"A ilusão fugaz de um Portugal pioneiro, uma pausa num país decadente"

A ideia de Sacadura Cabral e o génio inventivo e prático de Gago Coutinho tornaram-se um "refrigério" para um país em crise profunda. A "demanda" transformada em "viagem política" exaltou um "novo clarão de epopeia" que rapidamente se esgotou. Faz amanhã cem anos que teve inicio a aventura.
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"A partida está marcada para as 6 horas de hoje". O título no canto superior direito, na primeira página do Diário de Notícias, de 30 de março de 1922, ilustrado por duas fotografias - uma, retangular, do hidroavião e outra, circular, dos "aviadores" - fazia-se acompanhar de uma frase, do primeiro dos destinos: "efetuado o voo e decorrendo bem a viagem o aparelho terá atingido 710 milhas além Las Palmas, entre as 5 e as 6 horas da tarde".

O boletim meteorológico anunciava "tempo nublado, vento fraco de NW" e a notícia, cautelosa - "Se o tempo o permitir, os srs. capitão-tenente Sacadura Cabral e capitão-de mar-e-guerra Gago Coutinho iniciam o seu raid de Lisboa ao Rio de Janeiro"- , que dava conta dos preparativos, alertava que os aviadores estavam "perfeitamente cônscios da gravidade e da dificuldade da empresa a que se propõem".

81 dias depois, a 18 de junho, uma dia depois da viagem completada, toda a primeira página é preenchida com os dois "heróis", o mapa da travessia, o escudo e duas datas: 1500 no canto superior esquerdo, 1992 no canto inferior direito. E há apenas uma única frase: "De novo o heroísmo português abriu na história do Mundo uma página gloriosa. Viva Portugal!".

O regresso a Lisboa, a 20 de outubro, que volta a ocupar toda a primeira página - ilustrada com os dois "grandes descendentes dos descobridores", o avião em voo, a Torre de Belém - é um elogio à "tradição de Portugal como potência atlântica e civilizadora" e à travessia que "restituiu à nossa raça o sentido da sua expansão histórica: exaltou, num novo clarão de epopeia, as qualidades de vitalidade da Pátria (...) O génio português traça de novo, em luz e glória, a palavra - Imortalidade!"

"Não é um simples feito individual, embora o pareça. É uma empresa colectiva, é uma obra nacional (...) velhos dominadores do mar, ficaremos sendo também incontestados acassaladores do espaço", escreve o "glorioso tribuno" António Cândido, antigo Procurador-Geral da Coroa que foi deputado do Partido Progressista, presidente da Academia Real das Ciências e um dos do grupo dos "Vencidos da Vida" como Eça de Queiróz e Guerra Junqueiro, que semanas antes tinha tido homenagem promovida pelo Diário de Notícias.

"É a ilusão fugaz de um Portugal pioneiro, uma pausa num país decadente, é um refrigério", defende António Ventura, professor catedrático do Departamento de História da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e Académico de Número da Academia Portuguesa da História.

"É uma viagem política, de afirmação nacional interna e externamente. A Primeira República está na rampa descendente, a participação na guerra, na Primeira Guerra Mundial foi terrível, as consequências económicas e sociais e políticas foram catastróficas. Numa altura de decadência, numa altura de grande perturbação interna, de instabilidade política, de perturbação social, e de uma certa frustração decorrente da própria participação na guerra sem grandes ganhos ou sem ganhos nenhuns praticamente. Isto foi uma espécie de momento de pausa, em que há uma unidade nacional em torno dos heróis que fizeram esta viagem", explica.

"Este contexto mais amplo", argumenta, explica o investimento do Estado português na travessia aérea - três aviões, quatro navios , centenas de militares e o envolvimento ainda que em escala reduzida do Brasil - que "não foi fruto de uma aventura, as coisas estavam mais ou menos preparadas. Há um investimento em termos de prestígio nacional. E foi também uma forma de afirmação da própria marinha, embora através do ar, o que não deixa de ser curioso. É uma forma de compensação da fraqueza no mar."

"Tudo isto é aparente, mas é um momento em que as pessoas terão esquecido as dificuldades que tinham. Parece que Portugal voltava a ser grande, sem ser grande coisa nenhuma. É o Partido Republicano Português (PRP) , dito democrático, que está no poder, é uma forma de afirmação do próprio partido", esclarece António Ventura.

Ou seja, como refere o comandante Batista Valentim, do Museu da Marinha,"o governo português não regateou esforços. O Comandante Azevedo Coutinho, Ministro da Marinha, muito próximo de Afonso Costa e António Maria da Silva, desdobrou-se na disponibilização dos recursos possíveis, desde o primeiro momento".

Se a conjuntura é determinante, também o são os protagonistas que nos bastidores investiram na "demanda" da travessia.

E nessa altura, lembra o historiador, "Victor Hugo de Azevedo Coutinho [antes tinham estado Vítor Macedo Pinto e Paes Gomes] é um político, um homem do poder nessa altura liderado por António Maria da Silva. O Partido Republicano Português estava a atravessar alguns problemas, tinha voltado ao poder que tinha estado com Cunhal Leal, um anti-PRP. Aliás, são eles próprios que promovem as festividades, eles beneficiam e aproveitam desse desse prestígio. É um insuflar de oxigénio que se vê na própria iconografia da época: o Pedro Álvares Cabral, a comparação com Gago Coutinho e Sacadura Cabral, a redescoberta do Brasil, tudo anda à volta de uma projeção".

Daí que sejam "impressionantes as manifestações de apoio, os postais ilustrados que se publicaram a glorificar os aviadores. É uma coisa extraordinária, nos jornais, livros, por todo o lado, é um momento de grandiosidade que não existia. Parece que tínhamos voltado à época dos Descobrimentos, só que agora descobrimentos aéreos".

"E esta viagem tem um significado muito especial, até porque temos a visita do António José de Almeida, é o primeiro Chefe de Estado português que visita o Brasil. Convém não esquecer que o D. Carlos esteve para ir ao Brasil, houve uma visita programada, anos antes, que não se concretizou.

O Brasil era muio importante em termos económicos para Portugal, especialmente por causa dos emigrantes, as relações que havia. Há aqui, portanto, vários fatores que se juntaram. É também curioso vermos que no próprio Brasil se fizeram publicações várias sobre a viagem, essencialmente dinamizadas pela nossa comunidade lá", sublinha.

Apesar de toda a pompa e "recuperação histórica, a viagem esgotou-se nela própria. Vantagens? Nenhumas, isto esgotou-se muito rapidamente. Poderia ter outros frutos, económicos, por exemplo, não nem isso teve".

O que surge é "um prolongamento, digamos assim, da afirmação noutras viagens até muito mais importantes, como é a viagem para Macau em 1924. Ligar Portugal ao Brasil é uma coisa, mas ligar Portugal a Macau (16.380 quilómetros percorridos em 115 horas e 45 minutos), ao império é outra. Mas pouco se fala do Brito Pais e do Sarmento de Beires, pouco gente os conhecerá, a não ser pessoal da marinha ou da aviação".

O que fica? "Uma viagem, mas as pessoas da travessia aérea para o Brasil têm a ideia de que foi uma viagem sem etapas, sem apoios, sem incidentes, o que se projeta é isso: o heroísmo, a aventura", diz António Ventura.

Não é por acaso que "o governo tenta conotar-se com a travessia para aproveitar a onda entusiástica que lhe traz um estado de graça gratuito e decreta que o F-400 se passe a chamar Lusitânia", constata o capitão-de-fragata Baptista Cabral.

O objetivo de tanto apoio, acrescenta, seria "apagar a má memória da "Noite Sangrenta", a revolta militar que na noite de 19 para 20 de outubro de 1921 "percorre Lisboa em busca de diversas figuras do regime republicano, que, forçadas a entrar no veículo, são posteriormente executadas (...) são assassinados, entre outros [ foram 22 os homicídios], o Primeiro-Ministro, António Granjo, e dois protagonistas da Revolução de 5 de Outubro de 1910, Machado Santos e Carlos da Maia".

O que existia de comum talvez fosse suficiente para ultrapassar as diferenças. A maior delas era a velocidade que obrigava a cálculos mais rápidos e precisos. O outra era o "abatimento", o desvio na rota provocado pelos ventos, que em pleno oceano não há terra que permite reacertar o caminho. E havia uma terceira: sem horizonte como no mar, a navegação astronómica - o uso do normal sextante - que determinaria a posição "real" do avião, e até a sua altitude, precisava de uma adaptação.

A invenção do "corretor de rumos", que calculava o desvio provocado pelos ventos, permitiu saber para onde se deveria apontar o avião de forma a seguir na rota correta e a criação do sextante com horizonte artificial [foi acrescentado um pequeno "frasco" com uma bolha de ar] que permitia observar a altura dos astros, quando não era possível ver a linha do horizonte, foram decisivos para o sucesso da travessia.

Foi a primeira vez que numa travessia aérea oceânica foi possível saber a cada momento a posição do avião. A navegação aérea científica nasce com Gago Coutinho e Sacadura Cabral que se tinham conhecido em 1907 quando traçavam os limites de fronteira entre Moçambique e a Rodésia.

"Tinham uma larga experiência em astronomia obtida nas campanhas geodésicas em África, o que tornou óbvia a sua opção de tentar adaptar a navegação astronómica marítima à navegação aérea", refere Baptista Cabral na investigação "Das origens à perda de Sacadura Cabral".

"Eram meticulosos", destaca o comandante Batista Valentim, "característica que bem desenvolveram a bordo e em terra como observadores geodésicos".

O que foram antes, considera, é razão do sucesso e da inovação tecnológica criada para a travessia. "Gago Coutinho, mais do Sacadura Cabral, de quem era mais velho 12 anos, viveu na transição da vela para o vapor. Coutinho viajou muito e em diversos navios à vela. Entre os anos 1888 e 1889 esteve quase por inteiro embarcado. Numa época dominada, também, pelas viagens terrestres de exploração em África, de Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens, prestou serviço nas corvetas Afonso de Albuquerque, Mindelo, Duque da Terceira, Rainha de Portugal, nas canhoneiras Zaire, Zambeze, Douro Limpopo e Liberal, todos navios mistos, à vela e a vapor, mas igualmente só à vela no transpor Pero de Alenquer, e na lancha-canhoneira Loge, que comandou no Rio Chiloango. Só à vela navegou mais de 23 milhas, num total de 314 dias, no Atlântico e no Índico. Os cerca de dez anos que passou a navegar nos oceanos, são fundamentais para se entender o percurso de Gago Coutinho como geógrafo de campo, estudioso da astronomia, navegador aéreo e investigador dos Descobrimentos, sendo um dos estudiosos que reproduz de forma prática, como os navegadores dos séculos XV e XVI navegavam, ao efetuar a bordo experiências com instrumentos náuticos, nos anos quarenta e cinquenta do Século XX".

O teste decisivo - que outros houve ao largo de Lisboa antes da grande travessia -, que permitiu verificar da fiabilidade nos novos instrumentos foi realizado a 22 de março de 1921, o voo Lisboa- Funchal.

Entre maio e julho o Atlântico é sobrevoado por quatro vezes. Como refere o capitão-de-fragataBaptista Cabral na investigação "Das origens à perda de Sacadura Cabral", "a primeira tentativa vai ser protagonizada por Hawker e Grieve em 18 de maio, mas uma falha de motor vai obrigá-los a amarar em pleno Atlântico. Em 27 de maio é finalmente concretizada a primeira travessia aérea do Atlântico quando o NC-4 de Albert Read, um dos três NC que partiram de Rockaway, alcança Lisboa. Duas semanas depois, Alcock e Brown fazem um voo direto da Terra Nova para a Irlanda e vencem o desafio do Daily Mail. A RAF perde o Felixstowe Fury num acidente, mas consegue concretizar entre 2 e 13 de julho o primeiro voo transatlântico no sentido Leste-Oeste (e regresso) com o seu dirigível R34. Estas travessias vieram demonstrar que efetivamente as aeronaves tinham capacidade para atravessar o Atlântico, mas demonstraram também que não tinham condições de segurança para o fazer. Das seis aeronaves que tentaram a travessia, apenas três o conseguiram. Os motores não eram ainda suficientemente fiáveis e não existia um método de navegação aérea eficaz".

Sacadura Cabral, que um ano antes tinha sido nomeado Diretor dos Serviços de Aeronáutica Naval, insistia na utilização da "Aviação Marítima no desenvolvimento da aviação comercial". Chegou, nessa altura, a escrever um carta para o Diário de Notícias defendendo a "posição geoestratégica que Portugal e as suas Ilhas Atlânticas ocupam relativamente à navegação aérea comercial transatlântica, assim como do potencial económico resultante da sua exploração" e a dizer em entrevista ao Século que Lisboa podia ser "porto aéreo europeu das duas Américas".

Os frutos da insistência, a que não são estranhas as pretensões inglesas, e mais tarde norte-americanas, de instalar nos Açores "pistas de aterragem, locais de amaragem e estações radiogoniométricas de apoio à navegação aérea", surgem quando o "chefe da Comissão de Aeronáutica, o Coronel Norton de Matos" aconselha a "rápida edificação de um programa de desenvolvimento da aviação comercial nacional que incluísse uma rede de aeródromos para se estabelecer ligações aéreas entre o Continente, Ilhas e Colónias, assim como para efetuar "(...) experiências de correios aéreos que, por via Madeira e Cabo Verde, nos liguem com o Brazil e que, via Açores nos liguem com os Estados Unidos".

O parecer para o que "Estado reduzisse o investimento na aviação militar em detrimento da aviação comercial e criasse prémios pecuniários para os primeiros aviadores portugueses que realizassem as viagens aéreas de ligação com as ilhas atlânticas ou com as colónias" ganha forma de lei quando a 10 de maio é promulgado o "Decreto nº5787-MMM, que cativava uma verba de 200 contos do fundo gerado pelo Decreto nº5300, para "(...) auxiliar a tentativa de travessia aérea entre Lisboa e o Rio de Janeiro" e atribui um prémio de 20 contos ao primeiro aviador português ou brasileiro que efetuasse este voo em menos de uma semana".

16 dias depois, Sacadura Cabral "submete um requerimento ao Ministro da Marinha para autorizá-lo a tentar a travessia. Em 6 de junho é exonerado da Direção dos Serviços de Aeronáutica Naval e nomeado para nos termos do arto 3º do dec 5787-MMM (...) para organizar a tentativa da travessia aérea entre Lisboa e o Rio de Janeiro em 168 horas".

O projeto, o raid Lisboa-Rio de Janeiro, é tornado público a 4 de junho de 1919 no jornal o Século e ganha dimensão mediática a partir da altura em que Augusto de Castro assume a direção do Diário de Notícias. A partir daí são diárias as notícias e a entrada de "mais patrocinadores e apoiantes".

Sacadura Cabral no "Relatório da viagem aérea Lisboa- Rio de Janeiro" situa o momento político da decisão. "Pouco depois da travessia aérea do Atlântico Norte, realizada em 1919 pelos norte-americanos, teve Lisboa a honra de receber a visita de S. Ex.º o Dr. Epitacio Pessoa, presidente eleito da República dos E.U. do Brasil. Partidário de uma aproximação íntima das duas nações irmãs, e desejoso, não só de contribuir, no pouco que em minhas forças cabia, para essa aproximação, como de manifestar o prazer que sentia por ver Portugal honrado por tão excelsa visita, apresentei a S. Ex.ª o Dr. Victor Macedo Pinto, que nessa época geria a pasta da Marinha, a ideia de que fosse tentada a travessia aérea Lisboa-Rio com a colaboração do Governo Brasileiro. O meu projecto era interessar nessa viagem as duas aviações irmãs, conseguir um mínimo de 2 aviões, cada um dos quais seria tripulado por portugueses e brasileiros, e tentar a travessia com a colaboração das duas Marinhas de Guerra, brasileira e portuguesa (...) Este meu projecto foi recebido com a maior simpatia pelo Governo Português, o qual, além de me designar para estudar a viagem, imediatamente publicou um decreto autorizando os créditos, então julgados necessários, para a efectivar e instituindo um prémio um prémio para a travessia, prémio que só poderia ser conferido a portugueses ou brasileiros".

Desfeitas as dúvidas iniciais - avião ou hidroavião -, Sacadura Cabral tem uma certeza: o motor terá que ser um Rolls Royce Eagle como provas dadas noutros raids. E em junho de 1921 pede ao ministro da Marinha a verba prevista do decreto nº5787-MMM apresentando o plano da viagem e a data: 1922 para coincidir com as comemorações do centenário da independência do Brasil. Em janeiro desse ano, e já com o primeiro avião a caminho de Portugal, obtém de então ministro da Marinha Victor Hugo de Azevedo Coutinho a vontade e empenho de realizar a travessia. A 25 de março, após a adaptação do hidroavião F-400 - um dos três lugares seria para acomodar material e os flutuadores adaptados para transportar combustível -, Sacadura Cabral confirma : a tentativa vai acontecer, mas "só tinha 50% de probabilidades de sucesso". Quatro dias depois já a Câmara dos deputados proponha um voto de louvor aos aviadores.

"Às 6h. 45m. Aperto a mão a alguns dos visitantes cujo numero já excedia uma centena (...) embarco e dou ordem para arriar o hidro (...) O hidroavião entra na agua. Um pouco mais de gaz e ele ahi vae hidroplanando até à entrada da doca do Bom sucesso (...) Ás 7h. Meto face ao vento e a toda a força do motor. "Alea jacta est". O motor gira a 1800 rotações (...) apoz 15 segundos de corrida, descola sem dificuldade (...) meto proa ao Bugio sobre o qual passamos às 7h.5m. Estava iniciada a travessia aerea Lisboa- Rio".

A descrição do Capitão de fragata Arthur de Sacadura Cabral que percorre parte das páginas 16 e 17, é em tudo semelhante às 46 do relatório da viagem que escreveu e que o tempo amarelou. Todos os detalhes são assinalados: as várias tentativas falhadas de levantar voo, as horas de deriva aguardando por resgate, as avarias, até a ideia - que por duas vezes é pensada - de desistir da viagem aérea.

Os primeiros problemas surgiram na chegada a Las Palmas, de onde só sairão a 5 de abril: partiram-se dois dos cabos que ligavam as asas aos flutuadores que também começaram a meter água. Foram precisas quatro tentativas para descolar.

A caminho de S. Vicente, Cabo Verde, a "agulha de governo" soltou-se. Na praia da Matióta mais problemas: flutuadores inundados e a perceção de que estavam a gastar gasolina a mais que iria impedir a viagem até Fernando Noronha. Solução? Desistir ou tentar fazer escala nos Penedos de S. Pedro e S. Paulo. Três tentativas falhadas de levantar voo a 14 de abril e mais duas no dia 18. Só a sexta vez, ganham rumo.

"Confesso que, para mim, foi este o voo o bocado mais amargo da viagem (...) durante nove horas e meia vivi sempre na incerteza", escreve Sacadura Cabral.

E aqui, ao largo dos Penedos de S. Pedro e S. Paulo, no final da tarde, perdem o primeiro hidroavião. Flutuador de bombordo partido, proa metida na água, o Lusitânia "está perdido".

Em Fernando de Noronha, para onde foram levados pelo "Republica", aguardam pelo segundo "Fairey" trazido pelo vapor "Bagé".

A 11 de maio, à terceira tentativa, conseguem retomar a viagem. Mas o "motor fraqueja por completo". Ficam à deriva das 15.30 até "às 00h. 35m.", altura em que são resgatados pelo cargueiro "Paris City".

De Lisboa, há de vir o terceiro e último hidroavião, batizado mais tarde de "Santa Cruz", que chegará a 2 de junho. Após os preparativos e testes iniciam as últimas escalas: Fernando Noronha - Recife (5 de junho), Recife - Bahia (8 de junho), Bahia - Porto Seguro (13 de junho), Porto Seguro-Victoria (15 de junho) e finalmente Victoria - Rio de Janeiro "frente à ilha das enxadas (...) ás14h. 32m."

Foram precisos 80 dias para conseguir uma travessia aérea de "4376 milhas em 60 horas e 8 minutos a uma velocidade media de 72,5 milhas ou 133 quilometros à hora" .

"Salvamos à terra içando a bandeira brasileira e dando 21 tiros com a pistola de sinaes!! Estava completada a travessia aerea Lisboa- Rio de Janeiro!!!", escreveu Sacadura Cabral.

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