A oeste tudo de novo. Em 1872, a América apaixonou-se por Yellowstone 

A 1 de março de 1872, o presidente norte-americano Ulysses S. Grant promulgou a criação do Parque Nacional de Yellowstone. No ano anterior, a expedição que percorreu aquele território do Oeste entregara aos olhos dos americanos as primeiras imagens do lugar. Os óleos e aguarelas de Thomas Moran seriam decisivos no reconhecimento da área como paisagem protegida.
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No dia 5 de maio de 2009, o então presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e o homólogo de Israel, Shimon Peres, encontraram-se na Sala Oval, na Casa Branca. A imagem do encontro captada por Peter Joseph Souza, na época fotógrafo oficial do 44.º presidente norte-americano, não omitiu da reunião a figura tutelar de George Washington, a assomar sobre a lareira no retrato que o homenageia. A pintura de 1846 deve créditos a Rembrandt Peale, artista norte-americano que, entre outros, fixou para a posteridade nas suas obras a óleo o presidente Thomas Jefferson.

A tela de um dos pais fundadores dos Estados Unidos não habita solitária as paredes da Sala Oval. Na fotografia de Pete Souza o tríptico de quadros completa-se com uma vista sobre a cidade de Washington, retratada a partir da margem esquerda do rio Potomac. A obra de 1883, nasceu das mãos do pintor George Cooke. A completar a simbólica mostra de pintura norte-americana, encontra-se a tela de 1895 que capta a Cordilheira Teton, dorso rochoso que irrompe no solo do estado do Wyoming. Dezasseis anos antes, em 1879, o pintor e gravador Thomas Moran, avistara aquela cadeia montanhosa à distância, para a captar em esboço.

O gigantismo dos espaços do Oeste Americano entregava a Thomas Moran, nascido em Inglaterra em 1837, a matéria-prima que procurava para as suas obras. A pintura a óleo The Three Tetons preenche os requisitos dos princípios que orientaram a Escola do Rio Hudson, movimento artístico sediado em Nova Iorque que, no século XIX, revelou particular apetência por excursões à América selvagem, num espírito exploratório e bucólico.

Em 2009, The Three Tetons assumia há vários anos o seu protagonismo na mostra de pintura da Sala Oval, acompanhando os mandatos de George H.W. Bush e Bill Clinton, prosseguindo com Barack Obama. Quanto à presença de Thomas Moran na coleção de arte permanente da Casa Branca, acervo com mais de 500 peças, completa-se com outras duas paisagens. Nenhuma delas com o estatuto do óleo sobre tela à guarda do museu do Departamento do Interior dos Estados Unidos, sediado em Washington. A pintura Grand Canyon of the Yellowstone talhou a imortalidade para o homem que admirava a arte aguarelista do pintor inglês Turner e, não raro, socorria-se do conselho de geólogos e botânicos para credibilizar os elementos reproduzidos nas suas telas. Antes de ser apresentada publicamente em 1872, e logo adquirida por 10 mil dólares pelo Governo Federal, a pintura do grande desfiladeiro de Yellowstone viveu nos olhos, na memória e nos esboços de Thomas Moran, fruto da expedição a que se juntara em 1871.

Antes de debruçar a vista sobre as paisagens da região de Yellowstone e de contribuir com a sua arte para criação do primeiro parque nacional dos Estados Unidos, a 1 de março de 1872, Moran construíra reputação nas páginas da revista literária Scriber's Monthly. Na publicação detida pelo magnata da ferrovia, Jay Cooke, dono da Northern Pacific Railway, Moran apresentava o seu trabalho como paisagista. Um retrato da América selvagem que, na época, captava a cobiça das histórias de fronteira em revistas como a Harper's Magazine, Atlantic Monthly e a já citada Scriber's Monthly.

Yellowstone, na região compreendida nos atuais estados do Wyoming, Montana e Idaho, não era território alheio às notícias que circulavam na costa leste dos Estados Unidos. Em 1806, a região fora pela primeira vez trilhada por um não nativo americano. John Colter, transviado do seu grupo, embrenhou-se nas montanhas e bosques de Yellowstone para regressar com a história de águas quentes que rompiam o solo, os gêiseres, então apelidados de "Inferno de Colter".

Em 1871, a Scriber's Monthly adquiriu o artigo assinado por Nathaniel Langford, explorador e empresário americano, recentemente chegado da região de Yellowstone onde participara numa expedição com fins científicos. As Maravilhas de Yellowstone buliam numa época em que aquele território distante configurava uma possibilidade, a de se tornar numa área protegida no primeiro parque nacional norte-americano. Ainda em 1871, o geólogo Ferdinand Hayden, a expensas do Governo, lançou uma expedição a Yellowstone. Empresa que se propunha cobrir uma região com mais de 800 mil hectares e a 800 quilómetros de distância da linha de comboio mais próxima (a Northern Pacific Railway). Thomas Moran, a par do fotógrafo da Guerra Civil Americana, William Henry Jackson, documentariam em imagem a região que até então chegara aos olhos da América à boleia de esboços toscos.

Por mais de 40 dias, uma equipa de perto de 50 homens percorreu a região de Yellowstone. Henry Jackson fotografava a custo num território hostil, com equipamento pesado. Thomas Moran garatujava com rapidez e captava em aguarela as cores do lugar. Matéria que, um ano volvido, em 1872, permitiria ao pintor expor em Nova Iorque uma tela com mais de dois metros de altura por 3,5 metros de largura. Políticos, empresários, imprensa e intelectuais assistiam à primeira mostra pública de Grand Canyon of the Yellowstone. Dois meses antes, a 1 de março, o presidente Ulysses S. Grant promulgou legislativamente a criação do Parque Nacional.

Thomas Moran retornaria por diversas vezes a Yellowstone nos 40 anos seguintes. Moran faleceu em 1926. A sua obra maior permaneceria por 75 anos em exibição no National Statuary Hall, no Capitólio. Em 1925, as arribas, coníferas, desfiladeiros e quedas de água de Yellowstone, eternizadas na delicadeza das cerdas dos pincéis de Moran conheciam a sua nova casa no Departamento do Interior dos Estados Unidos para, ocasionalmente, integrarem mostras temporárias noutras instituições.

De 1869 a 1871, um frenesim exploratório percorreu os penhascos e pradarias da região reconhecida a 1 de março de 1872 como parque nacional. A expedição de 1871 de Ferdinand Hayden seguia-se às de Cook-Folsom-Peterson, dois anos antes, e à de Washborn-Langford-Doane, no ano anterior, ambas nomeadas em referência ao nome dos seus promotores. A exploração de Hayden marcou a diferença, nos meios empregues e por ser a primeira financiada pelo Governo americano. A documentação produzida abriu caminho para que o Congresso autorizasse o estabelecimento do parque nacional.

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