A desbunda das bruxas Sanderson 

29 anos depois, Bette Midler, Sarah Jessica Parker e Kathy Najimy retomam os seus postos em<em> Hocus Pocus</em>, a aventura de um trio estouvado, as irmãs Sanderson, que ainda procura a eterna juventude. Em estreia hoje no Disney+, <em>Três Bruxas Loucas 2</em> faz o aquecimento para o Halloween.
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Uma é ruiva, outra é morena e há ainda uma loira para completar o quadro. Respetivamente, Winifred (Bette Midler), Mary (Kathy Najimy) e Sarah (Sarah Jessica Parker) compõem o trio de irmãs solteiras que irromperam no grande ecrã em 1993, armadas com um livro de feitiçaria e toda uma linguagem corporal de diversão: aos dentes protuberantes e pose afetada da primeira juntavam-se o pragmatismo tosco da segunda e a eterna criancice vaporosa da terceira, dentro de um caldeirão de vilania cómica com pozinhos de musical. Esse filme de culto de Kenny Ortega, produzido pela Disney, ganha agora uma sequela, assinada por Anne Fletcher, cuja prioridade foi não estragar a memória do original Hocus Pocus. Um daqueles casos em que o sucesso cresceu à medida que se foi tornando um título obrigatório na época do Halloween.

Na essência, este regresso das irmãs Sanderson não difere muito da ideia do primeiro filme, em que elas voltavam à vida, precisamente numa noite de Halloween (depois de terem sido enforcadas em Salém no século XVII), sedentas de almas de crianças - o seu elixir da eterna juventude. Mas desta vez há, claro, um contraste temporal maior: ao caírem no mundo contemporâneo, as bruxas têm dificuldade em perceber a lógica daquilo que as rodeia. Há mesmo uma cena em que são levadas a acreditar no efeito milagroso dos cremes antirrugas, e assim que entram num supermercado começam a abrir boiões de creme e a ingerir o seu conteúdo à maluca... Digamos que, não muito longe da imagem dos vampiros de What We Do in The Shadows, elas são figuras de um humor negro perfeitamente delicioso e anacrónico debaixo das lâmpadas frias do estabelecimento.

O que Três Bruxas Loucas 2 acrescenta à fórmula é o drama de um trio de adolescentes que se torna uma espécie de contraponto juvenil das manas malvadas. Tudo acontece numa pouco auspiciosa noite de Halloween em que as raparigas acendem a vela errada (ou a certa, dependendo da perspetiva), ressuscitando Winifred, Mary e Sarah... mais frescas do que nunca e com planos de vingança improvisados como passos de dança.

Por falar em dança, a música já fazia parte do universo de Hocus Pocus. E sendo a nova realizadora, Anne Fletcher, também coreógrafa, numa conferência de imprensa global a que o DN teve acesso via Zoom, foi quase inevitável começar a conversa por aí, pelo papel de alguém que põe a sua habilidade coreográfica ao serviço de uma certa marca de memória popular. Nas palavras de Fletcher: "A missão em geral era a história, honrar o primeiro filme e dar-lhe uma sequela, garantir que estava a honrar estas personagens, para os fãs e para uma nova geração. Os números musicais estão ao serviço dessa história. Como costumo dizer, eu não consigo competir com o número I Put a Spell On You [que no primeiro filme tem os arranjos de Marc Shaiman], por isso nem tentei... Mantivemo-nos mais focados na direção da história."

A parte narrativa é sempre importante na consolidação de um imaginário. Mas o que é que, de facto, torna as irmãs Sanderson tão apelativas? Bette Midler resume bem a cumplicidade feminina do trio maravilha: "Num mundo com tanto a acontecer, talvez só nos últimos 25 ou 30 anos, é que percebemos realmente como as coisas mudaram para as mulheres; mas não com a rapidez suficiente. E penso que estas três personagens, na sua estranha forma de ser, são bastante positivas para as mulheres! Antes de mais, são super cómicas - algo que não é "suposto" as mulheres serem -, e são intensamente leais umas com as outras, apesar da vasta gama de emoções com que se vão deparando. No fim de contas, e do jeito mais engraçado, é esse vínculo que prevalece." Uma constatação que, na ausência de Sarah Jessica Parker, Kathy Najimy se apressa a completar: "Somos também muito determinadas! Não pensamos duas vezes, mesmo que em causa esteja comer criancinhas... (risos) Ou seja, as mulheres podem ter este nível de determinação!"

Há um espírito leve entre os atores, produtores e realizadora que passa pela própria natureza divertida do projeto, marcado não só pelo regresso das atrizes principais, mas também por um elenco mais jovem que já era fã do original.

Outra das personagens a retornar à base, e que com o tempo se afirmou como uma das mais populares, é Billy Butcherson, o zombie que andava meio perdido na azáfama do primeiro filme, e que volta a cumprir esse desígnio de alma importunada no seu sono eterno, desta vez com um pouco mais de proatividade. Por detrás da máscara, apresenta-se Doug Jones, o ator esguio que já vestiu a pele de vários monstros de Guillermo del Toro (entre eles, o anfíbio de A Forma da Água), e que aqui se estreou como morto-vivo: "Fui um zombie antes de os zombies serem fixes, e não era um zombie mau... Só queria voltar para a cova e dormir, só queria que me deixassem em paz!" Com quase três décadas entre as duas vigílias de Halloween, Jones reflete ainda sobre a questão do reencontro com a sua imagem fabricada: "Billy Butcherson é um papel muito físico. Eu tinha 32 anos no primeiro filme e neste tenho 61, o que é uma grande diferença! Mas depois olhas-te ao espelho [com o trabalho da maquilhagem] e parece que, em vez de 29 anos, passaram dois minutos! De resto, volta tudo ao sítio, como que por magia..."

Abracadabra, eis a palavra de ordem.

dnot@dn.pt

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