1. Café Estalagem Muchaxo Guincho, Cascais Domingo, 13 de março.Há algo de romanticamente decadente na Estalagem Muchaxo, especialmente do seu bar. Rezam as histórias de família que o meu pai estudou muitas vezes lá enquanto frequentava o curso de medicina e eu acabei por fazer o mesmo. Naqueles domingos de chuva não havia nada melhor que ir ao bar do Muchaxo beber um chá naquelas mesas de madeira maciça em recanto quase secreto, enquanto se ouvia uma qualquer música tocada no velho piano. E dali se avistava (e avista) o mar revolto do Guincho e o vento que assobia histórias de outros tempos..Sempre que lá volto para um café recordo isto tudo, revejo as fotos à entrada de visitas da nobreza europeia e presidentes de países que hoje já nem existem. Há ali uma nostalgia que nos abraça. Os tempos são outros, mas a vista é a mesma de sempre. Fantástica..2. Leitura.Homo Deus: História Breve do Amanhã Yuval Noah Harari Editora Elsinore Segunda ,14 de Março.É dia de tentar atacar o Homo Deus: História Breve do Amanhã. Descobri o Yuval Noah Harari com o Sapiens: História Breve da Humanidade, onde relata a evolução do Ser Humano e o seu impacto no Planeta. Descreve os principais acontecimentos de uma forma desconcertante, sem nunca tirar partido, e explica como passámos de simples animais a deuses capazes do melhor e do pior. À luz dos acontecimentos que se vivem na Ucrânia e dos horrores que diariamente assistimos em mais uma guerra estúpida (como se houvesse guerras inteligentes!?), este livro ganha uma renovada pertinência. E agora tenho o desafio do Homo Deus. ContInuo otimista no "dia do amanhã", mas com um receio brutal que seja "uma história breve"..3. Vinho Ervideira e Gerações da Talha Alentejo Terça, 15 de março.Qualquer dia é um bom dia para vinho não é verdade? Mas há aqueles casos especiais e em matéria de vinho os portugueses são como o futebol e a praia. São fiéis! Não sei bem explicar o fenómeno, mas todos os portugueses conhecem uma "praia secreta" que costumam ir e que só eles conhecem (assim acham!). Com o vinho é a mesma coisa. Comecemos pelo Conde d"Ervideira branco. Na realidade até podia começar pelo Branco d"Inverno porque é altura dele. Não sou conhecedor ou crítico, mas imagino que quando os especialistas se referem a um vinho untuoso... é aquilo. Estes brancos da Ervideira são feitos com mestria e irreverência e nunca me deram dores de cabeça. Sempre que o meu pai não está a olhar lá lhe assalto a garrafeira e some mais um par, isto porque as ditas estão momentaneamente esgotadas no mercado..E depois há a Gerações da Talha. Lembram-se do vinho da talha e pensam logo num vinho "mais difícil", certo? Errado! Ali de Vila de Frades, mas também na Amareleja, estão a recuperar a tradição e a arte secular do vinho de talha. A Gerações de Talha tem fantásticos programas de enoturismo, com almoço e cante alentejano. Mas o melhor mesmo é aquele Farrapo para começar e se já estiver mesmo embalado a cantar... fechar com chave de ouro e beber um Professor Arlindo..4. Cinema Dias do cinema Israelita Cinema City Alvalade, Lisboa Quarta, 16 de março.Último dia de mais uma edição (13ª) do "Dias do Cinema Israelita" em Lisboa. Como o próprio nome indica trata-se de uma mostra de filmes daquele país. Este ano só consegui ver o One More Story que abriu o ciclo, no passado dia 10. Um filme leve, que me fez sorrir, mas sem deixar grande memória. Quem disse que os filmes têm todos de ser memoráveis? Mas este é um bom dia para revisitar filmes que por ali passaram e me deixaram em lágrimas de tanto rir, como é o caso do Um porco em Gaza; ou que me levaram numa viagem emocional como é o caso do Vai e Vive do realizador romeno Radu Mihaileanu, que há muitos anos tive o prazer de conhecer num jantar memorável em Lisboa..5. Comer Restaurante Mama Shelter R. do Vale de Pereiro 19, Lisboa Quinta, 17de março.Abriu em janeiro e rapidamente se transformou na sensação da noite lisboeta. Já conhecia o Mama Shelter Paris East e na altura fascinou-me a loucura em torno do restaurante. Não foi apenas comer, foi uma experiência de libertação, de cantar a plenos pulmões e de fazer amigos que nunca mais revi. Agora em Lisboa, e com outra idade, voltei a sentir-me normal, a dançar, a ver gente bonita, a ouvir boa música e a comer francamente bem. Uma espécie de três em um. Fica ali numa esquina da Alexandre Herculano e vale uma noite bem passada entre amigos (e outros que se faz na ocasião)..6. Paz de Espírito Sinagoga Shaaré Tikvah R. Alexandre Herculano 59, Lisboa Sexta, 18 de março.As sextas-feiras são o início do Shabat, o dia em que os judeus descansam. Tenho muitas memórias associadas a este dia. Todos os sábados ao chegar a casa, saído desta mesma sinagoga, lá vinha o meu avô a subir os seis lanços de escadas (não podia usar o elevador porque era Shabat) cantarolando If I were a rich man do filme Um Violino no Telhado. Era sinal para a minha avó começar a servir o almoço com aqueles cheiros inconfundíveis da cozinha sefardita. E é na sinagoga que procuro refúgio para encontrar paz de espírito e ter um momento de paz num mundo em guerra. A sinagoga de Lisboa é um edifício fantástico de 1897, quase impercetível para o exterior, da autoria do arquiteto Miguel Ventura Terra e que está aberto a visitas sob marcação. Como curiosidade fica quase paredes meias com o Mama Shelter..7. Nosso Mercado de Levante e Feira de Velharias Estremoz Sábado, 19 de março.Sempre que posso faço uma romaria a Estremoz. Levo amigos, levo família, incentivo até desconhecidos. Aquela que é conhecida como a "cidade branca" enche-me as medidas. Todos os sábados realiza-se o Mercado de Levante onde acodem agricultores e produtores de todo o Alentejo para ali venderem a sua produção. Desde os espargos às túberas (quando é época delas), passando pelos legumes, a fruta, os queijos, os enchidos, os frutos secos... O difícil é escolher e vale bem a pena a viagem. E no mesmo local, um pouco ao lado, e em simultâneo realiza-se uma Feira de Velharias. Mas não é mais uma feira de coisas remexidas e sem qualquer utilidade. É bem capaz de ali encontrar verdadeiras preciosidades recolhidas das herdades um pouco por todo o Alentejo. No final, romaria que é romaria tem de ir ao templo. No meu caso é ali mesmo na Mercearia Gadanha, onde me deixo nas mãos da chef Michele Marques e sou levado numa bebedeira de sensações até ao Olímpo da gastronomia..filipe.gil@dn.pt