A noite dos senadores dos anos 80

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Dois grandes nomes da pop dos anos 80 dominaram a segunda noite do Vilar de Mouros 2005, que voltou a registar uma fraca adesão de público e a deixar no ar a ideia de que não basta ser um "festival mítico", é preciso ter "cartaz", até porque as vacas não andam gordas e há mais festivais no horizonte.

O alinhamento dos concertos não terá sido também o mais feliz. Colocar os regressados Echo & The Bunnymen (que por aqui andaram em 82, em época de Crocodiles e Heaven Up Here) como banda-rastilho, ao final da tarde, poderá compreender-se se a ideia era atrair o público logo de início para compor o espaço mas, nem isso resultou, nem o grupo de Liverpool é um grupo de fretes. Além de que, em termos históricos e estéticos, faria mais sentido colocá-los antes de Peter Murphy, ou até depois.

Entre os dois colossos ficaram os Jesus Jones e a Blues Explosion. Os primeiros num registo pop dançável, com derivas tecno e a rambóia de samples. Agitaram as hostes, comunicaram com o público, deixaram alguns temas célebres, como Right Here, Right Now e Zeroes. Da Blues Explosion, a habitual mistura de psycho billy e Rolling Stones, a malha de guitarras, a pose tresloucada de Jon Spencer. A sua voz oscila entre espasmos e insinuações, mas por vezes parece estar a vender rifas, quando repete à exaustão "we are bluuues explosion!".

Quem não precisou de vender nada foram os Echo & The Bunnymen, que surgiram com o pôr-do- -sol. Lips Like Sugar a alertar o público, que saía das tendas e de banhos no rio. Ian MucCulloch de cigarro na boca, óculos escuros, uma pose de vagabundo. Nenhuma alusão à estada de 82. Apenas um tema de Siberia (o álbum que será lançado em Setembro). Muito pouca conversa e um concerto excelente, curto, que terminou de forma abrupta - em The Cutter, com problemas técnicos a levarem a banda a sair, sem qualquer saudação, aparentemente enfadada com o incidente. Foi a grande pop dos anos 80, melancólica e evasiva, com as guitarras a deixarem lastro numa atmosfera escura, aliviada por riffs e pela intensidade da bateria. O tom narcótico de McCulloch, sempre entorpecido, sempre distante, a atender aos pedidos do público por desfastio. Killing Moon, Rescue, Nothing Last Forever. E ainda um brinde, na versão gloomy de Walk On The Wild Side, de Lou Reed. Não terá o sido o regresso mais brilhante da vida deles, mas nós cá estaremos em qualquer outro.

E estaremos sempre para Peter Murphy que, mais uma vez, por coincidência ou não, veio encerrar uma digressão mundial no nosso País. O motivo a divulgação de Unshattered, o seu último álbum de originais. Falou-se muito mal de Unshattered. Que era mais do mesmo, que era uma pop pirosa com arranjos foleiros. E é verdade. O som que emoldura Murphy não é interressante. Mas, justamente, o som que emoldura Murphy não interessa nada. Pelo menos ao vivo. Os seus concertos são modelares e a voz dispensa qualquer apoio. Tudo se centra na expressividade mímica (devedora de Bowie) e na grandiloquência vocal. E, até ver, é quanto basta.

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