Acabou por descobrir que a morte de Biko ficou a dever-se a um grave ferimento na cabeça, sofrido quando estava sob custódia policial. "Nem sinal de greve de fome - dizem médicos de Biko." Esta manchete, da autoria de Zille, caiu como uma bomba e emitiu ondas de choque um pouco por toda a África do Sul. O ministro da Justiça e chefe da polícia, J.T. Kruger, logo ameaçou fechar o jornal e obrigou-o a fazer uma correcção. Zille, que então recebia já ameaças de morte, demitiu-se de imediato do jornal e seguiu em frente com a sua luta contra o regime racista branco. Apesar de ser ela própria branca, oriundo de uma família de judeus alemães que, em 1930, decidiu partir para a África do Sul. .Hoje, Zille, com 58 anos, prepara-se para assumir o cargo de ministra-presidente da província do Cabo Ocidental, que o seu partido conseguiu ganhar nas eleições legislativas de 22 de Abril à formação que há quinze anos está no poder no país: o Congresso Nacional Africano (ANC). Histórico na luta contra o Apartheid, o ANC, que governa desde 1994, venceu em todas as províncias sul-africanas. Excepto na do Cabo Ocidental. E isso, dizem muitos analistas, é um mérito pessoal da líder da Aliança Democrática, que até agora ocupava o cargo de presidente da câmara da Cidade do Cabo, a principal da província do Cabo Ocidental. .Admirada pela forma como tem tentado combater a criminalidade, o tráfico e o consumo de droga na Cidade do Cabo, especialmente a Tik, alcunha dada à metanfetamina, Zille ganhou, em 2008, o World Mayor of the Year, prémio atribuído ao melhor autarca do mundo. Fluente em várias das línguas oficiais sul-africanas, como inglês, xhosa e africânder, mas também na dos seus pais, a língua alemã, a líder da Aliança Democrática (AD) entrou na vida política nos anos 80. E cimentou o seu interesse por ela na década de 90. Nessa altura tornou-se membro do Partido Democrático, liberal, que mais tarde, em 2000, daria origem à AD. . Encarregue de reformular a política de Educação defendida pelo seu partido, entrou no Parlamento provincial, em 1999, chegando ao Parlamento nacional cinco anos mais tarde. Formada na área das Artes, casada, mãe de dois rapazes, Zille foi eleita para a presidência da Câmara da Cidade do Cabo em 2006. Agora, que o seu partido venceu no Cabo Ocidental, prepara-se para mostrar aos eleitores como este partido, vindo da oposição branca ao apartheid, pode constituir uma alternativa ao ANC - já nas próximas eleições legislativas de 2011. .Ao longo da campanha que passou, Zille não cessou de desafiar o homem que será o próximo presidente da África do Sul, Jacob Zuma, quer para um debate, o que ele recusou, quer para ir aos tribunais responder às acusações de corrupção que pesavam contra ele. Estas foram retiradas, na véspera das eleições, pelo procurador-geral sul-africano. Mas a líder da AD já garantiu que vai recorrer da decisão, nem que seja para o Tribunal Constitucional. "Zuma disse no início deste ano que estava disposto a debater qualquer coisa, com qualquer pessoa, mas ignorou, no entanto, o meu desafio para debater o futuro dos Escorpiões [unidade que investigava o crime e a corrupção] e recusa também debater comigo agora", disse Zille, no decorrer da campanha para as legislativas. Além destes temas, assegurou, a líder da AD pretende discutir com o presidente do ANC questões como a legislação laboral, o Zimbabwe, o problema do HIV/Sida na África do Sul. .Esta é uma questão fundamental, uma vez que Zuma disse, em pleno tribunal, que manteve relações sexuais com uma mulher infectada porque pensava que a seguir ia tomar duche e ficava livre do perigo de contrair a doença. Teve um comportamento que vai muito na linha do que aliás tinha o anterior presidente sul-africano, Thabo Mbeki, também do ANC, que foi citada a dizer que o HIV/Sida era um invenção do mundo ocidental para destruir os povos do continente africano. E na linha da ex-ministra da Saúde, que aconselhava as pessoas infectadas a esfregarem-se com alho, para assim ficarem limpas e curadas. . Os detractores de Zille tentam tirar-lhe confiança com provocações que visam fazê-la sentir menos africana do que eles. "Algumas pessoas dizem-me para eu não dançar porque não é meu estilo. Mas devo vergar e dizer que não, obrigada, não posso dançar?", questiona-se a líder da AD, na atitude desafiadora que a caracteriza. "A música e a dança são coisas que fazem parte da cultura da África do Sul", sublinha, em declarações citadas pela BBC.