A alimentação como ferramenta para prevenir e lidar com o cancro
O cancro é uma doença assustadora para quem vive com ela e a alimentação pode ser uma das formas de a racionalizar e ganhar forças para a ultrapassar. Marta Carriço e Catarina Sousa Guerreiro apresentam no livro Comer para Prevenir e Enfrentar o Cancro algumas ferramentas para quem já tem a doença, mas também para quem a quer prevenir. No entanto, sempre com a premissa de que os conselhos apresentados não substituem o aconselhamento médico profissional.
Este livro surgiu de um convite da editora que queria desenvolver o tema da nutrição e da oncologia e as autoras decidiram agarrar o desafio. "Para nós é óbvia a necessidade deste enquadramento junto da população, haver uma maior explicação da importância da nutrição nas diferentes fases do processo oncológico", conta Catarina Sousa Guerreiro, nutricionista e professora associada da Faculdade de Medicina de Lisboa (FMUL). A possibilidade de esclarecer as pessoas que seguem, e que, por vezes, se deixam levar por toda a desinformação que existe quanto à relação entre a nutrição e a oncologia, motivou as autoras na escrita do livro.
Em todo o processo, Marta e Catarina basearam a sua escrita em evidência científica e nada mais, dizem. "Há muitos estudos que comprovam esta ligação [entre nutrição e oncologia], mas a grande mensagem será a nossa experiência clínica e tudo suportado numa evidência científica", diz Catarina Sousa Guerreiro. Também a experiência a trabalhar com pacientes permitiu que as autoras soubessem quais é que são realmente as dúvidas que os assolam.
Marta Carriço é atualmente nutricionista na Fundação Champalimaud e Catarina também exerceu a profissão durante vários anos, antes de dedicar o seu tempo ao mundo académico. As autoras focam a sua análise em dois momentos: a prevenção e o contexto da doença.
Em termos da prevenção, apresentam a alimentação como sendo uma forma de fornecer ao corpo tudo aquilo de que ele precisa para se manter protegido e lidar com as agressões que sofre todos os dias - algumas das quais podem levar a uma doença oncológica.
Já no contexto da doença, "nós sabemos que temos de garantir uma série de nutrientes, de energia, de proteína, temos de ajudar os doentes a lidar com inúmeros sintomas, e a alimentação aqui é fundamental, no sentido em que o doente precisa de saber o que há de comer, esclarecer as suas dúvidas, gerir os seus sintomas", explica Marta Carriço.
As autoras esperam que o livro sirva como um guia orientador para quem está a passar por um processo de tratamento de quimioterapia, radioterapia, cirurgia, imunoterapia, ou seja qual for, podendo encontrar nele dicas úteis sobre a alimentação mais adequada a cada circunstância.
Marta e Catarina reconhecem que quando uma pessoa é diagnosticada com cancro está mais suscetível e procura mais informação para descobrir formas de aliviar o impacto da doença. Métodos como o jejum intermitente ou a dieta alcanina podem surgir nestas pesquisas. "Passa muito por explicarmos ao doente quais é que são os fundamentos científicos das dietas que eventualmente estão a ser propostas e explicar-lhes se há ou não evidência científica", diz Marta Carriço.
Fazem também questão de reforçar que, enquanto não houver provas científicas da eficácia de dietas de restrição calórica, estas são desaconselhadas pelos especialistas. Um dos grandes objetivos deste livro é a literacia, o esclarecimento dos doentes, mas também dos seus familiares. As duas nutricionistas consideram que muitos dos erros que se cometem em áreas relacionadas com a nutrição e a saúde têm a ver com a falta de literacia alimentar, mas que em Portugal se está a ir num bom caminho para mudar este paradigma.
O livro já estava escrito quando as autoras decidiram incluir um capítulo sobre risco relativo e absoluto. O risco absoluto diz respeito à probabilidade de uma pessoa desenvolver uma doença por causa das suas características, enquanto que o risco relativo avalia o risco de uma pessoa tendo em conta um comportamento, como a alimentação por exemplo.
"Muitas vezes, quando as pessoas veem que o tomate diminui o risco de cancro ou a carne aumenta esse risco, é preciso enquadrar isso no risco que aquela pessoa tem por causa da sua idade, do género, da história familiar, que são grandes variáveis para atribuirmos um risco. Esse é o risco absoluto", explica Catarina Sousa Guerreiro.
Depois, há os pequenos riscos que vão sendo acrescentados por fatores como a alimentação. "Às vezes quando os doentes leem que determinado alimento aumenta o risco de cancro em 50% ficam assustadas. Mas estamos a falar de um aumento do risco que já tenho por causa das minhas variáveis intrínsecas". As autoras consideram, por isso, que é importante não sobrevalorizar a alimentação e dar conhecimento e informação ao doente para não conduzir a exageros.
sara.a.santos@dn.pt