A desilusão dos mais jovens

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Na semana passada, a Comissão Europeia publicou o relatório de 2022 sobre Emprego e Desenvolvimento Social na Europa (ESDE). Sem surpresas, regista-se que os jovens estão entre os mais afetados pela perda de postos de trabalho durante a crise económica provocada pela pandemia. Revela também que, para os jovens, a recuperação foi mais lenta do que para outros grupos etários, além de terem faltado apoios para aqueles que se candidatavam ao primeiro emprego. O relatório conclui ainda que, além de os jovens com menos de 30 anos enfrentarem dificuldades para encontrar empregos adequados às suas competências e experiência, o desemprego mantém-se mais elevado do que antes de 2019, e cerca de 1 em cada 2 jovens (45,9%) têm contratos temporários, em comparação com 1 em cada 10 de todos os trabalhadores (10,2%).

Outra conclusão refere que os jovens têm de enfrentar uma situação social e financeira difícil, muitos não conseguindo fazer face às despesas diárias, e 61% estando preocupados com a procura ou manutenção de habitação adequada nos próximos dez anos. Se a situação na Europa é sombria, revela-se muito pior em geografias onde os índices de desenvolvimento são mais baixos, incluindo as regiões que começavam a registar algum crescimento económico.

A Educação tem sido apresentada como motor essencial do desenvolvimento social, mas o mundo do trabalho parece não estar a responder da forma esperada. Embora o baixo nível de escolaridade aumente a probabilidade de um jovem acabar na situação de não trabalhar, não estudar, nem fazer formação (os chamados "nem nem"), as elevadas qualificações não garantem a empregabilidade. Além disso, a transformação do mercado de trabalho exige competências que ainda não conhecemos e formações que não estão desenhadas.

Os mais jovens vivem uma profunda incerteza, que é acrescida pela situação do planeta. O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, tem vindo a alertar de forma incisiva para aquilo que designa "um suicídio coletivo" provocado pela crise climática. As vagas de calor, os incêndios, a escassez de água não permitem dúvidas sobre as condições que deixamos às novas gerações. Têm razão em nos acusar de termos beneficiado de um bem que não soubemos preservar e de termos conduzido a nossa vida coletiva para um beco que nos recusamos a reverter.

Que futuro se desenha? Como convencer os jovens a participar na construção de uma cidadania global para a qual pouco contribuímos? Atravessar as terras queimadas é uma infinita tristeza que parece colar-se a todos os nossos gestos. Depois da pandemia, a guerra, os incêndios, o pouco que sobra.

Nunca como agora importa ouvir e implicar os jovens nas decisões que envolvem as suas vidas. Apesar da justa desilusão de muitos, outros - e mesmo os desiludidos - continuam a propor soluções. O tempo é deles. Num recente seminário sobre Educação e Transformação Digital, em que estiveram representantes de jovens de diferentes regiões, a frase mais repetida foi "não deixar ninguém para trás". Os jovens deram voz à solidariedade e mostraram a sua vontade de construir um mundo mais justo, mais equitativo, mais inclusivo.

Há 50 anos, a minha mãe perguntava o que queria dizer poluição. Nesse tempo, em que a civilização do plástico iniciava a sua invasão e alegremente dávamos cabo do planeta, estávamos a centenas de anos do que hoje sabemos. Tão rápido, tão inconsciente, tão egoísta. O planeta sobreviverá. E os nossos filhos, os nossos netos? Mais do que ouvir os jovens, é tempo de os integrar no governo da casa comum.

Diretora em Portugal da Organização de Estados Ibero-Americanos

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