As razões pelas quais o Governo e o Presidente da República (PR) não reconduziram Vítor Caldeira como presidente do Tribunal de Contas são claras: António Costa não entendeu que ele devesse ser reconduzido e Marcelo Rebelo de Sousa concordou. A decisão de cada um é completamente legítima, tão legítima como seria a contrária..Como qualquer ato político, enquadrado pela lei, quem o executa acha que está a fazer o melhor pelo bem comum. Ou seja, Costa e Rebelo de Sousa estão convencidos de que será melhor para a comunidade que Vítor Caldeira deixe de ser presidente do Tribunal de Contas..Eis um chorrilho de lugares-comuns. Melhor, é provável que já não sejam. Nos tempos que correm, parece que se perdeu a noção da mais básica confiança no outro, passou-se a julgar que quem não pensa exatamente como nós não pode ser honesto, decente ou bem-intencionado..É normalíssimo ler e ouvir políticos, colunistas e, ainda mais, gente sem voz no espaço público a contestar as opiniões ou as decisões políticas não como meras opções, mas como atos malévolos que têm como objetivo não o melhor para o bem comum, mas um qualquer egoísmo pessoal ou de um pequeno grupo. Isto, na melhor das hipóteses, o "anda tudo a gamar"..O normal e saudável seria partir do princípio de que quem pensa de forma diferente não o está a fazer por maldade, mas apenas porque não tem a nossa opinião. Não é assim que, atualmente, as coisas funcionam. Os do outro lado são simplesmente uns pulhas que só querem o poder para proveito próprio..A desconfiança está de tal modo disseminada que não foram poucos os que assumiram sem rebuço que o que tinha pautado a decisão do Governo e do Presidente da República era o desejo de o PS tudo controlar e que Vítor Caldeira seria um empecilho a esse desejo. Não se percebe bem como é que Marcelo Rebelo de Sousa encaixa nesta história, mas a teoria conspirativa deve andar entre a traição e outra patetice semelhante..A prova provada de que os nossos mais importantes políticos sucumbiram ao clima tóxico é a forma como justificaram uma decisão política que deviam ter assumido sem rebuço: com subterfúgios e falta de coragem..O argumento de que o PR e o primeiro-ministro (PM) definiram um critério de não renovação dos mandatos para funções de natureza judiciária não passa de uma desculpa para tomar decisões que pressentiram não ser populares e em que a boa-fé de ambos ia ser questionada..Não consta que as definições de critérios entre um PR e de um PM sejam leis. Numa democracia, a lei não é o único limitador do poder, mas é a medida desse mesmo poder..Disse António Costa que as instituições não podiam depender das pessoas que estão circunstancialmente ao seu serviço. Não posso concordar mais. Mas o que o PM e o PR estão a fazer quando alegam que definiram prazos para cargos de natureza judiciária é a mesma coisa: criam regras fora do enquadramento institucional e, já agora, constitucional. Ou seja, contribuem para o enfraquecimento das instituições que hoje lideram..Como diria o primeiro-ministro, o Governo e a Presidência da República continuarão depois de António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa. Sem dúvida. As instituições permanecem e as leis também. Os entendimentos entre Marcelo e Costa não são leis, nem têm dimensão institucional, nem estão, no caso do presidente do Tribunal de Contas, em linha com tradição política. Não há cá entendimentos, há leis que dão poderes para tomar decisões, há que as assumir..Não vejo mal no presente sistema. Segundo ele, é o representante dos portugueses, eleito diretamente pelo povo, que aprova ou não a renovação ou a indigitação sob proposta do Governo, que, por definição, é quem tem a confiança maioritária dos portugueses..Cargos que nunca foram alvo de luta política estão agora mais politizados do que nunca. A renovação ou a saída de um procurador-geral da República ou de presidente do Tribunal de Contas nunca mais será como dantes - ninguém se lembra de haver estas guerras noutras alturas. Uma lei, e não uma "definição de critérios", que determine o mandato único não será a solução ideal, mas é pragmática..No fundo, esta questão será até simples de resolver. O que está cada vez mais difícil de solucionar, e não vejo luz no fundo do túnel, é o clima de desconfiança, de ódio ao adversário, a incapacidade de olhar para o outro como apenas alguém que pensa diferente de nós, mas que tem os mesmos objetivos. E isto não há lei que resolva.
As razões pelas quais o Governo e o Presidente da República (PR) não reconduziram Vítor Caldeira como presidente do Tribunal de Contas são claras: António Costa não entendeu que ele devesse ser reconduzido e Marcelo Rebelo de Sousa concordou. A decisão de cada um é completamente legítima, tão legítima como seria a contrária..Como qualquer ato político, enquadrado pela lei, quem o executa acha que está a fazer o melhor pelo bem comum. Ou seja, Costa e Rebelo de Sousa estão convencidos de que será melhor para a comunidade que Vítor Caldeira deixe de ser presidente do Tribunal de Contas..Eis um chorrilho de lugares-comuns. Melhor, é provável que já não sejam. Nos tempos que correm, parece que se perdeu a noção da mais básica confiança no outro, passou-se a julgar que quem não pensa exatamente como nós não pode ser honesto, decente ou bem-intencionado..É normalíssimo ler e ouvir políticos, colunistas e, ainda mais, gente sem voz no espaço público a contestar as opiniões ou as decisões políticas não como meras opções, mas como atos malévolos que têm como objetivo não o melhor para o bem comum, mas um qualquer egoísmo pessoal ou de um pequeno grupo. Isto, na melhor das hipóteses, o "anda tudo a gamar"..O normal e saudável seria partir do princípio de que quem pensa de forma diferente não o está a fazer por maldade, mas apenas porque não tem a nossa opinião. Não é assim que, atualmente, as coisas funcionam. Os do outro lado são simplesmente uns pulhas que só querem o poder para proveito próprio..A desconfiança está de tal modo disseminada que não foram poucos os que assumiram sem rebuço que o que tinha pautado a decisão do Governo e do Presidente da República era o desejo de o PS tudo controlar e que Vítor Caldeira seria um empecilho a esse desejo. Não se percebe bem como é que Marcelo Rebelo de Sousa encaixa nesta história, mas a teoria conspirativa deve andar entre a traição e outra patetice semelhante..A prova provada de que os nossos mais importantes políticos sucumbiram ao clima tóxico é a forma como justificaram uma decisão política que deviam ter assumido sem rebuço: com subterfúgios e falta de coragem..O argumento de que o PR e o primeiro-ministro (PM) definiram um critério de não renovação dos mandatos para funções de natureza judiciária não passa de uma desculpa para tomar decisões que pressentiram não ser populares e em que a boa-fé de ambos ia ser questionada..Não consta que as definições de critérios entre um PR e de um PM sejam leis. Numa democracia, a lei não é o único limitador do poder, mas é a medida desse mesmo poder..Disse António Costa que as instituições não podiam depender das pessoas que estão circunstancialmente ao seu serviço. Não posso concordar mais. Mas o que o PM e o PR estão a fazer quando alegam que definiram prazos para cargos de natureza judiciária é a mesma coisa: criam regras fora do enquadramento institucional e, já agora, constitucional. Ou seja, contribuem para o enfraquecimento das instituições que hoje lideram..Como diria o primeiro-ministro, o Governo e a Presidência da República continuarão depois de António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa. Sem dúvida. As instituições permanecem e as leis também. Os entendimentos entre Marcelo e Costa não são leis, nem têm dimensão institucional, nem estão, no caso do presidente do Tribunal de Contas, em linha com tradição política. Não há cá entendimentos, há leis que dão poderes para tomar decisões, há que as assumir..Não vejo mal no presente sistema. Segundo ele, é o representante dos portugueses, eleito diretamente pelo povo, que aprova ou não a renovação ou a indigitação sob proposta do Governo, que, por definição, é quem tem a confiança maioritária dos portugueses..Cargos que nunca foram alvo de luta política estão agora mais politizados do que nunca. A renovação ou a saída de um procurador-geral da República ou de presidente do Tribunal de Contas nunca mais será como dantes - ninguém se lembra de haver estas guerras noutras alturas. Uma lei, e não uma "definição de critérios", que determine o mandato único não será a solução ideal, mas é pragmática..No fundo, esta questão será até simples de resolver. O que está cada vez mais difícil de solucionar, e não vejo luz no fundo do túnel, é o clima de desconfiança, de ódio ao adversário, a incapacidade de olhar para o outro como apenas alguém que pensa diferente de nós, mas que tem os mesmos objetivos. E isto não há lei que resolva.