A solidão do corredor de fundo
Brasil. Foi presidente da União Nacional dos Estudantes quando estudava Engenharia, tendo rumado ao exílio ao ser implantada a ditadura militar, em 1964. Foi deputado, governa São Paulo. E já lidera as sondagens para a corrida presidencial
De José Serra, costuma-se dizer que tem um único defeito: não é muito simpático. Até os adversários - entre os quais o Presidente Luís Inácio Lula da Silva - sempre destacaram a vida pública correcta e o prestígio moral e ético do actual governador de São Paulo, que será o candidato da direita à eleição presidencial de 2010.
Certa vez, em campanha para a presidência, em 2001 - antes de ser derrotado por Lula na corrida ao Palácio do Planalto - Serra encontrava-se na Federação do Comércio do Rio quando um pequeno empresário se levantou e disse com alguma timidez: "Gostaria de lhe apresentar uma sugestão, caso o senhor seja eleito."
Para espanto do público - pois por aqui diz-se que quem está em campanha beija até postes pela rua - Serra respondeu: "Muito grato, mas nosso baú de ideias está cheio." E recusou ouvir o modesto comerciante.
Nasceu em 19 de Março de 1942, filho único dos imigrantes italianos Francesco Serra e de Serafina Chirico. O pai era um modesto feirante, mas isso não impediu Serra de se esforçar na escola pública. É casado com a chilena Silvia Mônica Allende, que conheceu durante o exílio no país vizinho e com quem teve um casal de filhos.
Serra estudava engenharia em São Paulo quando ocorreu o afastamento do presidente João Goulart, em 1964, e a ascensão dos militares, através de um golpe.
Como era presidente da União Nacional dos Estudantes, que não aceitou a mudança de regime, teve de deixar o país. Exilou-se na Bolívia, Uruguai e Chile, onde cursou economia.
Ainda no Chile, concluiu o mestrado em economia e, em 1974, obteve o título de doutor na universidade americana de Cornell. Foi também membro do Institute for Advanced Study, da Universidade de Princeton.
De volta ao Brasil, passou a leccionar na Universidade de Campinas, no Estado de São Paulo. Iniciou a carreira pública como secretário de Economia e Planeamento do Estado de São Paulo, de 1983 a 1986.
Daí, não parou mais. Foi eleito deputado federal em 1986 e reeleito em 1990. Em 1988, perdeu a eleição para prefeito da cidade de São Paulo - ficou num modesto quarto lugar.
Na câmara federal, destacou-se nos debates para a mudança da Constituição, para retirar o resquício militar. Em 1994, foi eleito senador e, dois anos depois, tentou novamente ser prefeito de São Paulo, obtendo apenas um modesto terceiro lugar.
Quando o seu colega de partido e amigo Fernando Henrique Cardoso se tornou presidente, o senador Serra ocupou o Ministério do Planeamento - sua especialidade - e, na área da Saúde, mesmo sem ser médico, destacou-se ao reduzir gastos desnecessários e adoptou actos corajosos, como a quebra de patentes: em caso de saúde pública, o Brasil deixou de pagar patentes a laboratórios estrangeiros.
Quando acabou o Governo Cardoso, Serra foi o candidato oficial contra Lula - que já havia perdido três eleições presidenciais seguidas, sendo uma contra Collor de Mello e duas contra Cardoso.
Com o Brasil embevecido por Lula, Serra foi derrotado. Serra obteve 33 milhões de votos (38,7% do total) contra 53 milhões de Lula - 61,3%.
Mas ficou pouco tempo longe dos holofotes. Em 2004, foi eleito prefeito de São Paulo, tendo como braço direito Gilberto Kassab, do partido Democratas (DEM).
Há vários anos que PSDB e DEM actuam em conjunto. Na prefeitura de São Paulo, Serra ficou pouco tempo. Em 2006 foi eleito governador do Estado de São Paulo, onde controla um orçamento que só é inferior ao da Presidência da República.
Há dias, Serra, como governador, viu o seu aliado Kassab vencer a primeira volta da eleição municipal em São Paulo, onde pretende continuar como prefeito até 2012.
A segunda volta será no próximo dia 26: Lula já avisou que usará o prestígio para ajudar a sua aliada Marta Suplicy a ocupar a prefeitura. Todos sabem que, se Kassab for eleito, isso ajudará Serra a ser eleito Presidente em 2010. Não terá de correr contra Lula, mas com alguém indicado pelo Presidente, o que é mais fácil. Nas primeiras sondagens, Serra surge na frente - embora haja muito por vir.
Para já, os olhos de todos os analisats políticos brasileiros estão concentrados na segunda volta em São Paulo. Se ganhar Kessab, Serra tem fortes probabilidades de vir a ser eleito. Só lhe falta ser um pouco mais simpático. |