Este ano apetece-lhe não sacrificar o bacalhau à tradição pondo outro peixe no seu lugar. Quer uma ajuda? De entre os grandes senhores dos mares e dos rios, surgem-me como primeira escolha o robalo e o salmão, ambos dignos dos maiores encómios desde que sejam de qualidade irrepreensível. Como acontece frequentemente em gastronomia, sendo "o produto que faz o prato", quanto mais simples for o modo de os cozinhar, melhor. .Vem a propósito contar-lhe o que vi numa lição no Hotel da Lapa em Lisboa. Como professor, o chefe Le Divelle, reconhecido especialista em sabores marinhos. O seu restaurante Le Divellec, em Paris, ostenta duas estrelas Michelin e é o "sítio" onde convergem os gastrónomos apreciadores de peixe. Vi-o cozinhar um prato de vieiras com trufas pretas de uma tal simplicidade e bom gosto, que a impossibilidade de o reproduzir por falta do produto me deixou desesperada. Com a mesma simplicidade, o chefe Divelle mostrou-nos como apreciar todo o sabor do melhor dos peixes do Atlântico. Tomou na mão um robalo com cerca de 1,600 kg pela barbatana caudal e mostrou como se avalia a frescura e a qualidade dum peixe..O robalo manteve-se hirto como se estivesse vivo. Divelle é o autor do Larrousse dos peixes. Magnífico. O robalo foi cozinhado "ao sal" perfumado com algas sargaço. Vi-as às montanhas na Apúlia, no Minho. Bem lavadas e cortadas finamente à tesoura, foram misturadas com sal marinho na proporção de 1 para 5 partes de sal. Retiradas as vísceras mas não as escamas, lavado e enxuto, ao robalo, temperado com pimenta, foi-lhe introduzida uma alga na barriga..Estando o forno bem quente (250º), deitou-se o magnífico peixe sobre uma cama de sal com algas e cobriu-se com uma camada do mesmo sal, ficando a cabeça e a barbatana caudal descobertas. Levado ao forno, aí permaneceu 35 minutos, findos os quais se verificou a cozedura introduz-se um palito de metal no dorso até à espinha, toca-se com ele o nosso lábio inferior, e se queimar ligeiramente o nosso peixe só tem que repousar dez minutos para ser comido. Parte-se então a crosta de sal e retira-se, tirando-se depois a pele com as escamas. A acompanhar, vários legumes grelhados e temperados com um azeite aromatizado com ervas..Cuidemos agora do outro senhor, este dos mares e dos rios, o salmão. Será preciso lembrar que o selvagem não se compara com o de cultura? Escolhamos o melhor e sigamos outro chefe de nomeada, Georges Blanc. De qualidade têm que ser também as pontas tenras dos espinafres que irão servir de suporte ao peixe. Escolhidas e lavadas, escorrem-se bem. Para quatro pessoas, aqueça sobre lume muito brando 2 dl de azeite virgem extra e tempere-o com um pouco de flor de sal, pimenta e o sumo de 1/2 limão pequeno. Deite um fio de azeite numa frigideira anti-aderente e coloque aí quatro pavés (postas altas, quadradas, com a pele) de salmão, ficando a pele em contacto com a frigideira. Deixe cozer suavemente quatro minutos e leve a forno quente (220º) mais dois minutos. Noutra frigideira com um pouco de manteiga, salteie rapidamente os espinafres. Tempere com sal, pimenta e noz-moscada..Disponha o salmão com a pele para cima numa travessa aquecida sobre os espinafres. Regue-o com o azeite aromatizado e espalhe sobre o conjunto pimenta moída na altura e alguns grãos de flor de sal. Tomates-cereja cortados em quartos serão a única nota de cor permitida na travessa. À parte, sirva batatinhas cozidas a vapor. Duas sugestões tão simples como elegantes, saídas das mãos de dois grandes mestres.