A Lei do Mercado encantou a Voz do Operário
Uma antestreia aberta ao povo. Ao povo trabalhador, mais concretamente. Aconteceu nesta quarta-feira à noite, no Salão de Festas da Voz do Operário, em Lisboa, e quase encheu as cerca de 400 cadeiras da mítica sala lisboeta. O filme, A Lei do Mercado, de Stephane Brizé, desde ontem nas salas comerciais, cai que nem ginjas no espírito do 1.º de Maio, Dia do Trabalhador.
Um estudo de realismo extremo sobre a agressão aos direitos dos trabalhadores na França dos nossos dias. Uma história sobre emprego e desemprego, sobre exploração e as barreiras éticas entre quem vigia o trabalho dos colegas. O filme foi galardoado em Cannes com o prémio de interpretação para Vincent Lindon, naquela que é já uma das melhores interpretações que vimos neste ano.
Na sessão de antestreia na Voz do Operário, coube ao sociólogo Carvalho da Silva apresentar a sessão. O ex-dirigente sindical salientou a evidente qualidade deste objeto cinematográfico e referiu a importância de assumirmos a retitude moral nas questões morais. Para ele, a obra de Brizé é tudo menos panfletária.
Em conversa com o DN, antes do começo do filme, mostrou-se muito entusiasmado: "Este filme obriga a uma reflexão quanto à questão do desemprego. As sociedades europeias, em particular a portuguesa, são de uma enorme permissividade e ligeireza quanto ao direito ao trabalho. No nosso caso, tem que ver com o facto de termos uma democracia recente e de uma série de constrangimentos que vivemos no passado, mostrando-se a incapacidade da resistência do coletivo. A Lei do Mercado demonstra também que grande parte da formação dos trabalhadores faz-se para a estatística."
Apesar de muito raramente esta belíssima sala ser usada para cinema, a qualidade de projeção do filme foi bastante razoável. Recorde-se que a Voz do Operário nos anos 1960 e 1970 chegou a passar cinema comercial regularmente, mantendo com o Cinema Royal um eixo de exibição na zona da Graça.
Vítor Agostinho, da Voz do Operário, estava visivelmente agradado com a resposta de um público (a entrada era livre mas vieram muitos convidados da CGTP, inclusive o seu líder, Arménio Carlos) de todas as idades: "Foi bonito. Foi passar de uma sala de cinema que exibia filmes do Cantinflas para um filme de intervenção! No final da sessão, foi muito positivo ouvirmos o Carvalho da Silva a falar sobre o filme. Faz-nos muito bem refletirmos sobre as questões do mercado de trabalho." Depois deste sucesso, Agostinho faz um apelo a outras distribuidoras de cinema para pensarem na Voz do Operário para mais iniciativas de cinema.
Para Luís Apolinário, da distribuidora do filme, a Alambique, foi uma noite com significado: "Se há filmes que verdadeiramente importem e digam algo às pessoas, este é um deles. Estreá-lo neste local tão caro à luta dos trabalhadores claro que tem uma simbologia forte."