"A estabilidade da zona euro é, acima de tudo, uma questão política"

Criado com Maastricht, para suster a Alemanha, o euro tem enfrentado várias crises. Possível novo embaixador dos EUA para a UE diz que moeda única pode acabar em 18 meses.
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No final de janeiro, em entrevista à BBC, Ted Malloch, o nome de que todos falam para embaixador dos Estados Unidos na União Europeia (e que o Parlamento Europeu rejeita), afirmou que o euro poderá colapsar no espaço de um ano ou de um ano e meio. Não se sabe muito bem em que é que o ex-professor de Oxford, fluente em língua francesa e alemã, se baseia para fazer tal previsão, mas o certo é que, ao longo dos anos, sobretudo os últimos, os da crise e dos resgates, a moeda única europeia - instituída com o Tratado de Maastricht há 25 anos - deu vários sinais de fraqueza.

Em ano de eleições-chave na Holanda, França e Alemanha, em que os populistas, nacionalistas e eurocéticos sobem a olhos vistos nas intenções de voto, as reformas que muitos julgam necessárias na zona euro, como o primeiro-ministro português, António Costa, poderão ser difíceis de aprovar. Isto para já não falar na saída do Reino Unido da UE, o chamado brexit, processo que a primeira-ministra britânica, Theresa May, diz querer ver aprovado pelo Parlamento para que, até final de março, possa ativar o artigo 50.º do Tratado de Lisboa sobre a saída de um país da UE.

"A estabilidade da zona euro é, acima de tudo, uma questão política. A divisa é uma união monetária de Estados soberanos. Especular sobre a falência da moeda é, em última análise, especular sobre desfechos políticos", diz ao DN Guntram Wolff, diretor do think tank Bruegel. "Num nível simbólico, o falhanço da zona euro seria equivalente ao falhanço do projeto europeu, alimentando ainda mais o consenso já existente entre os partidos eurocéticos dos países da UE. Os líderes e os políticos da UE sabem disto e estão conscientes do perigo de rutura da zona euro", afirma, por seu lado, Teresa Pullano, professora do Institute for European Global Studies da Universidade de Basileia na Suíça.

A questão do euro nunca foi pacífica desde a sua criação até aos dias de hoje. Apesar de terem assinado o Tratado de Maastricht, faz hoje 25 anos, Reino Unido e Dinamarca ficaram de fora de uma união monetária que, atualmente, conta com 19 dos 28 Estados membros da UE. No Reino Unido, por exemplo, o debate sobre a moeda única levou a um golpe interno no Partido Conservador que acabaria por afastar do poder a primeira-ministra Margaret Thatcher. O seu sucessor, John Major, conseguiu um opting-out para os britânicos, mas nem assim se livrou de votações embaraçosas contra ele no Parlamento desencadeadas pelos chamados Rebeldes de Maastricht. A Dinamarca, após rejeição em referendo do Tratado naquela cidade holandesa, conseguiu um opting-out também através do chamado acordo de Edimburgo. Foi a maneira que se arranjou de o tratado poder ser ratificado por todos e entrar em vigor no dia 1 de novembro de 1993.

Na base da ideia da moeda única terá estado a vontade francesa de controlar os alemães, uma vez que, depois de reunificada após a queda do muro de Berlim, a Alemanha fortalecia-se. "Sem uma moeda comum estamos subordinados à vontade da Alemanha", disse o então presidente francês François Mitterrand à então primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, em 1989, segundo conta Hans Kundnani no livro The Paradox of German Power. O curioso foi que mesmo com a moeda comum os alemães se revelaram os mais fortes da zona euro.

"É correto que a política económica da Alemanha dos últimos 15 anos colocou a Alemanha numa situação em que beneficia muito do euro. Em contraste, por exemplo, com as decisões de Itália, que ao longo dos mesmos últimos 15 anos enfraqueceram a posição de Itália na zona euro. É imperativo ultrapassar as divergências estruturais entre Norte e Sul", sublinha Wolff, enquanto Teresa Pullano, embora reconhecendo que o euro teve como modelo o marco alemão, refere que "o principal problema é a falta de políticas para implementar e sustentar a moeda única".

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