A estrela que não o chegou a ser volta a enfrentar o passado
Pedro Miguel Marques da Costa Filipe, Pepa para o futebol e para os amigos, tinha tudo para ser uma estrela do Benfica. A 23 de janeiro de 1999 foi lançado por Graeme Souness, para o lugar de Nuno Gomes, aos 89 minutos, frente ao Rio Ave. Tinha 18 anos e estreava-se na equipa principal.
Mal entrou em campo, e na primeira vez que tocou na bola, marcou um golo, selando o triunfo das águias (3-1). "Foi um passe do João Pinto. Se tivesse apanhado um fiscal de linha que tivesse dormido pouco se calhar tinha assinalado fora-de-jogo. Recebi de pé direito, ajeitei com o esquerdo e depois rematei de bico, à Romário", recordou o agora treinador do Tondela, numa das entrevistas que deu após deixar os relvados.
No dia a seguir à estreia, as manchetes denunciavam: "Nasceu uma estrela!" Mas a vida tinha outros planos para Pepa, que deixou a Luz pouco depois e sem nunca se afirmar. Primeiro, foi vítima da síndrome do "novo Pantera Negra (Eusébio)", que assombrou também Akwá, Mawete Júnior, Toy ou Mantorras. Depois, perdeu-se numa vida boémia e as lesões também não ajudaram. Foi operado quatro vezes e colocou um ponto final na carreira aos 26 anos, depois de jogar em cinco clubes em nove épocas e ter marcado apenas 16 golos.
O próprio contou o que correu mal, numa palestra para estudantes em Oliveira do Hospital, em março passado. "Tive um ano e meio em que pensava que era o rei da noite, só queria boîtes e mulheres e fiz muita porcaria", revelou Pepa, assumindo que na altura estava "doente da cabeça".
Mas nem sempre foi assim. José Soares, por exemplo, lembra-se bem quando ele chegou com 14 anos ao centro de estágio da formação, que era por debaixo das bancadas do antigo Estádio da Luz. "Quando ele chegou eu já lá estava. Avisou logo que era grande, mas que a idade não era "martelada". Era muito bom jogador, marcava muitos golos e tinha muito potencial. Mas do que me recordo melhor dele é que era muito boa pessoa, calmo, com muito maturidade para a idade que tinha. Gostava de brincar, mas nunca passava os limites. Imagine 25/30 jovens a viver num centro de estágio, apenas com uma pessoa para tomar conta de nós. Há sempre uns exageros, mas ele não", revela ao DN o antigo central.
Jogaram juntos na equipa principal, com Jupp Heynckes. Mas, na opinião de José Soares, a falta de estabilidade do clube na altura não ajudou à consagração de "um avançado rápido e forte, alto", como era Pepa: "Na altura, o Benfica não era o que é hoje, para um miúdo jogar era preciso sei lá o quê. Os estrangeiros que vieram também não ajudavam na integração, o presidente toda a gente sabe quem era [Vale e Azevedo], enfim..."
Nessa altura, o agora técnico do Tondela passou por um momento complicado, com a morte de um familiar, "e o grupo deu-lhe muito apoio". Mesmo o treinador Jupp Heynckes, que era sempre mais frio e distante, segundo José Soares, apoiou-o muito.
O antigo colega de Benfica não ficou surpreendido quando Pepa optou pela carreira de treinador: "Pela forma como falava de futebol e analisava os lances, já se previa."
Foi em 2013, ao serviço da Sanjoanense e com apenas 32 anos, que Pepa deu início à carreira de treinador a solo, depois de passar pela formação da Luz como treinador adjunto e diretor técnico. "Não foi fácil sair devido à afetividade que me liga ao Benfica, mas, ao ver a dimensão da Sanjoanense, as suas condições de trabalho e o fervor dos adeptos, não podia recusar"", disse, na apresentação.
Agora, depois de subir o Feirense à I Liga e passar pelo Moreirense, procura dar estabilidade ao Tondela na I Liga e prepara-se para o segundo encontro frente ao clube que o formou - o primeiro foi na época passada, à 18.ª jornada, na deslocação à Luz (derrota por 4-0). E em silêncio. O técnico não fará a antevisão do jogo, segundo o clube, em sinal de protesto, "face à diferença no acompanhamento mediático que tem sido dado ao Tondela e a outros clubes".