2022 bate recorde de novas igrejas, em especial evangélicas e graças aos cidadãos brasileiros

26 novos registos de locais de culto em 2022, o maior crescimento dos últimos seis anos. É grande o contributo de estrangeiros, dizem peritos e associações. Estudo da Aliança Evangélica Portuguesa indica que 45% das suas igrejas nasceram depois de 2000, 6% nos últimos 3 anos.
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Todos os anos nascem congregações religiosas e locais de culto que não são da Igreja Católica. Mas em 2022, o número de novos registos foi maior que em anos anteriores, mais 26, o que representa um aumento de 62,5% em relação a 2021 (16 ). No ano da pandemia, houve uma desaceleração, ainda assim surgiram 10 igrejas, segundo o Ministério da Justiça. Um crescimento que se deve, em muito, à população imigrante, sobretudo naturais do Brasil entre os evangélicos. É a primeira entre as religiões minoritárias em Portugal.

De acordo com a Lei da Liberdade Religiosa (Decreto-lei n.º 134/2003, de 28 de junho), os espaços de oração/culto devem ser registados. No entanto, nem todos os líderes religiosos o fazem e até as próprias associações desconhecem o número exato de praticantes e de espaços que têm. O que significa que serão muitos mais que as 924 que constam do registo de Pessoas Coletivas Religiosas (não-católicas). Destes, 106 surgiram entre 2017 e 2022 (11,5% do total).

A Aliança Evangélica Portuguesa (AEP) explicou ao DN não poder dizer com rigor quantas igrejas têm em Portugal. "Esta dificuldade surge por causa da natureza orgânica e descentralizada que caracteriza o movimento evangélico." Tem filiadas 360 igrejas e que correspondem a 719 locais de culto.

O Gabinete de Estudos e Pesquisa da Aliança Evangélica Portuguesa realizou um estudo já este ano envolvendo 350 líderes de comunidades. O DN teve acesso aos primeiros dados. Indicam que 45% destas igrejas foram fundadas após 2000, sendo que 6% surgiram nos últimos três anos.

O inquérito também demonstra o contributo importante dos imigrantes: "82% dos respondentes afirma que a comunidade brasileira é a nacionalidade estrangeira mais representada nas suas igrejas; 61% revela que a maioria dos cristãos que começaram a frequentar a sua igreja nos últimos três anos são brasileiros."

Mas, Pedro Silva, o coordenador do gabinete, sublinha que existe uma "boa representação de provenientes dos PALOP, América do Norte (EUA e Canadá)e do Leste Europeu." Em relação aos portugueses, 47,2% dos líderes evangélicos dizem que representam até 50% dos fiéis. Os restantes afirmam que estão entre os 51% e 100%.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Censos 2010), 64,6% da população brasileira é católica e 22,2% evangélica, com esta última a crescer, ao contrário da católica, que regrediu.

O mesmo acontece em Portugal. Os protestantes/evangélicos (ver quadro) estão na segunda posição (depois da católica). O número de fiéis mais que duplicou entre os Censos de 2011 (73 731) e os de 2021 (186 832), passou de 0,9% para 2,1% da população portuguesa com 15 ou mais anos. Universo onde os brasileiros têm uma maior representação. É a comunidade que mais tem crescido, totalizando 233 138 (30,8% dos estrangeiros).

A religião católica e a judaica são as únicas em que há menos praticantes. A ortodoxa, hindu e muçulmana conquistam influência. E as Testemunhas do Jeová, que pela primeira vez o Instituto Nacional de Estatística tratou em separado, surge como a terceira associação religiosa no país (0,72%). Também se verificou uma subida do número das pessoas que dizem não ter religião. A resposta às perguntas sobre a religião não é obrigatória.

Na mesma pesquisa do gabinete de estudos dos evangélicos, 53% dos entrevistados afirma que a assistência às celebrações dominicais cresceu em relação ao período de pré-pandemia. 17% indicou que permaneceu inalterada, enquanto 23% disse que diminuiu. Quase metade (49%) destes líderes pensam abrir novas comunidades nos próximos cinco anos e já têm uma localidade definida onde a iniciar. Outros 25% dos inquiridos também esperam fazê-lo, mas ainda não definiram o local.

Outros indicadores estudados são os batismos e novas conversões. Menos de um quarto das igrejas (22%) não batizaram ninguém nos últimos dois anos (2021 e 2022) e em 7% não existiram convertimentos nos últimos três anos. O batismo entre os protestantes implica um ato voluntário do indivíduo, ou seja, é realizado em adulto.

As Testemunhas de Jeová constituem a segunda religião minoritária. Têm reuniões religiosas que se realizam nos chamados Salões do Reino. José Alberto Catarino, porta-voz da Região Lisboa, Vale Tejo e Alto Alentejo, indica a seguinte distribuição desses espaços pelo país: 372 no Continente, 14 nos Açores e 9 na Madeira. Destes, 12 surgiram nos últimos cinco anos. Alguns locais servem mais do que uma comunidade (Congregação). Existem 672 congregações em Portugal. Durante a Páscoa realizam celebrações especiais, estimando-se uma assistência total de cem mil pessoas.

Aquele dirigente explicou não terem a noção da distribuição dos praticantes por nacionalidade. No entanto, entende ser significativo a diversidade de línguas usadas nas reuniões religiosas. Em Portugal Continental realizam-se encontros para estudo da Bíblia em 16 idiomas. Além do português, têm alemão, bengali, chinês, cabo-verdiano, espanhol, francês, hindi, inglês, italiano, língua gestual portuguesa (LGP), nepali, punjabi, pulaar, romeno e russo. Nos Açores, têm em português e LGP e na Madeira também em espanhol.

Os vários estudos sobre religião revelam uma correlação entre os fluxos migratórios e as práticas religiosas. Alfredo Teixeira, especialista em teologia, coordenou o estudo Identidades Religiosas na Área Metropolitana de Lisboa (AML), para a Fundação Francisco Manuel dos Santos, apresentado em 2019. Tem por base o Inquérito Identidades Religiosas em Portugal, de 2011.

No documento considera-se que "a região apresenta uma singular experiência de diversidade quanto às posições face à religião e aos tipos de pertença ou não-pertença religiosa. Nessa singularidade, a região pode ser lida como um laboratório da diversidade religiosa em Portugal".

Os 18 concelhos que fazem parte da AML estão incluídos nos distritos de Lisboa (294 736) e de Setúbal (66 901), que têm mais de metade (51,7 %) dos estrangeiros.
Refere o estudo, que a " região de Lisboa é marcada pela experiência da mobilidade territorial": 32,4% da amostra é natural da sua área de residência, 52,4% natural de outros concelhos de Portugal e 15% tem nacionalidade estrangeira.

A população estrangeira é maioritariamente natural de Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, do Brasil e de estados da União Europeia. Por religiões, apresentam a seguinte diversidade: no caso dos católicos, África é a principal origem (66,7%) e, nos evangélicos/protestantes, sobressai o Brasil (65,8%) como nacionalidade. Nas Testemunhas de Jeová, destaca-se África (66,7%) e o Brasil (33,3%). Os muçulmanos nasceram sobretudo em África (66,7%), mas também na Ásia (33,3%).

Os investigadores sublinham que "tendencialmente, há uma correlação positiva entre o envolvimento comunitário e as dinâmicas de crescimento dos grupos religiosos". Os evangélicos/protestantes destacam-se como sendo o grupo religioso com uma militância religiosa mais forte.
ceuneves@dn.pt

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