A Argélia e o Sahara Ocidental
No seguimento do artigo publicado a 30 de novembro de 2020 no jornal "Diário de Notícias" relativo à questão do Sahara Ocidental, e no qual vem citado o nome da Argélia, gostaria de fazer o seguinte esclarecimento:
1. O Processo de resolução da questão do Sahara Ocidental, estabelecido pelas Nações Unidas em 1991, indica claramente que a Argélia e a Mauritânia são "Países Vizinhos e Observadores Oficiais" deste Processo, e que as únicas partes do conflito, signatárias do Acordo de cessar-fogo de 1991 e dos Acordos militares relacionados, são Marrocos e a Frente Polisário;
2. O apoio inabalável da Argélia "às causas justas" em todo o mundo, como a de Timor-Leste, dos países africanos de Língua Portuguesa (PALOP) e das causas palestiniana e saharaui, emana dos princípios e dos ideais da sua Gloriosa Revolução e do seu processo de resolução, pela via referendária, que conduziram a sua independência a 5 de julho de 1962. Este compromisso firme e sincero nunca colocou a Argélia na posição de "parte em conflito";
3. O envolvimento militar recente de Marrocos, de 13 de novembro, contra civis saharauis na zona tampão de EL GUERGUERAT, que se encontra sob controlo exclusivo da MINURSO por força do Acordo de cessar-fogo de 1991, entre Marrocos e a Frente Polisário, provocou a reação da Frente Polisário, que considerou esta intrusão como uma retirada unilateral de Marrocos deste Acordo de cessar-fogo, que lhe confere, doravante, o direito legítimo de retomar a sua luta armada;
4. A Argélia, preocupada com esta escalada perigosa que corre o risco de abrir a via para um agravamento securitário na região e para além dela, apelou às duas partes em conflito para que dessem provas de sentido de responsabilidade e de contenção, e respeitassem, na sua integralidade, o Acordo de cessar-fogo e o Acordo militar n.º 1, e reiterou o seu apelo ardente ao Secretário-Geral das Nações Unidas para a nomeação, quanto antes, de um Enviado pessoal com vista à rápida e efetiva retoma das negociações políticas entre as duas partes envolvidas no conflito, Marrocos e a Frente Polisário. Convém, contudo, recordar "os elementos básicos" que constituem este conflito e que são os seguintes:
a. A questão do Sahara Ocidental é uma questão de descolonização reconhecida enquanto tal, inscrita, desde l963, como "território não autónomo", do nível da 4.ª Comissão da ONU, nos termos da resolução 1514 da Assembleia Geral das Nações Unidas;
b. Após um conflito armado de vários anos entre Marrocos e a Frente Polisário, foi assinado um Plano de Resolução em 1991, que impõe uma cessação das hostilidades entre as duas partes em conflito mediante a instalação da Missão das Nações Unidas para a organização de um Referendo no Sahara Ocidental (MINURSO), que, como o seu nome indica, dispõe de um "só e único mandato" que é o de garantir a organização, no melhor prazo possível, de um Referendo "livre e autêntico" que permita ao Povo do Sahara Ocidental exercer o seu direito inalienável à autodeterminação;
c. No entanto, a via referendária continua a ser a saída mais recomendada pela Legalidade lnternacional para a resolução deste tipo de conflitos (processos de descolonização) e não pode, de maneira nenhuma, ser encarada como sendo "obsoleta ou inaplicável" ou ser considerada prescrita.
d. Convém salientar, por fim, a declaração do Secretário Geral das Nações Unidas, António Guterres, no dia 11.12.2020 que precisa claramente que "para a ONU, no que diz respeito ao Sahara Ocidental tudo fica inalterado. A solução do conflito do Sahara Ocidental não depende do reconhecimento dos Estados individualmente, depende sim da aplicação das resoluções do Conselho de segurança".
Embaixador da Argélia em Portugal