A qualidade não pode ter preço
É sabido que consumidores confiantes são fundamentais para podermos construir uma economia mais forte. Mas, neste papel de agente do consumo, quase todos os dias enfrentamos a angústia mental de sentirmos que temos de escolher entre a qualidade de um produto ou serviço e o preço que devemos pagar por ele. Vários estudos sobre o comportamento dos consumidores dizem que a maioria das pessoas acredita ao mesmo tempo que preços baixos significam bom negócio e que preços baixos é igual a qualidade inferior.
Desde logo, as marcas têm uma grande influência no sentimento dos consumidores em relação aos preços baixos. Infelizmente, muitas vezes é o marketing, em vez da experiência pessoal ou da avaliação objetiva dos especialistas, que nos leva a pensar de uma maneira ou de outra - a valorizar mais o preço ou a qualidade. (O mesmo marketing é ainda responsável por uma percentagem considerável dos custos dos produtos de consumo.)
Tipicamente, quando a publicidade de um produto se concentra no facto de ser mais barato, ele é bem avaliado pelos consumidores. Ao contrário, quando as marcas publicitam a qualidade, e não o baixo preço, os consumidores veem mais favoravelmente os produtos mais caros.
Paralelamente, o nosso estado de espírito na altura da compra também é decisivo. O que naquele momento da vida domina a nossa mente pode afetar, não só a decisão de comprar ou não alguma coisa, mas como percebemos um preço. Se estivemos uma manhã inteira em aflição com as nossas finanças pessoais, a questão do "valor" - de fazer um "bom negócio" - muito possivelmente controlará os nossos pensamentos, como consumidores, para o resto do dia, tornando os produtos mais baratos especialmente atraentes.
Acresce que, frequentemente, acreditamos que por termos conseguido encontrar um produto ou serviço que se encaixa dentro do nosso orçamento inicial, o problema está resolvido. Ora, não raras vezes, quando nos convencemos a aceitar uma qualidade menor por causa de apertos orçamentais, isso provoca uma despesa maior, para corrigir o que foi mal feito da primeira vez, ou para reparar ou substituir um produto muito antes do que deveria ser o prazo normal da sua vida útil.
Se o consumidor teve recentemente uma experiência com um produto que falhou - que "não prestava", que "não valia nada" -, esta questão da "qualidade" estará inevitavelmente presente, provavelmente orientando a decisão para gastar mais dinheiro. Em suma, a ligação entre qualidade e preço, na mente do consumidor ou na realidade do mercado, nunca é linear.
Para sermos claros: como organização de defesa do consumidor, consideramos inaceitável a ideia do senso comum de que aos preços mais baixos fatalmente corresponde uma perda admissível da qualidade, ou um grau de risco maior para os consumidores.
Desmontar esta visão conformista do preço pequeno-qualidade fraca deve ser uma batalha de todos nós que queremos Portugal livre de miserabilismo e resignação. E para ganhar esta batalha - nas companhias low cost, nas lojas em que a única marca visível é o preço dramaticamente reduzido, onde for - é preciso, todos nós, exigirmos maior controlo a quem de direito. É preciso reivindicar, no fundo, mais autoridade a quem tem autoridade - para combater o engano, a ilusão, a fraude. Porque a qualidade, de facto, não pode mesmo ter preço.
* DECO Proteste