Observe a palma da sua mão. Com o polegar, conte o total de falanges nos outros quatro dedos (uma falange, a grosso modo, é cada uma das partes do dedo, separada por uma linha). Se tudo correr bem, a soma resultará 12. A operação é importante porque assim funcionava a "calculadora" quatro mil anos antes de Cristo na Suméria, a primeira civilização a estudar os céus com a finalidade de organizar um calendário. Graças ao sistema duodecimal sumério, o número 12 e seus múltiplos são a base de unidades de tempo como o minuto (60 segundos), a hora (60 minutos) e o dia (24 horas)..A tese é do historiador e matemático francês Georges Ifrah, autor de "The Universal History of Numbers" (The Harvill Press), e ilustra como o tempo, a priori incomensurável, foi aos poucos organizado. O debate sobre a adoção ou não da mudança de horário durante o inverno em Portugal é apenas mais uma entre tantas polémicas de uma milenar história de dias, horas e meses subtraídos, adicionados e recalculados. Governantes a alterar o calendário também não é novidade: houve imperador romano a dar o próprio nome a um mês e um papa a desaparecer com dias. A contribuição dos sumérios ao registo do tempo foi significativa, mas não o suficiente para organizar a vida quotidiana do homem. Um bom exemplo é a semana: se o sistema duodecimal orientou o cálculo de minutos e horas, o esperado seria uma jornada semanal com seis ou 12 dias, e não sete..Neste caso, a "culpa" é da Lua. O calendário lunar foi um dos primeiros utilizados pelo homem, graças à facilidade em se observar as mudanças de fase da Lua. Nele, o mês mede-se entre uma lua cheia e outra, com a semana a iniciar-se em cada fase lunar (não por acaso, o primeiro dia da semana em vários idiomas faz menção ao astro)..Assim como a Terra em relação ao Sol, o satélite natural dá uma volta completa em nosso planeta. Esse movimento de "revolução" dura cerca de 27 dias. Porém, como a Terra se move neste período, só é possível observar da superfície terrestre o surgimento de duas luas cheias consecutivas a cada 29 dias. Em ambos os casos, ao dividir-se o "mês lunar" pelo número de fases, tem-se uma semana com aproximadamente sete dias. A Lua também pode ter influenciado o número de meses do ano. Mesmo no ano trópico, ou solar, ocorrem 12 (olha ele aí novamente) luas cheias. As estações climáticas, por sinal, foram o principal motivo para o calendário lunar não vingar. Como explicam os astrônomos brasileiros Alexandre Chermann e Fernando Vieira, no livro "O Tempo que o Tempo Tem" (Zahar Editora), o calendário foi pensado inicialmente para organizar o trabalho na agricultura. Se a natureza, ao contrário dos mais românticos, não se orienta pela Lua, mas pelo Sol, o ano lunar foi abandonado na maioria das culturas..A primeira versão do calendário solar surgiu cerca de sete séculos antes de Cristo e foi obra de Rômulo, rei de Roma (o mesmo do mito da loba e do fratricídio de Remo). Nele, o ano começava na primavera, durante o equinócio, quando o dia e a noite têm a mesma duração. Como no inverno não havia atividade na agricultura, o calendário registava apenas dez meses. Os romanos simplesmente ignoravam os cerca de 60 dias restantes e o ano terminava sem começar imediatamente o outro. Apesar de não ser uma má ideia, não resistiu ao tempo, ao contrário dos nomes dos meses..O ano começava em martius, dedicado a Marte, o deus romano da guerra e patrono das campanhas militares. Seguia-se aprilis, uma corruptela do latim "aprire", referência ao período d as flores abrirem. Os deuses Maia e Juno foram agraciados com maius e junius. A partir daí, porém, Rômulo parece ter perdido a inspiração e resolveu adotar uma sequência ordinal do quinto ao décimo mês, nomeando-os de quintilis, sextilis, september, october, november e december..A ideia de criar mais dois meses e incluir os 60 dias "esquecidos" foi de Numa Pompílio, sucessor de Rômulo. Depois de december, viria februarius, dedicado a Februs, deus da purificação. Em algumas culturas, fevereiro ainda é relacionado a um período de resguardo, como na Quaresma. O calendário fechava em januarius, em honra a Janus, divindade de duas faces, a observar simultaneamente o ano que terminava e o que iria se iniciar..Alterar o calendário por uma decisão política, portanto, não é propriamente uma novidade..Os pontífices romanos, por exemplo, inverteram a ordem entre februarius e januarius no calendário "pompiliano", a fim de o período de purificação coincidir com a chegada do novo anuário. Não contavam, porém, com a influência das causas bélicas..Até meados do século 2 a.C., os cônsules eram investidos no cargo no início do ano, em março. Uma rebelião na Hispánia, porém, exigia a presença do futuro cônsul na colónia romana, Quintus Fulvius Nobilior, sob o risco de Roma perder o controlo da situação. Os senadores trataram de antecipar o início do ano para 1º de janeiro (Marte certamente compreenderia). Jano voltava a mirar as duas faces para o passado e o futuro dos anos..A decisões dos Senado empurrou december para o fim do calendário e isto explica porque o décimo segundo mês do ano é dezembro e não, "dozembro"..Júlio César voltaria e mexer no tempo. Foi dele a ideia do ano bissexto, a fim de incluir as horas "perdidas" pelo ano solar fracionado em 365 dias e seis horas. De quatro em quatro anos, fevereiro teria 30 dias, em vez de 29. Como um bom ditador, César decidiu ainda homenagear a si mesmo com um mês e quintilis passou a chamar-se julius..Sucessor de César, Augusto gostou da ideia de ter um mês para chamar de seu e decidiu sucedê-lo também no calendário. Sexitili virou augustus, com um detalhe importante: se julius tinha 31 dias, um mês dedicado a ele obviamente não seria menor. Sobrou para fevereiro, a partir de então com 28 dias, ou 29, nos anos bissextos..A última alteração significativa seria 15 séculos depois, quando percebeu-se que o ano trópico somava precisamente 365 dias, cinco horas, 48 minutos e 45 segundos. O calendário juliano, portanto, estava desfasado em cerca de 11 minutos. Pode parecer pouco em relação a um ano, mas não em mil e quinhentos anos. Um problema para os católicos, pois a Páscoa não era mais celebrada na data correta..Coube ao papa Gregório XIII atualizar os fiéis de suas obrigações. A bula Inter Gravissimas determinou que a quinta-feira 4 de outubro de 1582 seria seguida por uma sexta-feira... 15 de outubro. Sorte do papa não existirem as redes sociais, pois se adiantar os relógios em uma hora é polémico, imagine sumir com 11 dias do calendário..O papa Gregório, contudo, ainda não escapou por definitivo dos haters. Para evitar futuros atrasos no calendário, ainda mais com o nome dele (gregoriano), a mesma bula determinou que em cada quatro séculos, três anos bissextos deixem de sê-lo. Foi assim em 1700, 1800 e 1900, e será igual em 2100, 2200 e 2300. Ou seja, nos próximos 300 anos o papa ainda deve ser motivo de muito comentário maldoso na internet.
Observe a palma da sua mão. Com o polegar, conte o total de falanges nos outros quatro dedos (uma falange, a grosso modo, é cada uma das partes do dedo, separada por uma linha). Se tudo correr bem, a soma resultará 12. A operação é importante porque assim funcionava a "calculadora" quatro mil anos antes de Cristo na Suméria, a primeira civilização a estudar os céus com a finalidade de organizar um calendário. Graças ao sistema duodecimal sumério, o número 12 e seus múltiplos são a base de unidades de tempo como o minuto (60 segundos), a hora (60 minutos) e o dia (24 horas)..A tese é do historiador e matemático francês Georges Ifrah, autor de "The Universal History of Numbers" (The Harvill Press), e ilustra como o tempo, a priori incomensurável, foi aos poucos organizado. O debate sobre a adoção ou não da mudança de horário durante o inverno em Portugal é apenas mais uma entre tantas polémicas de uma milenar história de dias, horas e meses subtraídos, adicionados e recalculados. Governantes a alterar o calendário também não é novidade: houve imperador romano a dar o próprio nome a um mês e um papa a desaparecer com dias. A contribuição dos sumérios ao registo do tempo foi significativa, mas não o suficiente para organizar a vida quotidiana do homem. Um bom exemplo é a semana: se o sistema duodecimal orientou o cálculo de minutos e horas, o esperado seria uma jornada semanal com seis ou 12 dias, e não sete..Neste caso, a "culpa" é da Lua. O calendário lunar foi um dos primeiros utilizados pelo homem, graças à facilidade em se observar as mudanças de fase da Lua. Nele, o mês mede-se entre uma lua cheia e outra, com a semana a iniciar-se em cada fase lunar (não por acaso, o primeiro dia da semana em vários idiomas faz menção ao astro)..Assim como a Terra em relação ao Sol, o satélite natural dá uma volta completa em nosso planeta. Esse movimento de "revolução" dura cerca de 27 dias. Porém, como a Terra se move neste período, só é possível observar da superfície terrestre o surgimento de duas luas cheias consecutivas a cada 29 dias. Em ambos os casos, ao dividir-se o "mês lunar" pelo número de fases, tem-se uma semana com aproximadamente sete dias. A Lua também pode ter influenciado o número de meses do ano. Mesmo no ano trópico, ou solar, ocorrem 12 (olha ele aí novamente) luas cheias. As estações climáticas, por sinal, foram o principal motivo para o calendário lunar não vingar. Como explicam os astrônomos brasileiros Alexandre Chermann e Fernando Vieira, no livro "O Tempo que o Tempo Tem" (Zahar Editora), o calendário foi pensado inicialmente para organizar o trabalho na agricultura. Se a natureza, ao contrário dos mais românticos, não se orienta pela Lua, mas pelo Sol, o ano lunar foi abandonado na maioria das culturas..A primeira versão do calendário solar surgiu cerca de sete séculos antes de Cristo e foi obra de Rômulo, rei de Roma (o mesmo do mito da loba e do fratricídio de Remo). Nele, o ano começava na primavera, durante o equinócio, quando o dia e a noite têm a mesma duração. Como no inverno não havia atividade na agricultura, o calendário registava apenas dez meses. Os romanos simplesmente ignoravam os cerca de 60 dias restantes e o ano terminava sem começar imediatamente o outro. Apesar de não ser uma má ideia, não resistiu ao tempo, ao contrário dos nomes dos meses..O ano começava em martius, dedicado a Marte, o deus romano da guerra e patrono das campanhas militares. Seguia-se aprilis, uma corruptela do latim "aprire", referência ao período d as flores abrirem. Os deuses Maia e Juno foram agraciados com maius e junius. A partir daí, porém, Rômulo parece ter perdido a inspiração e resolveu adotar uma sequência ordinal do quinto ao décimo mês, nomeando-os de quintilis, sextilis, september, october, november e december..A ideia de criar mais dois meses e incluir os 60 dias "esquecidos" foi de Numa Pompílio, sucessor de Rômulo. Depois de december, viria februarius, dedicado a Februs, deus da purificação. Em algumas culturas, fevereiro ainda é relacionado a um período de resguardo, como na Quaresma. O calendário fechava em januarius, em honra a Janus, divindade de duas faces, a observar simultaneamente o ano que terminava e o que iria se iniciar..Alterar o calendário por uma decisão política, portanto, não é propriamente uma novidade..Os pontífices romanos, por exemplo, inverteram a ordem entre februarius e januarius no calendário "pompiliano", a fim de o período de purificação coincidir com a chegada do novo anuário. Não contavam, porém, com a influência das causas bélicas..Até meados do século 2 a.C., os cônsules eram investidos no cargo no início do ano, em março. Uma rebelião na Hispánia, porém, exigia a presença do futuro cônsul na colónia romana, Quintus Fulvius Nobilior, sob o risco de Roma perder o controlo da situação. Os senadores trataram de antecipar o início do ano para 1º de janeiro (Marte certamente compreenderia). Jano voltava a mirar as duas faces para o passado e o futuro dos anos..A decisões dos Senado empurrou december para o fim do calendário e isto explica porque o décimo segundo mês do ano é dezembro e não, "dozembro"..Júlio César voltaria e mexer no tempo. Foi dele a ideia do ano bissexto, a fim de incluir as horas "perdidas" pelo ano solar fracionado em 365 dias e seis horas. De quatro em quatro anos, fevereiro teria 30 dias, em vez de 29. Como um bom ditador, César decidiu ainda homenagear a si mesmo com um mês e quintilis passou a chamar-se julius..Sucessor de César, Augusto gostou da ideia de ter um mês para chamar de seu e decidiu sucedê-lo também no calendário. Sexitili virou augustus, com um detalhe importante: se julius tinha 31 dias, um mês dedicado a ele obviamente não seria menor. Sobrou para fevereiro, a partir de então com 28 dias, ou 29, nos anos bissextos..A última alteração significativa seria 15 séculos depois, quando percebeu-se que o ano trópico somava precisamente 365 dias, cinco horas, 48 minutos e 45 segundos. O calendário juliano, portanto, estava desfasado em cerca de 11 minutos. Pode parecer pouco em relação a um ano, mas não em mil e quinhentos anos. Um problema para os católicos, pois a Páscoa não era mais celebrada na data correta..Coube ao papa Gregório XIII atualizar os fiéis de suas obrigações. A bula Inter Gravissimas determinou que a quinta-feira 4 de outubro de 1582 seria seguida por uma sexta-feira... 15 de outubro. Sorte do papa não existirem as redes sociais, pois se adiantar os relógios em uma hora é polémico, imagine sumir com 11 dias do calendário..O papa Gregório, contudo, ainda não escapou por definitivo dos haters. Para evitar futuros atrasos no calendário, ainda mais com o nome dele (gregoriano), a mesma bula determinou que em cada quatro séculos, três anos bissextos deixem de sê-lo. Foi assim em 1700, 1800 e 1900, e será igual em 2100, 2200 e 2300. Ou seja, nos próximos 300 anos o papa ainda deve ser motivo de muito comentário maldoso na internet.