/03 A SIC Notícias foi a primeira a fazer a tradução da CNN o Papa João Paulo II, na sua agonia, já recebera a extrema- -unção. Mas foi a RTP N a arrancar primeiro com uma emissão especial (rapidamente exportada também para a RTP1). Curiosa competição esta, que só teria a ganhar com a total assunção por parte da RTP de que a N é um canal de notícias, o seu canal de notícias, rompendo com uma certa lógica de ne-nhures em que a RTP N parece, às vezes, instalada, e que nada a beneficia. O que mais impressiona nesta mediática noite de agonia papal (este é, definitivamente, o Papa mais mediático de sempre, na vida e na morte) é uma reportagem da CNN sobre o papado de João Paulo II qualquer coisa como 50% da população mundial não conheceu outro Papa (afinal, não foi em vão o conselho Dele: "Crescei e multiplicai-vos"). Ao Papa-atleta e vigoroso dos primeiros anos sucedeu-se um envelhecimento e uma degradação que todos fomos acompanhando, com os nossos próprios olhos, como com nenhuma outra grande personalidade da História. As dificuldades evidenciadas nos últimos anos a vários níveis, até de locomoção, levou vários a defenderem a sua resignação, naquilo que não é senão um pequeno afloramento da nossa dificuldade (talvez Freud explicasse, se não fosse uma heresia invocá-lo) em lidar com o incómodo da velhice, mais com a dos outros do que com a nossa, claro. A velhice e a doença são duas coisas que o Papa nunca quis esconder, que fez até gala de expor (como naquelas últimas e muito impressionantes imagens em que tentou desesperadamente falar à janela do seu apartamento no Vaticano). Durante a dita reportagem da CNN (em estado de breaking news), alguém chamou a esta atitude do Papa, de resistir e de se mostrar até ao fim, a Teologia do Sofrimento. É certamente uma das mais marcantes mensagens que João Paulo II lega à Humanidade. Ele, que foi um Papa contraditório, capaz dos gestos mais ousados, chamemos-lhes mesmo revolucionários (por exemplo na sua política ecuménica), mas também no sancionamento das posições mais conservadoras, chamemos-lhes mesmo reaccionárias, em matérias como a moral social (a rejeição absoluta do preservativo como contraceptivo, por exemplo, quando em África essa é uma pura questão de saúde pública). João Paulo II é, seguramente, uma das personalidades mais marcantes que passaram pelas nossas vidas. A televisão foi, não há como negá-lo, a maior responsável por esse facto. A "caixa" fez jus à fama.

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