A indústria da Paz

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"Profundamente convencidos que, pelos contactos directos, espontâneos e não mediatizados que permite entre homens e mulheres de culturas e modos de vida diferentes, o turismo representa uma força viva ao serviço da paz, bem como um factor de amizade e compreensão entre os povos do mundo"- In Código Mundial de Ética do Turismo, OMT, 1 de Outubro de 1999

Li algures algo aparentemente banal mas que me pôs a imaginação visual a trabalhar: turistas que dão apertos-de-mão aos que os recebem. Imaginem que cada um dos 1.500 milhões de turistas que em 2019 andaram a cirandar pelo mundo apertou a mão a 10 pessoas. Significa que, por causa dos turistas, foram dados nesse ano 15.000 milhões de apertos-de-mão. Quinze mil milhões de apertos-de mão gerados pelo Turismo!

O Turismo antes de ser uma actividade económica fundamental, é um fenómeno intrinsecamente humano, social, presume curiosidade, abertura a pessoas, culturas, meios ambientes, naturais ou construídos, diferentes dos que temos como nossos. E uma troca de experiências entre quem visita e quem é visitado. Numa velha definição, o Turismo é a visita do Homem ao Homem. Por isso o Turismo é uma força para o bem, comumente tido como "a indústria da Paz". Envolver uma mão na nossa quando se está de visita ao outro é mais do que um aperto-de-mão que fecha negócios (muito respeitável e vinculante, de resto). É mais do que um cumprimento. É um gesto de reconhecimento, de fraternidade, de agradecimento por nos receberem em sua casa, que passa a ser também a nossa. É um gesto de Paz.

Muitos são os motivos para viajar, muito mais ainda o que a viagem nos traz. E algo que só acontece se a tanto estamos disponíveis, como diz Flaubert: sentirmo-nos modestos pelo nosso pequeno lugar no Mundo.

Como é que isto é possível?! Entrei, entrámos, com grande entusiasmo em 2022. Íamos voltar a viajar! Nas minhas crónicas de janeiro (Cidades e Turismo: como crescer sem perder a identidade?) e fevereiro (Elevador, frigorifico e automóvel) ocupei-me das dores e desafios do crescimento sustentável do Turismo, já que, lá está, a vida ia voltar a ser normal (ou quase). As expectativas para 2022 eram muito positivas, para o Mundo e para Portugal. Controlo da pandemia; poupanças acumuladas por força da reclusão, a acompanhar a sede de viajar; todas as empresas que trabalham no, e para o, Turismo (transportes, alojamento, animação, cultura, restauração), em articulação com as autoridades turísticas públicas, a fazer um bom trabalho de casa para responder à procura... As estrelas alinhadas para que o segundo semestre de 2022 (em Portugal, aliás, já a iniciar-se na Pascoa) fosse o momento da retoma.

E de repente, a 24 de fevereiro, chega-nos outro cavaleiro do apocalipse: depois da praga, a guerra.

Já esgotámos todos os adjectivos para qualificar o horror que os Ucranianos estão a viver e o homem que o preparou e o está a executar. Estamos suspensos do que se vai passar, alertas e consternados, descrentes num futuro despreocupado. Porque a vida não vai voltar a ser normal, ou o normal não vai ser o que já foi.

Que impactos trará a indústria da Guerra sobre a indústria da Paz?

Mesmo que o Turismo em Portugal não sofra tanto, tão imediatamente e tão directamente, não há como escapar: o Turismo sufoca com a guerra.

"Que a Rainha da Paz preserve o mundo da loucura da guerra!"

CEO/AHP

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