A importância dos modelos digitais sofisticados para um Retalho mais eficiente

Publicado a
Atualizado a

O impacto do Digital no setor de retalho tem sido enorme, afetando sem margem de dúvida o ambiente competitivo. A facilidade com que surgem novos atores globais, ou se reconfiguram, e integram neste ecossistema digital coloca desafios que devem ser muito bem ponderados por todos. Identificar necessidades e implementar ações de melhoria face aos crescentes desafios da economia digital ganha relevância. Neste setor em constante evolução, urge adotar soluções digitais cada vez mais sofisticadas para a melhoria da eficiência da gestão.

É frequente dar-se o exemplo da Amazon: uma empresa que começou no retalho on-line de livros e, posteriormente, passou a transacionar on-line praticamente todo tipo de mercadorias (inclusivamente bens alimentares) e serviços. Um caso já com uma significativa presença no espaço do retalho físico e com a sua maior fonte de receita proveniente da área dos serviços cloud (AWS - Amazon Web Services).

Os retalhistas devem refletir sobre a forma como competem num mercado com estas características, onde atuam players, como a Amazon (seguramente um dos melhores exemplos de como tirar partido da aceleração digital), transversais a diversos setores, que proporcionam experiências extraordinariamente sofisticadas e têm condições para serem agressivas em termos de preço.

Neste contexto, o foco de grande parte dos retalhistas mundiais tem sido, e bem, dar resposta às exigências do consumidor digital. O que se constata, porém, é que continua a ser indispensável dar também atenção à Eficiência Operacional como forma de sobreviver num mercado global, onde as margens são cada vez mais reduzidas.

A evolução recente do conhecimento, dos processos e das tecnologias permite concluir, com otimismo, que ainda há margem para melhorias. Um dos exemplos que suportam esta tese é a área das Quebras de Stock do retalho. Segundo estudos recentes (HB Review), a quebra total dos retalhistas ainda se situa entre 1,5% e 2% do volume de vendas, sendo que importa reter que qualquer eficiência ganha neste indicador tem um reflexo direto na linha de resultados do retalhista.

De acordo com a Gartner (Hype Cycle for Retail Technologies, 2017), tecnologias como RFID e plataformas IoT em tempo real na loja podem dar um contributo na melhoria deste indicador. Observa-se também que, em consequência da utilização de modelos analíticos avançados, tem-se obtido resultados notáveis, nomeadamente na redução da componente da quebra conhecida do retalho alimentar. Dados da Accenture revelam que este tipo de quebra pode resultar: (com um peso de 40% a 50%) de uma Gestão Comercial ineficiente - gama de produtos desajustada e uma atividade promocional com ineficiências de planeamento e execução; (com um peso de 35% a 45%) de um modelo de reaprovisionamento de loja com ineficiências - modelo da cadeia de abastecimento desajustado e parâmetros para a colocação de ordens de compra e reabastecimento de loja ineficientes; e (com um peso de 5% a 15%) de uma gestão de espaço e manuseamento de mercadoria desadequados - regras e procedimentos ineficientes para ocupação de espaço, operações de entreposto deficientes e transporte e manuseamento de mercadoria desadequadas.

Identificando as causas e implementando ações de melhoria, o impacto nas vendas e nos custos é significativo: reduções de até 35% no valor das quebras de stock e melhorias de até 4% no valor das vendas (dados Accenture).

Mas é possível ir ainda mais longe. Na base desta ambição está o conceito de Demand Sensing, modelo sofisticado de previsão de procura que explora o potencial de tecnologias como Big Data e Inteligência Artificial. Com o Demand Sensing obtêm-se previsões de curto prazo mais precisas e proporciona-se uma cadeia de abastecimento mais eficiente: melhor disponibilidade de stock (melhor nível de serviço), melhor gestão de espaço e, justamente, valores de quebra mais reduzidos.

O Demand Sensing não substitui os modelos tradicionais de previsão e planeamento da procura, mas complementa-os. A sofisticação deste paradigma assenta sobretudo na utilização em tempo real de dados estruturados e não estruturados (Big Data) que permitem, através de algoritmos de machine learning (Inteligência Artificial), captar sinais com impacto imediato na procura. Por exemplo: dados como publicações nas redes sociais, dados sobre a economia, ou sobre a meteorologia podem afetar a procura imediata. A partir da captação destes sinais, o retalhista pode rever os parâmetros de reaprovisionamento de curto prazo e, assim, obter uma cadeia de abastecimento mais eficiente.

Com este patamar de sofisticação, o retalhista passa a dispor de uma cadeia de abastecimento muito mais preditiva do que reativa. Por outro lado, levará ao estabelecimento de uma forte colaboração entre todos os atores da cadeia de abastecimento o que, a par da adoção de tecnologias como Big Data e Inteligência Artificial, implicará que se repensem as arquiteturas e infraestruturas de IT, no sentido de dotar os sistemas com a escalabilidade e flexibilidade necessárias (por exemplo, através de infraestruturas cloud e da disponibilização de APIs para que os parceiros de negócio interajam facilmente com os sistemas do retalhista).

Dados recentes da Accenture demonstram o potencial aplicação do Demand Sensing: para reduzir o erro dos modelos tradicionais de previsão de procura entre 15% e 25%; para reduzir os dias de cobertura de stock em 5-6 dias; reduzir os níveis de stock de segurança entre 30% a 50%; e para manter os níveis de serviço entre 94% e 98%.

Previsões de procura mais precisas asseguram uma cadeia de abastecimento mais eficiente e, por conseguinte, valores de quebra de stock mais reduzidos. Confirma-se, portanto, que existe atualmente margem para implementar melhorias na eficiência operacional dos retalhistas.

Apesar de serem cada vez mais os desafios que os retalhistas têm de enfrentar, todos os contributos contam e, deste modo, a eficiência da Cadeia de Abastecimento deverá continuar a ser uma prioridade e um excelente fator para que os retalhistas se diferenciem no atual contexto competitivo digital / global.

Miguel Veloso é Senior Manager da Accenture Portugal responsável pela área de Retalho

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt