A importância do biometano para a sustentabilidade energética
Nesta data de 25 de Setembro, em que pela primeira vez oficialmente se celebra o Dia Nacional da Sustentabilidade, vale a pena olharmos com atenção para uma fonte de energia renovável que tem sido alvo de pouco destaque em Portugal mas que, nestes últimos tempos, tem dado sinais de uma renovada vitalidade; o biometano.
Como gás renovável simples de produzir a partir do biogás e composição muito semelhante à do gás natural, as unidades de produção de biometano têm vindo a aumentar a sua presença na Europa e, em Abril deste ano, totalizavam já 1.322, face a apenas 483 em 2018, de acordo com a EBA (European Biogas Association). Apenas neste mês de Setembro, foram anunciados dois grandes investimentos na área; um de 100M de libras no Reino Unido - em resultado de uma parceria entre o gigante farmacêutico AstraZeneca e a Future Biogas e que inclui o campus Macclesfield, a maior unidade de fabricação farmacêutica britânica - e outro na vizinha Espanha, onde a CycleØ inaugurou instalações para a produção de biometano no município catalão de Vallfogona de Balaguer, que ajudarão a reduzir a poluição e as emissões de nitratos através de tecnologia de remoção de amoníaco, transformando matéria orgânica em nitrato e sulfato de amónio sustentáveis para serem usados como fertilizantes.
Estes exemplos são apenas dois num cenário mais vasto, que se encontra também correlacionado obviamente com o prolongamento e as consequências da guerra na Ucrânia e o seu impacto no mercado da energia e no ambiente. Nesse sentido, ainda há poucos dias o "Wall Street Journal" destacava a forma como a Ucrânia quer transformar resíduos agrícolas em energia, para garantir o abastecimento e diversificar a sua economia num cenário de continuação da guerra iniciada pela Rússia. No início deste ano, a Ucrânia assinou uma parceria estratégica com a União Europeia para promover a produção e utilização de biometano sendo que, como salientou também o WSJ, até 2040 a energia gerada a partir dos resíduos agrícolas do país poderá fornecer um terço do consumo doméstico de gás antes da guerra, ao mesmo tempo que se tornará um importante fornecedor da UE, de acordo com a Associação de Bioenergia da Ucrânia.
Em Portugal não somos exceção no sentido da necessidade de investirmos e adotarmos um mix de fontes de energia, se quisermos efetivamente cumprir com as metas definidas no âmbito da REPowerEU, a estratégia que definiu o objetivo de a UE chegar aos 35 mil milhões de metros cúbicos por ano de produção de biometano, até 2030.
A nível nacional, é um facto salientado já por diversos especialistas e com base nas prioridades anunciadas por este Governo, que o designado "hidrogénio verde" tem capitalizado o discurso oficial e para aí têm sido canalizados os apoios mais significativos. Mas a evidência aponta para que o biometano seja uma opção mais eficaz para a nossa capacidade energética num cenário de curto prazo, recorrendo a uma tecnologia mais simples e acessível do que a do hidrogénio e dando um destino sustentável aos resíduos.
Como referiu recentemente a Air Liquide: "O biometano é uma estrela em ascensão com potencial para desempenhar um papel importante na descarbonização, tanto do transporte pesado como da indústria" Mais ainda, a produção de biometano e as suas utilizações incentivam ativamente o desenvolvimento de uma economia circular, proporcionando aos agricultores, fabricantes e entidades locais uma alternativa sustentável e financeiramente interessante para a eliminação dos seus resíduos. Para completar o ciclo, os resíduos que sobram do processo de tratamento retornam às terras como fertilizante.
Tendo em conta tudo o acima referido, considera a Associação Portuguesa de Produtores de Biocombustíveis (APPB) - no cumprimento da sua missão de apoiar todos os produtores de bioenergia em prol do ambiente - que esta é a altura indicada para se dar ao biometano um papel de maior destaque no cumprimento das metas de sustentabilidade definidas a nível europeu e nacional, bem como no reforço da nossa capacidade ao nível da produção de energia com fontes renováveis.
Os biocombustíveis, incluindo o biometano, constituem a atual e quase única fonte renovável nos processos térmicos por combustão, estando imediatamente disponíveis dado que a tecnologia necessária já existe e a sua utilização não obriga a novos investimentos nesse sentido, nem à dispendiosa substituição de equipamentos.
Mais ainda, o biometano é injetável diretamente nas redes de gás e é, já hoje, uma realidade na mobilidade, mesmo que em pequena escala. Se pretendemos aumentar essa mesma escala e verdadeiramente cumprir os objetivos de sustentabilidade ao nível das renováveis, tal terá de ser conseguido, em primeiro lugar, por recurso ao que já existe e é endógeno, valorizando os recursos de que já dispomos e que, não obrigando a investimentos demasiado vultuosos, nos permita também desenvolvermos a nossa capacidade industrial e darmos o estímulo de que ela tanto necessita à nossa Economia.
De tudo o acima exposto, esperamos assim que todo este racional ressoe junto dos decisores, nesta altura crucial para o cumprimento, ou não, das metas de sustentabilidade estabelecidas.
Jaime Braga é Secretário-Geral da Associação Portuguesa de Produtores de Biocombustíveis