Traçada no planisfério uma linha reta com aproximadamente 6400 quilómetros de comprimento, com ponto de partida em Londres, o extremo oposto do prumo aproximar-se-á de Nova Deli, capital indiana. Uma distância equiparável ao alinhamento da rede de canais existente no Reino Unido em 1840. Sistema fluvial ao qual a década seguinte subtrairia importância, fruto do progresso do transporte de matérias-primas, produtos e pessoas através do caminho-de-ferro..Antes, por cerca de quatro décadas, com particular ímpeto entre os anos de 1790 e 1810, as Ilhas Britânicas viveram aquela que ficou conhecida como a "mania dos canais" promovida, num primeiro momento, por empreendedores particulares, mais tarde por grandes investidores. Empreendimentos que estimularam a especulação, monopólios, a concorrência desenfreada e chamaram aos projetos uma legião de engenheiros de diferentes ramos. Entre eles, esteve um jovem nascido em 1765 na costa leste dos Estados Unidos, na Pensilvânia. Na sua vida de 49 anos, Robert Fulton, engenheiro e inventor, angariou reconhecimento na sua terra natal, em Inglaterra e França, e viu-lhe creditados engenhos como o primeiro submarino apto ao exercício de operações militares e o primeiro barco a vapor a operar uma carreira comercial rentável a partir de Nova Iorque. Fulton não angariou apenas reconhecimento, também lhe somou dissabores, apelidado de charlatão por uma figura de peso na França da Primeira República, Napoleão Bonaparte..A década de 1890 encontra Robert Fulton embrenhado na euforia da abertura de canais que percorria a Grã-Bretanha. Em 1786, aos 21 anos, o promissor engenheiro, deixara o seu país natal rumo à Europa, continente onde viveria nas duas décadas seguintes. Em Inglaterra, Fulton começou por dedicar-se a uma das suas paixões, a pintura de retratos e o estudo das belas-artes que praticara com algum êxito nos Estados Unidos. Se nas telas o jovem Robert encontrava um meio de subsistência, nos projetos de engenharia enveredava pelo sonho de poder vir a redefinir algumas das práticas e meios de navegação na teia de canais britânica. Fulton desenvolveu projetos para a drenagem de estreitos, assim como um novo sistema de eclusas e de reboque de navios de pequeno porte. Em paralelo, o engenheiro rendia-se às maravilhas do vapor enquanto meio de propulsão de embarcações. Um desenvolvimento nas comunicações que não era novidade na velha Europa. Em 1776, o francês Claude de Jouffroy apresentara o seu Palmipède, barco a vapor munido de remos. Em terras do Tio Sam, o barco a vapor estreara-se em 1787..Com a ambição de desenvolver embarcações movidas a vapor, Robert Fulton atravessou o Canal da Mancha em 1797, rumo a Paris. Não foi, contudo, sobre as águas, antes abaixo do horizonte marinho que o engenheiro norte-americano praticou o projeto que desenvolvia desde 1793. Fulton idealizava um engenho submersível para uso militar, capaz de garantir autonomia de submersão até uma hora, a uma tripulação treinada para torpedear navios. Ao longo de três anos, até 1800, o engenheiro norte-americano viu a execução do seu projeto negada por um Diretório descrente na concretização da empresa, mesmo quando o engenheiro apresentou a proposta de não receber proveito da construção do submarino até este provar a sua competência no afundamento de embarcações. No dealbar da década de 1800, o projeto recebeu luz verde por parte do Ministério da Defesa francês..O Nautilus, assim apadrinhado o submersível de Robert, apresentava-se como uma estrutura de ferro e cobre com mais de seis metros de comprimento, propulsionado por mão humana, com recurso a uma hélice de parafuso movida a manivela. Uma quilha oca, revestida a ferro, servia como tanque de lastro, inundado e esvaziado como garantia de flutuabilidade. Ao Nautilus, não lhe faltava uma vela à superfície e um sistema rudimentar para garantir oxigénio à tripulação. Projeto que incluía uma cúpula de observação, comparável à torre de comando dos submarinos desenvolvidos posteriormente. O veículo prestava-se a carregar cargas de pólvora com 10 a 200 quilos de peso, no seio das "carcaças", antepassadas das minas navais atuais. A 1 de julho de 1800, o Nautilus conheceu as águas serenas do porto de Le Havre para nelas percorrer 110 metros frente a frugal audiência, numa corrida que se revelou dois minutos mais rápida do que a de um barco movido a remos. Dois dias após o ensaio, uma tribuna de académicos assistiu ao segundo momento do Nautilus. Com três tripulantes a bordo, o submarino desceu aos 7,5 metros de profundidade, num mergulho de duas horas, capaz de cobrir distâncias de 400 metros em sete minutos. Ao feito, Fulton juntou uma descoberta, a de que as bússolas funcionam sob as águas tal como à superfície..Face ao bom resultado do Nautilus, o comité técnico deu parecer favorável à construção de dois submersíveis, projeto ambicioso visto apontar para o equipamento de dois engenhos de 11 metros de comprimento com tripulações de oito homens. O projeto de Fulton não teria futuro na França de Napoleão Bonaparte. Este, em setembro de 1801, revelou interesse em visitar o porto que acolhera o Nautilus, entretanto desmantelado. Agastado com o ocorrido, o dirigente francês deu como findo o projeto de construir uma frota submarina, apontou a Fulton a palavra charlatanice e viu no submarino uma máquina suicida de tripulações. Na Inglaterra onde granjeara amizades, Robert Fulton acalentou esperança na concretização do seu Nautilus. Rumo a Londres, em 1804, o engenheiro norte-americano levava a promessa de apoio do primeiro-ministro William Pitt, um ensejo "afundado" um ano mais tarde nas águas do Atlântico. A vitória decisiva na Batalha de Trafalgar das forças britânicas face às frotas francesa e espanhola, esmoreceu o interesse na utilização para fins militares do engenho submarino..Em 1806, Fulton regressou ao seu país natal para encontrar o sucesso nas águas fluviais do estado de Nova Iorque. Apoiado pelo investimento de Robert Livingston, advogado e diplomata norte-americano, Fulton desenvolveu o primeiro barco a vapor comercialmente bem-sucedido no transporte de passageiros no Rio Hudson. Agosto de 1807, marcou a viagem inaugural do North River Steamboat, num percurso de ida e volta de 480 quilómetros de extensão entre as cidades de Nova Iorque e Albany. A marcha de 68 horas, a pedir paciência aos passageiros, significou o ato primeiro de uma rota que, em três décadas, povoou o rio com mais de uma centena de grandes barcos a vapor. Fulton, falecido em Nova Iorque em 1815, escrevera a propósito da sua conquista: "o poder de propulsão de barcos a vapor está agora totalmente comprovado"..Em 1920, mais de um século volvido sobre a aventura do Nautilus, o projeto do submarino que ocupou os sonhos de Robert Fulton, foi revelado no Reino Unido. O submersível teria 11 metros de comprimento e capacidade para transportar seis tripulantes. Recuando a 1798, a comissão encarregue pelo Diretório para avaliar a invenção de Fulton escrevera: "o navio submarino imaginado pelo cidadão Fulton é um terrível meio de destruição, porque funciona em silêncio". O mundo teria de aguardar perto de um século para operacionalizar o sonho do transporte submarino.