3 perguntas a António Nogueira Leite
1. A decisão do Tribunal Constitucional sobre os despedimentos e a requalificação na função pública está bem sustendada, é compreensível, é equlibrada à luz do momento que o País atravessa?
A Constituição tem levado a decisões do Tribunal Constitucional que violam o espírito de tratados assinados com a União Europeia. Temos uma Constituição pensada para um país com moeda própria e que não tem compromissos internacionais em termos orçamentais. A interpretação que o TC tem feito da Constituição é, para mim, incompatível com os compromissos quanto ao défice primário, só para dar um exemplo. Ou seja, Portugal não tem moeda própria e está numa situação em que não tenho a certeza de que o princípio da confiança possa ser garantido. O princípio da igualdade é óbvio que não pode ser respeitado. Se uma sequência de decisões deste tipo do TC conduzirem Portugal a um segundo resgate e a imposições muito mais graves, estamos a falar de uma perda mais violenta da confiança e de muitos outros princípios constitucionais. Seria catastrófico. Como economista, dá-me ideia que o nosso TC não funciona num modelo de expectativas racionais. Não está a incorporar nas decisões de hoje as consequências a prazo das decisões. É como se a realidade não existisse, fosse irrelevante, como se isto fosse apenas ideologia. Não é, é dívida.
2. Os bancos têm novas regras para se recapitalizarem. Os obrigacionistas passam a ver os seus empréstimos convertidos em ações do banco antes de poderem recorrer a ajuda do Estado. É justo? Os bancos portugueses vão sofrer com isso, porque ficará mais caro emitirem obrigações?
Esse risco de os obrigacionistas participarem no restaste de um banco, o chamado bail-in, foi incorporado por todos nós há pelo menos seis meses, desde o caso cipriota. Isto em conjunto com a supervisão europeia, pode dar a confiança necessária aos mercados, nomeadamente periféricos, de que se está a construir uma gradual solidez das instituições financeiras. Não é menos importante o facto de os bancos estarem obrigados a rácios de capital bastante exigentes. No caso português, é evidente que temos as circunstâncias do País, os bancos têm problemas que resultam do passado e que têm muito a ver com as imparidades ao longo do tempo. Sobretudo, os bancos portugueses têm um problema complicado: as contas de exploração estão muito debilitadas. Os bancos com muito crédito hipotecário estão a perder dinheiro.
3. Faz sentido baixar o IVA da restauração no próximo Orçamento do Estado, como pretende o ministro da Economia, ou estamos a falar de satisfazer um grupo de pressão?
Acho que temos de baixar o IVA quando pudermos ter margem para isso. Nesse momento estaremos a dar um full profit a essas empresas. Hoje não haveria nenhum efeito positivo significativo sobre a coletividade, além, claro, do benefício sobre os acionistas dessas empresas; que o merecem, sim, nalguns casos, mas não me parece que baixar o IVA agora, ainda com parte do ajustamento por fazer e com tantos riscos e incógnitas orçamentais, mereça o custo brutal que isso tem. Repito, estamos a falar de um orçamento, o do próximo ano, em que estaremos em dificuldades sérias. O défice está controlado, a despesa do Estado está adaptada às receitas, a dívida deixou de subir? Não, este não é o momento para baixar o IVA. Os governantes têm de ter em conta a situação do País.