A Cidade das Mangueiras
Belém, banhada pelo rio Guamá às margens da baía de Guajará, é uma cidade rodeada de rios, lagos, canais, igarapés, árvores, furos, igapós e ilhas que formam uma longa trança aquática espelhando o mundo líquido refletido nas belezas da região. Considerada a porta de entrada da Amazónia, pela sua posição estratégica no Norte do Brasil, dentro da maior reserva da biodiversidade e extensão do planeta Terra, razão que a distingue de outras cidades, causando surpresa às pessoas que a visitam.
Situada sob a linha do equador, possui clima quente e húmido a uma temperatura oscilante de 20º C mínima e 38º C máxima, à sombra, diariamente com a humidade relativa do ar de 89%. "Antes ou depois da chuva", expressão que identifica as duas estações: "inverno" quando chove muito e "verão" quando chove menos, é sempre acompanhada de calor intenso, sinal identificativo que antecede a chuva.
A cidade acorda no Ver-o-Peso, às quatro horas da madrugada, entre as torres do Mercado de Ferro, marca-símbolo da Cidade das Mangueiras. Começa o seu dia vendendo, comprando, trocando, passeando, saboreando as iguarias típicas, desfrutando a brisa do amanhecer.
O modo de viver dos paraenses está no Ver-o-Peso, o logradouro simples onde aportam pitorescos barcos de pesca, canoas e igarités, desembarcando "de um tudo". Uma profusão de cores, peças, tipos, coisas mil se misturam, das velas das canoas aos frutos, flores, vidros de magia, ervas para banho de cheiro, plantas e cachaça. Também se encontra produtos artesanais, caboclos, vendedores de tapioquinhas, mingau, tacacá, maniçoba e caruru, além de artigos de cerâmica utilitária, redes, pescado salgado e pimenta de cheiro, refletindo o quotidiano da capital.
Para visitar a "urbe" prefira um passeio a pé iniciando pelo Mercado de Ferro ou do Peixe com suas quatro torres, símbolo da era da borracha. Mais adiante, o Mercado da Carne, arquitetura de ferro deslumbrante na traça de Francisco Bolonha, e o Solar da Beira, outrora espaço da Fiscalização Municipal, atualmente dividido em boxes para venda de artesanatos.
A poucos passos do ancoradouro-feira, Belém nasceu. E o seu berço foi o atual Forte do Castelo, o velho Forte do Presépio, no início do século XVII, em 12 de janeiro de 1616, junto com a cidade batizada Feliz Lusitânia, por obra e graça de Francisco Caldeira Castelo Branco, capitão-mor português. Ao seu lado, iniciando o arruamento a estreita Ladeira do Castelo, a primeira viela, que o separa do Palácio Episcopal, onde há alguns anos o Papa João Paulo II se hospedou. Na Cidade Velha siga pelas ruas estreitas apreciando os conjuntos de casarões antigos revestidos da melhor azulejaria colonial portuguesa. Ver os detalhes da Igreja de Nossa Senhora do Carmo, obra do arquiteto italiano António Landi, tendo ao lado a Capela da Ordem Terceira do Carmo com valiosa coleção de arte sacra; a Catedral Metropolitana de Belém, com belíssimas telas de De Angelis e esculturas de Luca Ganamini. Em frente, a Igreja de Santo Alexandre, da Ordem dos Jesuítas, atualmente Museu de Arte Sacra do Pará.
Prosseguindo, encontra o Museu Histórico do Pará e o Museu de Arte de Belém, autênticos relicários de acervos históricos dos paraenses. No último, destaca-se a tela dos últimos momentos do maestro Carlos Gomes, autoria de Domênico de Ângelis e Giovanni Capranesi. Adiante, está a Igreja de São João Batista, no largo do mesmo nome, que serviu de Matriz de Belém, e de prisão do padre António, no século XVIII.
Um dos destaques do final do século XIX início do século XX é o palacete da antiga loja Paris n"América com suas escadas de ferro, complementadas pelas colunas com decoração art noveau, herança do fausto do Ciclo da Borracha. O Teatro da Paz, em estilo neoclássico, na época do Brasil Império, foi a mais suntuosa casa de espetáculos do género, as belíssimas pinturas que compõem os tetos e o pano de boca ostentam o luxo e o requinte da secular sala de arte cénica.
Se estiver na cidade em outubro, imperdível apreciar o Círio de Nazaré, procissão que se realiza no segundo domingo desse mês. Sai da catedral às primeiras horas da manhã, percorre as ruas da cidade acompanhada por cerca de dois milhões de fiéis. Chega à Basílica de Nossa Senhora de Nazaré, sendo a imagem recolhida, após a missa, ao altar-mor onde fica 15 dias recebendo devotos que vão agradecer as graças alcançadas. O templo é uma réplica da Basílica de São Paulo, de Roma.
Para vivenciar a natureza, vá ao Museu Emílio Goeldi, no centro da cidade. Instituição secular que regista a maior coleção de antropologia, etnologia e botânica, possui um parque botânico e zoo amazónico; edita um Boletim Científico sobre geologia, geografia, fauna e flora, arqueologia e antropologia que desde o século XIX tem despertado o interesse de cientistas, naturalistas, técnicos e estudiosos de várias partes do mundo.
O Bosque Rodrigues Alves, um dos pontos mais bonitos da capital, é uma autêntica floresta dentro da cidade. Possui mais de 2000 árvores, orquidário, viveiros de aves e lagos onde barquinhos aliam diversão e estudos científicos às crianças. Espaços de maior visitação: Gruta Encantada, Cabanas, Lagos dos legendários da floresta Ceci e Peri, Mapinguari e Curupira, considerados os guardiões da floresta amazónica.
No Mangal das Garças, no centro histórico de Belém, encontram-se animais da região, mais de trezentas espécies de plantas regionais, o Borboletário, o Orquidário com várias espécies do mundo, Viveiro de Pássaros, além do Museu Amazónico da Navegação. Saboreie as iguarias, pato no tucupi, caruru, pirarucu, caranguejo, filhote e maniçoba. Indispensável a sobremesa com açaí, bacuri, graviola, taperebá, pupunha, mangaba, murici, biribá, cutiti, castanha-do-pará e uxi. No final da tarde a pedida é sorvete de tapioca, graviola, cupuaçu e bacuri.
Belém, a Cidade das Mangueiras, ainda preserva o seu património histórico e cultural, tem um povo hospitaleiro e alegre, que sabe ser bom, é também cheia de contrastes, guarda momentos de um passado em que a borracha fazia a riqueza e se orgulhava de ser um dos maiores centros culturais de um Brasil que se afirmava.
Historiadora