À esquerda ninguém quer falar em cortes de pessoal

O que pensam os candidatos da reforma do Estado?
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A reforma do Estado era uma das paixões do ex-ministro Paulo Portas, que plasmou as ideias do anterior governo para a área num "guião", que apenas numa pequena parte começou a ser passado à prática. O atual executivo também trouxe as suas próprias ideias, nomeadamente a modernização administrativa, traduzida no regresso do Simplex. O DN foi saber o que pensam os candidatos presidenciais deste tema. Continua a ser urgente? Em que moldes? É inevitável a redução do número de funcionários públicos ou deve manter-se o mecanismo que tem vigorado de subir a receita através dos impostos?

Marcelo Rebelo de Sousa

"Reforma do Estado é urgente e consensual"

De acordo com Marcelo Rebelo de Sousa, a reforma do Estado "é urgente", acrescentando que essa necessidade de acelerar este processo "parece consensual". Ainda assim, prudente - como sempre em matérias de domínio executivo -, Marcelo adverte que "não cabe ao presidente da República sobrepor-se ao Parlamento e ao governo dizendo como".

Edgar Silva

"Reforma não é separável da defesa das funções sociais"

Para Edgar Silva, as experiências recentes de reforma da máquina pública em nada têm beneficiado o país: "A vida comprova que com as sucessivas "reformas do Estado", a pretexto do "corte das gorduras" e da redução do "monstro", como apelidou o atual Presidente da República, os serviços não melhoraram, antes se degradaram e os trabalhadores viram degradadas as suas condições de trabalho e de vida", defende.

O candidato apoiado pelo PCP considera ainda uma "falsa questão" a "aparente dicotomia entre a manutenção das funções sociais do Estado e serviços, com o aumento de impostos ou a sua redução adaptando o Estado às "condições económicas" do país". E justifica o raciocínio com o exemplo das intervenções na banca: "Quando se trata de arranjar milhões de euros para o sistema financeiro, os governos não hesitam em castigar os trabalhadores e o povo."

"A reforma de que tanto se fala não é separável da defesa das funções sociais que estão cometidas ao Estado pela Constituição", completa, explicando: "Isto é, da prestação desses serviços públicos em qualidade e em quantidade ao povo português, e da defesa e dignificação do trabalho e dos trabalhadores."

Marisa Matias

"Trata-se de uma natural e quotidiana necessidade"

Marisa Matias reconhece que "o Estado e os seus organismos têm uma necessidade natural de renovação, tal como as células que compõem qualquer ser vivo, adequando-se às necessidades do momento. Por isso, não se trata de uma urgência, mas sim de uma natural e quotidiana necessidade", explica.

Mas a candidata apoiada pelo Bloco de Esquerda esclarece que a necessidade de reformar o Estado não se deve confundir com um aligeiramento das funções deste: "Ninguém deve duvidar das necessidades de promover a igualdade, com o acesso universal e tendencialmente gratuito à saúde e à educação, com a garantia de um regime justo de Segurança Social ou ainda quanto à garantia de um ambiente sadio e equilibrado, ao acesso à habitação, à cultura ou ao desporto."

Marisa também duvida que a redução dos funcionários públicos ou os cortes de impostos tragam benefícios ao país: "Uma e outra via degradarão a qualidade dos serviços públicos essenciais por falta de recursos humanos e financeiros", considera, apontando baterias à "agiotagem que se verifica na dívida pública" e ao "conjunto de contratos em que o Estado é parte, como sejam as PPP".

António Sampaio da Nóvoa

"Temos enfrentado a questão de uma dimensão comezinha"

Sampaio da Nóvoa também desaconselha a estratégia da redução de funcionários públicos: "A eficiência e eficácia do Estado e dos serviços públicos que assegura perante os cidadãos não pode dispensar um quadro de funcionários qualificado, empenhado e valorizado nos seus direitos laborais e sociais", avisa. "Temos enfrentado a questão sempre de uma dimensão comezinha de aparente poupança de custos, esquecendo que a degradação dos serviços públicos tem custos na economia, na qualidade de vida e na competitividade do país", acrescenta.

Para o antigo reitor da Universidade de Lisboa, "uma reforma do Estado que queira ser bem-sucedida não pode ter estreiteza de visão", dando como exemplo do que foi feito entre a instituição que liderou e a Universidade Técnica, que se uniram: "Criação de escala, racionalidade na utilização de recursos, aproveitamento de sinergias e modernização."

Maria de Belém

"Enfraquecer o Estado" é arriscar sujeitá-lo "a interesses"

Maria de Belém começa a sua análise deste tema com uma declaração prévia: "Fará parte do discurso da Presidente da República a reforma do Estado no sentido da descentralização. Relativamente à reforma do Estado em si, das suas soluções concretas, é uma competência do governo e da Assembleia da República."

Dito isto, considera que os desafios do Estado não se prendem com o número de funcionários e sim com conseguir ter ao serviço deste "gente muito motivada e competente. O Estado tem de ser forte, não tem de ser grande", resume. "Digo-o não como candidata, mas como cidadã e pessoa que conhece profundamente o Estado. Não podemos enfraquecer o Estado e porque isso permitirá que seja capturado por interesses que ele próprio depois não consegue identificar. O Estado tem de defender e preservar o interesse público e para isso tem de ter uma administração competente, forte, independente e prestigiada."

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