176 mil dias de ausência em 2018. Há cada vez mais faltas por greve na saúde
Entre enfermeiros, médicos, técnicos de diagnóstico, assistentes operacionais, foram quase 176 mil dias de ausência por greve. 2018 foi um ano de contestação, o mais forte dos últimos cinco anos, com os enfermeiros a liderar as paralisações, de acordo com o Relatório Social do Ministério da Saúde e do Serviço Nacional de Saúde de 2018, publicado nesta terça-feira.
Dos 175 589 dias em que os profissionais de saúde faltaram em 2018 por estarem em greve, 99 692 são atribuídos aos enfermeiros. "No ano passado, estava a decorrer um processo negocial em que o Ministério da Saúde e o primeiro-ministro assumiram compromissos para dignificar a profissão de enfermagem, mas além do processo ter sido iniciado tarde, decorreu sempre de uma forma muito lenta, com pouca abertura do ministério para resolver os diferentes problemas, e acabou de forma unilateral", diz Guadalupe Simões, dirigente do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP). Por isso, o SEP convocou três paralisações e aderiu à greve dos trabalhadores da função pública.
Já os médicos, que convocaram uma greve geral de três dias em maio, deram 14 779 faltas por este motivo no ano passado. Reivindicavam também uma revisão nas carreiras, enquanto pediam a defesa do Serviço Nacional de Saúde.
No total, foram mais 54 703 dias de ausências por greve do que em 2017, ano que já registava o dobro das paralisações do período homólogo. Nos últimos cinco anos, o número de dias de ausência dos profissionais de saúde para reivindicar melhores condições laborais tem vindo a aumentar. Em 2014, as faltas ainda não atingiam 79 mil.
O mesmo documento revela um aumento de horas extraordinárias feitas pelos profissionais de saúde. Em 2018, foram prestadas 13,1 milhões de horas suplementares, a maioria durante o período da noite (4 189 070 - 32% do total). O número representa um aumento de 1,3 milhões de horas face ao ano anterior. "Tal facto deve-se, maioritariamente, à alteração ocorrida no período normal de trabalho dos trabalhadores vinculados com contrato individual de trabalho em Funções Públicas com a reposição das 35 horas de trabalho semanal", justifica a tutela no relatório.
As horas extra são um dos motivos que acentuam a contestação dos enfermeiros, a classe que mais aumentou o horário suplementar: de 2017 para 2018, estes profissionais aumentaram em 27% as horas suplementares. Fizeram 3,2 milhões de horas, o que significa que cada enfermeiro trabalhou mais 115 horas durante o ano para lá do seu horário normal.
Segundo Guadalupe Simões, o excesso de carga horária deve-se, por um lado, à falta de profissionais que não foram colocados depois da passagem das 40 horas de trabalho semanal para as 35 e, por outro, à ausência crónica de enfermeiros no SNS. "O governo não cumpriu com a admissão de enfermeiros para antecipar a passagem para as 35 horas, para que quem está a trabalhar pudesse fazer apenas o seu horário", acusa.
"E por muito que o governo diga que aumentou o número de enfermeiros e contratou, a questão é que entre os que contratou e os que saem nunca sabemos qual é o número. O que nós sabemos é que há uma dificuldade enorme dos hospitais em reter enfermeiros e a rotatividade nos serviços é assustadora. Os enfermeiros chegam a ser admitidos num dia e no outro a seguir vão-se embora", acrescenta a dirigente sindical.
Os enfermeiros são a classe que mais aumentou o número de horas, mas os que efetivamente ficam mais tempo depois do horário de trabalho são os médicos. Em 2018, trabalharam mais 5,7 milhões de horas, mais 2% do que em 2017. Em média, cada médico fez mais 303 horas do que seria de esperar. Principalmente os que trabalham em medicina interna, cirurgia geral, medicina geral e familiar, anestesiologistas e pediatras.
Os hospitais onde os médicos fazem mais horas suplementares são o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, o Centro Hospitalar Lisboa Norte, o Centro Hospitalar Lisboa Central, o Hospital de São João (Porto) e o Centro Hospitalar Universitário do Algarve.
Há falta de quem assuma as horas suplementares, mas também de quem faça horários completos. No ano passado, foram gastos mais de 105 milhões de euros em prestadores de serviços. A maioria (65%) serviu para contratar médicos em contexto de urgência. De acordo com o relatório, estes profissionais eram, na maioria dos casos, especialistas em medicina geral e familiar, interna, anestesiologia ou ginecologia.
O Centro Hospitalar e Universitário do Algarve foi o que mais contratou em regime de prestação de serviços, seguido do Centro Hospitalar do Médio Tejo, do Centro Hospitalar do Oeste, da Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano e da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo.