A mulher palhaça que se equilibra no desequilíbrio
Ela atira flores ao ar e elas agarram-se ao seu vestido e ao seu cabelo. Agarram-se à ponta das massas de malabarismo. Uma massa apoia-se noutra, e noutra. Estamos no circo. Isto é, estamos num dos ginásios do Chapitô, na Costa do Castelo, Lisboa, mas ela faz o circo ainda antes de subir, hoje, e nos dias que se seguem, à devida tenda.
Dulce Duca, mulher palhaço. Nasceu em Lisboa, em 1984, n"Um Belo Dia, dizemos, agarrando o nome do seu espetáculo, que integra o 9.º Ciclo de Mulheres Palhaço depois da artista espanhola Maité Esteban.
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Inicialmente autodidata, a vida malabar de Dulce começa no meio de amigos. A preferência pelo equilíbrio sempre existiu. Em criança, nada de mais. "Andar sobre objetos... E sempre tive uma certa facilidade de conseguir manter um objeto em equilíbrio. As coisas normais de quando vais jantar fora: umas colheres ou um menu... Mas nada que [depois] me lembrasse: ah, eu já fazia isto." Que cada um tire as suas conclusões. Certo é que, depois do período autodidata, a mulher palhaço ingressou na escola de artes circenses do Chapitô e depois, durante três anos, frequentou, em França, a Formação Autodidata Alternativa e Autogerida das Artes de Circo. "Éramos nós próprios, alunos, que conseguíamos o dinheiro da Europa e convidávamos os professores com quem queríamos trabalhar", explica.
Anda entre França e Espanha, mesmo sem uma tenda e uma companhia às costas. Em 2009, levou aquilo a primeira etapa de Um Belo Dia ao Brasil, onde deu aulas de malabarismo em favelas. Esse, que é o seu primeiro solo, e que agora traz a Portugal, nasceu quando se perguntou e simultaneamente respondeu: "Como é que eu quero expressar-me no palco? Quero descobrir-me em palco e dar às pessoas algo muito pessoal. Estava a chover, ficou bom tempo, e foi daí que surgiu o nome Um Belo Dia. "
Nesse "dia" a que assistimos em palco, "tudo é possível se tu crês que é possível", explica. É assim, "metafórico e onírico", que o espetáculo mostra uma espécie de paleta das "emoções humanas. Começaram por ser quatro básicas, o amor, a alegria, a tristeza e a raiva, e depois entre elas tens várias pequeninas, mistas... "
Ela, entre movimentos malabares, vai mantendo tudo em equilíbrio, como que suspenso, acompanhada (por vezes provocada) pela música de Jaime de el Blanco. E faz como que tudo pareça fácil. "Um equilíbrio nunca é um equilíbrio se não há um desequilíbrio. Este equilíbrio só existe porque estou em constante desequilíbrio. Se eu paro, cai [mostra e, quando para, as massas caem]. Para mim a vida é assim. Estamos sempre à procura de equilíbrio, mas ele não existe esse equilíbrio se não estivermos em constante movimento."
Se é para crianças? "Tenho momentos que são bastante dramáticos. Se for só para adultos há um silencio pesado, se há crianças no meio eles riem-se com a parte dramática." Claramente. Como para todos. Mas, como diz, este "não é um espetáculo infantil, de todo."