A alienação da política e a erosão da democracia
Não é apenas por estar consagrada na nossa lei máxima e em leis e regulamentos que a democracia existe. Ela só existe verdadeiramente quando é adotada pela comunidade de cidadãos, quando vive no coração deles. E para que a democracia seja efetiva é necessário que, em cada momento histórico, os cidadãos considerem que um sistema político democrático é a melhor forma de resolver os problemas que enfrentamos em termos de devir coletivo. E que, por descontentes que possam estar temporariamente com os atores políticos disponíveis, concordem que ainda é a melhor forma de se discutir e encontrar respostas para os principais problemas que se colocam à sociedade. Por isso é tão relevante a participação dos cidadãos nos atos eleitorais.
Em algumas eleições, como as relativas ao Parlamento Europeu, percebe-se que muitos cidadãos eleitores não consideram (erradamente) essas eleições muito relevantes para a sua vida. E em eleições que parecem estar resolvidas à partida, como é o caso das eleições para o segundo mandato presidencial, também se compreende a fraca afluência eleitoral.
Nas eleições legislativas, a abstenção eleitoral tem vindo a crescer de forma preocupante, tendo atingido mais de 50% nas últimas eleições. Embora, curiosamente, a participação eleitoral em números absolutos tenha diminuído apenas 10% desde 1983.
Mas falando com as pessoas, em especial com as mais jovens, percebe-se que existe uma crescente descrença no sistema, na capacidade de os representantes eleitos mudarem as coisas que funcionam mal no país - desde a saúde à educação, da justiça à segurança social, do crescimento estagnado aos salários terceiro-mundistas, da burocracia à corrupção. Esse desencanto é crescentemente compartilhado pelos menos jovens, gradualmente exauridos na esperança da construção de uma sociedade mais próspera, mais solidária, com mais igualdade de oportunidades, com melhor gestão da coisa pública, que premeie o mérito e puna o demérito. Este desencanto está a promover uma erosão gradual mas clara da credibilidade do regime democrático. Pelo que, face à impotência para melhorar a representação política e o funcionamento do regime, cada vez mais cidadãos se distanciam da discussão política.
Nesta sociedade do primado do entretenimento precisamos de políticos que fujam da tentação de tuitar as frivolidades políticas ou as questões insignificantes que fazem parte da espuma dos dias ou focados no curtíssimo prazo. Precisamos de foco no médio e no longo prazo, no que importe melhorar e reformar a nossa sociedade. Para que a política tenha elevação e seriedade suficientes para que haja quem fale - e haja quem ouça - sobre os principais problemas que afligem a sociedade.
Precisamos também que os media resistam a tornar-se um simulacro do imediatismo das redes sociais.
É neste pano histórico de fundo de alienação política que se monta uma campanha eleitoral centrada em debates de 25 minutos (!) em que nenhum problema relevante pode ser discutido seriamente. Raramente se terá visto atos deste calibre de estupidez num timing histórico desastroso.
Consultor financeiro e business developer.
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